domingo, 20 de janeiro de 2008

Você é de esquerda ou de direita?

Richard Jakubaszko
A questão é mais confusa que ninho de minhoca, e ninguém sabe onde começa ou termina, onde fica a cabeça ou a ponta do rabo. Afora o posicionamento físico propriamente dito, de estarmos no lado esquerdo ou à direita de algo, essas expressões carregam significados místicos de posições políticas ditas radicais, ideológicas por assim dizer.

Se você perguntar a inúmeras pessoas de onde surgiram tais expressões, verá que a esmagadora maioria não imagina nada, não tem a mínima ideia de onde surgiu esse negócio de esquerda ou direita. Entretanto foram preferências que, cada uma em seu tempo, e conforme a latitude ou longitude, seja em relação a qualquer paralelo ou ao meridiano de Greenwich, ou à linha do Equador, poderiam levar seus simpatizantes a serem guilhotinados, ou simplesmente perfurados por balas diante de um paredón, ou esfolados pelo macartismo politicamente correto, quem sabe enforcados ou queimados em fogueiras dos encapuzados da Klu Klux Klan, ou asfixiados nas câmaras de gás dos nazistas. É isso aí, caro leitor, o ser humano já viveu dias perigosos na história da humanidade, apenas por adotar posições políticas sobre as quais grupos dominantes tivessem discordância.

No Brasil esse negócio de ser adepto da direta ou da esquerda tropicalizou-se, ou seja, esculhambou-se o que era pretensamente sério. Nas últimas eleições presidenciais tivemos uma guerra sem sangue, limpa e civilizada, via Internet. Como tudo que fazemos dentro desse espírito, e considerando a especialidade nacional na sofisticada técnica do deboche, acabou por se banalizar, ao mesmo tempo em que se criou, importou e incorporou eufemismos para minimizar ou exacerbar a importância dos posicionamentos. E dizem lá fora que somos cordiais e avessos ao radicalismo.
Lembro que, antigamente, dez ou vinte anos atrás, neoliberal era um adepto da direita, e hoje se transforma para a autodenominação de progressista, ou desenvolvimentista, que já foi prerrogativa de uso da esquerda, e ser da esquerda podia ser humanista. Direita já significou ser nazista, também fascista, que se imaginavam superiores e purificadores das raças, enquanto seguidor da esquerda era comunista, mais conhecidos como comedores de criancinhas. Uma simples questão de semântica, como se vê, mas em algum momento da mutação tropical virou xingamento, e embute nessa tragicomédia o milenar questionamento da teologia agostiniana do bem e do mal, denominada maniqueísmo, ou seja, só haveria duas posições, a favor ou contra, ou do bem ou do mal, dependendo da ótica, é claro, e da posição em que se coloque o oponente.
Vemos que um pouco de cultura inútil é sempre interessante. Saibam que as expressões esquerda e direita surgiram logo no início da revolução francesa, após a queda da Bastilha, e eram plenas de significados. Para as ralés francesas, que acompanhavam com torcidas organizadas o debate acalorado da constituinte que se seguiu às decapitações, importava saber quem disse o quê. 

Como os interesses na constituinte eram polêmicos, teve muito bate boca, como é de se imaginar, com desaforos de parte a parte, demonstrando que não é apenas o brasileiro que sabe debochar de seus adversários. À esquerda do plenário do Gran Palais ficavam os jacobinos, radicais, libertários, xenófobos, liderados por Robespierre, e à direita do mesmo plenário ficavam os adeptos dos girondinos, representantes da então decadente oligarquia francesa, alguns monarquistas, abastados comerciantes, enfim, a burguesia, e eram, em verdade, dois “partidos políticos”, que ainda não recebiam essa denominação porque a democracia francesa estava em implantação. Os jacobinos eram xingados de “democratas radicais”, uma definição semântica que, à luz dos significados isolados de cada uma das duas palavras, demonstra certa incompatibilidade, mas devia ofender de fato, ou pelo menos se pretendia a tanto.
Modernizações linguísticas e o mundo contemporâneo introduziram a terceira via, o que vai deixar os futuros historiadores enlouquecidos para descobrirem o que isto significa exatamente. Temos posições de centro, afora as de centro esquerda e de centro direita, que são intermediárias entre o centro e a esquerda ou direita mais radicais, ou seja, nem é moderado e tampouco é da ponta radical. Para indicar radicalismos absolutistas recorre-se ao termo xiita, importado dos árabes, e a mídia adotou a exótica denominação fundamentalista, para designar os radicais posicionados em qualquer dos lados, na esquerda ou direita, sempre que haja alguma influência religiosa na posição política. Mas isso já existia na revolução francesa, pois os jacobinos eram formados por inúmeros grupos de dominicanos, democratas, mas radicais. Comprova ainda que Pasteur, posterior à Bastilha e antes do tropicalismo, sabia das coisas, pois nada se cria, tudo se transforma.
No Brasil, longe de ser xenófobo como os jacobinos, o brasileiro tropicalizou o radicalismo e adotou a xenofilia, expressão equivalente ao tupiniquim puxa-saco. A propósito, esse comportamento do puxa-saco é um amálgama da cultura luso-judaico-católico com hábitos de povos importados à força, e uma outra hora qualquer escreverei sobre isso, hoje o espaço não permite essa digressão. Então é por aí, seja de esquerda ou direita, tudo isso representa rigorosamente o linguajar de uma época. Para nós, que somos viajantes de outros tempos, significa rigorosamente nada, ou quase nada, pois os valores e significados se perderam, será apenas trabalho futuro para os historiadores.
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segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Vou parar de ler jornais

Richard Jakubaszko

Chega! Bastam-me meus próprios pânicos, medos, ansiedades e angústias. Não vou mais procurar sarna pra me coçar. Essa sarna que sai diariamente nos jornais é dos outros, não é minha, afora o fato de que são notícias mal escritas, fatos mal contados, histórias deturpadas do cotidiano, e repetidas ad nauseum por quase toda a mídia como verdades eternizadas. 
A realidade, assim me parece, é que quase tudo o que sai em jornal (e nas revistas e TVs), hoje em dia, é ideologizado. Extrapolou o paradigma do “se há governo sou contra”. É óbvio que existem altíssimos interesses em jogo. Seus autores, entretanto, parecem não se dar conta das bobagens que dizem. Como a preferência é pela “má notícia” todos primam pela procura insana de ver o lado mais negativo daquilo que noticiam. Afinal, é isso que vende jornal e que dá audiência. E tome-se notícia ruim! 

Na economia (os juros vão subir, existe o perigo da inflação aí na frente; como se houvesse demanda reprimida, ou como se a Taxa Selic tivesse alguma coisa a ver – no Brasil, é claro – com os juros reais de mercado) ou na questão ambiental (temos de economizar água, vai faltar; como se a água pudesse sumir do planeta!). Tem gente que não entende de quase nada, ou entende menos da metade, e dá entrevista para TV e jornal afirmando um monte de asneiras. Em alguns casos é para defender interesses escusos, noutros para simplesmente aparecer na mídia. E a mídia dá espaço apenas a quem interessa a seus propósitos. Leio o jornal e tenho pesadelos.

Isso não é de hoje  
Essa preferência humana pela “notícia ruim” é antiquíssima, vem de tempos imemoriais, talvez do milenar oriente. Chegou às plagas americanas, acompanhada da modernidade pela mídia, sempre entre o épico e o drama. O livro dos livros já registrava em detalhes a maior e derradeira tragédia, o Apocalipse. Pelo noticiário da mídia o Armagedon já começou lentamente a mostrar que vai efetivamente acontecer dentro em breve. Se havia ainda alguma dúvida sobre o vaticínio da Bíblia é só a gente ler os jornais ou assistir TV e, em especial, frequentar os sites dedicados às questões ambientais, para nos convencermos de que essa é uma possibilidade real. Até os press releases ultimamente andam contaminados por essa idiossincrasia humana na preferência pela notícia ruim. 

O único sinal otimista que se verifica é a procura por uma idealização chamada de “sustentabilidade”. Não vejo como é que a ciência vai “descobrir” a sustentabilidade, pois o problema maior não está na sujeira ou poluição causada pelos humanos, mas no excesso de consumo que tem como causa a explosão demográfica. Será que Malthus tinha razão quando fez suas previsões? O que verifico é que os jornalistas de hoje em dia, tão diferentes dos jornalistas de antigamente, também fazem suas previsões negativas, chegam a empatar com os vaticínios bíblicos. A diferença é que jornalista, antigamente, e estou falando de trinta anos atrás, era profissional ligado ao povo, preocupado com os anseios do povo. Hoje em dia os jovens jornalistas consideram-se partes integrantes das elites, pois possuem diploma, e pensam conforme as elites. Mas escrevem muito mal, e essa é outra questão que vai se deteriorando a fundo perdido. 

Ondas de negativismo 
Quando eu era moleque o grande medo era a bomba H, a ameaça é de que iríamos derreter devido ao calor provocado pelos mísseis nucleares lançados por americanos e soviéticos na busca pela hegemonia planetária. O mundo parou, no início dos anos sessenta, para acompanhar a briga dos mísseis em Cuba. Passado o perigo iminente da III Guerra Mundial veio a guerra fria. Ficou em cartaz por mais de duas décadas, uma espada de Dâmocles sobre nossas cabeças, permanentemente. Nem bem a guerra das estrelas foi saindo de cena chegou a AIDS para bagunçar a vidas das gerações futuras. Nostradamus era relembrado frequentemente. Na sequência ao pesadelo da AIDS, que continua vivo, entremeada por guerras de verdade e guerras ao tráfico de entorpecentes, mais as guerrilhas urbanas, com bala perdida para todos os lados, fomos brindados por manchetes que anunciavam sobre a vaca louca e a gripe aviária. Não esqueçamos ainda dos transgênicos que trariam mutações humanas jamais vistas e provocariam desequilíbrios ambientais inimagináveis. No momento somos atormentados pelo aquecimento global, líquido e certo de que vai acontecer. Temos de reduzir as emissões de CO2! Vai faltar água, combustível também, o petróleo vai acabar, os mares vão subir, e qualquer furacão ou terremoto se transforma em avant premiére apocalíptica. Leite adulterado é fichinha, assunto para uma semana, apenas.  

A negação do óbvio 
Os sinais do fim dos tempos estão nas causas das notícias, e não na notícia em si. Explico melhor: neste fim-de-ano assistimos na mídia brasileira um farto e repetitivo noticiário sobre os recordes de consumo do povão que foi às compras. Vimos todos os templos de compras com gente saindo pelo ladrão. Depois os congestionamentos em estradas e aeroportos, na ida e na volta. Nas praias o povão consumindo dava seu show, com filas de até duas horas para comprar pãozinho em padaria, ou mais tempo ainda na fila dos supermercados, tudo com ausência de vagas para estacionar, trânsito caótico, e a inefável falta de água em cidades despreparadas para receber tamanho fluxo de gente de uma só vez. Ilha Bela agora vai até cobrar pedágio e proibir a entrada de gente. Em resumo, não existem políticas públicas capazes de abastecer o povão quando este tem poder e capacidade de consumo. No caso brasileiro é só uma amostra grátis, imaginem o que anda acontecendo na China, que está fazendo inclusão social de trezentos milhões de chineses, trazidos do campo para as cidades para trabalhar nas indústrias de exportação. Essa multidão de gente quer comida! O resultado está nos preços dos commodities: recordes de preços em tempos de paz. Em mais de quarenta anos que acompanho o agronegócio jamais vi recordes de safras com recordes de preços. Lamentavelmente o planeta precisa, urgentemente, de um rígido controle demográfico. Senão vamos para o vinagre mais rapidamente. Estamos com 6,3 bilhões de pessoas e chegaremos aos 9,5 ou 10,0 bilhões em 30 ou 35 anos à frente. Sociólogos e geógrafos dizem que haverá declínio apenas a partir de 2.050. Não sei se a bola de cristal deles é tela em LCD. Sei que até lá vai piorar, e muito. Na Europa o controle demográfico se faz pelo alto custo de vida e pela busca de independência pessoal, sem obrigações para com os filhos. A China anda fazendo isso, mas a inclusão social, por seu lado, neutraliza esse esforço. Pior é na Índia, Bangladesh, Indonésia e Brasil, onde não existe controle demográfico, e nem incentivo para tanto, pelo contrário, incentiva-se o aumento das proles. Em paralelo, a inclusão social aumenta exponencialmente os consumidores. E o planeta vai se esgotando... 

Pessimismo 
A mídia, entretanto, não noticia as causas e nem debate essas questões. O que só nos faz acreditar que a Bíblia está correta. Está lá, escrito: “no final dos tempos não nascerão mais inocentes”. Não haveria manchete mais realista. Como desgraça pouca é bobagem qual a razão então para ler jornais? Aos que não me conhecem informo que alguns amigos me comparam ao otimista da piada, mas reconheço que tenho algumas recaídas, afinal, pesadelos são pesadelos.
Como poderia ser diferente diante do que se lê? Propositalmente, neste artigo, defenestrei o otimismo. Entretanto, penso que o jornalismo deve debater, repensar e reavaliar a sua função social, o que não deixa de ser uma proposição otimista.
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quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

O que será do agronegócio daqui a alguns anos?

Richard Jakubaszko
(artigo publicado no Agrolink em 15-08-2007, e na DBO Agrotecnologia, ago/set/2007) 
Não é uma tarefa tão difícil assim a de projetar como será o agronegócio daqui para frente, digamos de 15 ou 20 anos. Nem precisa de uma fértil imaginação. Ocorreu-me escrever sobre esse futuro a partir do gentil convite do Agrolink, fato que muito me honrou, para comemorar 2.000 crônicas já publicadas.

Pensei então sobre um dos mais profundos anseios humanos de todos os tempos, o de prever o futuro, um tema sobre o qual valeria a pena uma abordagem para comemorar as 2.000 brilhantes colunas já publicadas por este pujante site do agronegócio. É exatamente isso que as pessoas mais querem saber. Vamos ao futuro, ora, pois, e vejamos algumas projeções daquilo que imagino que vai e pode acontecer, ou seriam profecias idealizadas?

Assim, participem, critiquem, comentem, tem um espaço democrático aí embaixo, no fim da coluna, para o leitor se manifestar. Não há pessimismo ou otimismo em nada do que passo a conjecturar. 
A mais importante, e talvez a mais polêmica das minhas "profecias": dentro em breve, coisa para 15 ou 20 anos, no máximo, os alimentos de uma forma geral terão excepcional valorização monetária, irão agregar altíssimo valor ao trabalho do homem do campo. Não haverá necessidade de se fazer marketing para vender mais, e com isso se tentar agregar valor.

Nos próximos 10 a 15 anos os compradores ainda terão o privilégio de fazer o preço daquilo que o produtor rural vende hoje, ao contrário do que acontece com a indústria, que determina o quanto vai receber. Mas isso vai acabar, pela simples razão de que o aumento populacional irá atropelar a produção de alimentos, e não se conseguirá manter grandes estoques reguladores, ou de segurança – no caso segurança para os agentes financeiros de mercado.

Os fundos de investimento descobriram nesta primeira década dos anos dois mil que comida pode gerar muito lucro em suas especulações. Pelo menos quatro ou cinco questões variáveis justificam essa "profecia", que nada tem a ver com a teoria de Malthus, conforme alguns apressadinhos poderiam imaginar.

Afora o aumento populacional, que é a mais importante, a primeira variável diz respeito à melhoria na qualidade de vida de populações até então excluídas do consumo, em especial chineses e indianos. Somente a China, nos últimos 10 anos, urbanizou mais de 300 milhões de trabalhadores rurais, e outro tanto deve ser urbanizado nos próximos 10 anos, inclusos nessa  outra conta os indianos, além de trabalhadores de outros países orientais como Indonésia, Vietnã, Coréia, etc., que deixarão de produzir para sua subsistência e serão apenas consumidores urbanos, com seus automóveis e outros bens de consumo.

A segunda questão diz respeito à falta de áreas novas para a produção agrícola, áreas que no planeta são existentes em grandes extensões apenas no Brasil, e sem os críticos e neuróticos "policies" ambientalistas, como ocorre na Europa. O crescimento da área de plantio de cana-de-açúcar, no Brasil, não há dúvidas, vai absorver áreas de pastagens e até mesmo de plantio de grãos, empurrando-as para novas áreas do cerrado no Brasil Central.

Nos USA o plantio de milho continuará a crescer, para produção de etanol, e roubará áreas da soja, que ficará cada vez mais tropical e brasileira. Já o biodíesel brasileiro deverá estabilizar a produção utilizando-se da nossa maior diversidade de fontes de matérias primas. A soja será o parâmetro, funcionará como baliza e fiel da balança em relação às matérias primas. Se o preço da commodity soja cair no mercado o seu uso cresce como matéria prima do biodíesel, e se o preço subir outras fontes substitutas serão usadas. 
Acho que as duas coisas, somadas, já seriam explosivas, até porque os estoques de grãos começam a se reduzir.

Outras variáveis
Vejamos, entretanto, as variáveis climáticas. No hemisfério Sul há os fenômenos El Niño e La Niña, com excessos de chuva e seca, o que já ocorre faz alguns anos, sendo de todos conhecidos e temidos. Deverão ser intensificados, não tenhamos dúvidas, por conta do tal do aquecimento ambiental do planeta. Com isso teremos safras frustradas com maior freqüência. Essas variáveis climáticas vão atingir de forma mais intensa o hemisfério Norte. Não precisa de bola de cristal para prever que os furacões americanos serão mais freqüentes e destrutivos.

O mercado é um animal arisco, medroso, e o que mais gosta de fazer é especular. Lembremos dos preços do milho na última safra e safrinha, apesar dos recordes de produção, brasileiro e americano. Em outros tempos os preços teriam despencado e haveria uma quebradeira geral, tipo efeito dominó, com tsunami de sobremesa. Foi a primeira vez, em mais de 40 anos que acompanho o agronegócio, que vi commodity batendo recorde de produção e recorde de preço ao mesmo tempo. Um espanto.

Outra variável diz respeito aos ambientalistas. Pelo andar da carruagem, por exemplo, os transgênicos ainda levam de 5 a 10 anos para ter liberação de plantio comercial no Brasil. Lamentavelmente o Brasil se distancia de seus competidores – USA e Argentina - como fornecedor de grãos, porque a nossa tecnologia começa a se atrasar, perdemos competitividade, a ciência está travada, e não será fácil conquistar a dianteira no quesito produtividade.

Para complicar mais a vida dos agricultores os ambientalistas arrocham a fiscalização no quesito irrigação. Eles "entendem e imaginam" que a água vai acabar. Alegam que irrigação na agricultura "gasta" água, portanto deve ter o uso restrito, seja pela burocracia, seja pela cobrança de taxas. Será mais um fator limitante da agricultura competitiva, em especial no Centro-Oeste. 
Com isso a oferta adicional de alimentos, proveniente do Brasil, não será tão substancial como desejaríamos para atender os novos consumidores urbanos, sejam chineses ou indianos.

Lei de Murphy
Por fim, dentre as minhas "profecias", destaco a Lei de Murphy como variável que colocará os preços dos commodities em alta, para daqui a 15 ou 20 anos. Ou seja, se alguma coisa poderá dar errado para o consumidor, isso vai acontecer, não há dúvidas, a diferença é que o fenômeno Lei de Murphy pode ocorrer no mês que vem, ou daqui a 2 ou 3 anos, e antecipar o cenário que estou prevendo para daqui uns 15 ou 20 anos. Além de guerras e conflitos, a Lei de Murphy se apresenta por problemas pontuais que "enlouquecem" os agentes de mercado: um foco de Aftosa, como o que ocorreu meses atrás na Inglaterra é um bom exemplo. Ou a vaca louca nos USA e Canadá, ou mesmo a Aftosa aqui no Brasil ou Argentina. Os preços atingem níveis nunca vistos.

Bom, não esqueçamos da gripe aviária, ela anda voando por aí nas migrações de aves, sem passaportes e apátridas. Sabemos que o ser humano tem "cutucado a onça com vara curta", de forma irresponsável na questão ambiental, como se já não bastassem os desastres climáticos do tipo El Niño ou La Niña, mas os desastres que prevejo não necessariamente implicam na ação da natureza, mas na ação do homem.

Imaginem, por exemplo, como mais uma interferência da Lei de Murphy, o estouro ou desmoronamento de uma única das 10 ou 12 eclusas existentes no rio Mississipi, que serve de transporte para mais de 80% da produção do Corn Belt americano. Imaginou? Pois os preços praticados pelo mercado iriam explodir, em dois ou três dias bateriam todos os recordes históricos. Essa é uma catástrofe anunciada por alguns setores agrícolas dos americanos, que não conseguem as autorizações legais para fazer a manutenção das tais eclusas, por conta das dificuldades impostas pelos ambientalistas.

Ou seja, ambientalista brasileiro ou americano é tudo igual, é do contra, por princípio, sem nem saber porque, a qualquer hidrelétrica, barragem, até mesmo poço artesiano. Mexeu com água? Então não tem conversa, eles são contra. 
E aí? Dá para acrescentar algo de novo nesses cenários?

Devo explicar que não acredito no aparecimento de novas tecnologias salvadoras da pátria, para aumentar a produtividade, salvo um ou outro produto pontual, em especial nos agroquímicos, estimulando especialmente a fisiologia das plantas. Podemos ter aperfeiçoamentos e evoluções em máquinas, novos cultivares, quem sabe alguma evolução dos transgênicos, e ainda novas técnicas de manejo, mas nada significativo se vislumbra no horizonte. Daqui para frente o aumento da produção terá de ser pela incorporação de novas áreas e pela melhoria das produtividades médias, que ainda andam baixas perto das médias americanas e argentinas. Será ver para crer. Acredito que o horizonte do agronegócio brasileiro é risonho e altamente positivo. Não sou especialista como o agrônomo André Pessôa, mas também faço minhas previsões. 

Em tempo: após as minhas “previsões” acima, feitas em agosto último (2007), os preços dos commodities grãos estouraram no mercado. Errei no prazo, previsto para daqui a 10 ou 15 anos. Pois já começou. A revista The Economist, de 6 de dezembro 2007, fez matéria de capa sobre o tema, reconhecendo o aumento dos preços como definitivo. Vejam também a capa na aba lateral este blog.  Tenho, assim, a íntima satisfação de ter dado um "furo" nos ingleses. Entretanto, sem querer ser pessimista, a situação vai piorar, e pode ser já em 2008. Poderá até haver um certo equilíbrio de preços nos anos seguintes, mas entraram no jogo fatores de enorme influência, e que são os fundos de investimento. Eles descobriram nos commodities um excelente foco de especulação.
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