sábado, 10 de novembro de 2012

O resgate do conhecimento


Rogério Arioli Silva *

As provas do ENEM são a grande dor de cabeça dos jovens da atualidade. Ao buscarem uma pontuação que lhes permita o acesso à Universidade, esses futuros profissionais precisam enfrentar medos irreais, característicos das aflições adolescentes, e os reais, formalizados pelas cotas implantadas através da nova sistemática educacional. Desesperos e inseguranças à parte é preciso boa dose de serenidade, além de amplo conhecimento para obter um desempenho competitivo.

É justamente aí que reside o problema. A maioria dos jovens atualmente não possui a mínima familiaridade com o estudo. Entendendo-se por estudo aquele momento particular de concentração em que o cérebro procura acumular informações para, posteriormente, evoluir no processo cognitivo. Acostumados que estão ao contato virtual, na sua rapidez e descompromisso, existe uma dificuldade da atual geração em concentrar-se nos detalhes. Sabem de quase tudo um pouco, porém de maneira superficial ou, como resumiu a banda Kid Abelha em sua conhecida canção, nada tanto assim.


A leitura cada vez faz menos parte da rotina das pessoas, dos jovens então nem se fala. Os resumidos diálogos dos Faces, Twíteres e Orkuts são castradores de conhecimentos. Detalhes ortográficos, linguísticos, semânticos e tudo mais que faça parte da bela língua portuguesa restam jogados numa dimensão minimalista como se supérfluos fossem. Embora os diálogos curtos também se prestem à comunicação, como resultado desta negligência intelectual, as redações tornaram-se atos de bravura desafiadora aos candidatos, capazes de ensejar prantos e risos não necessariamente nesta ordem. Como escrever corretamente, se isto parece algo primitivo, característico de povos que habitaram a terra nos primórdios da civilização?

Novos tempos, velhas preocupações. Chaplin, na sua obra prima “Tempos Modernos” escrita em 1936, já alertou sobre a brutalidade das máquinas ocupando o espaço do homem. Agora o desafio é mais aterrador: a máquina ocupa o lugar do cérebro, mantendo o homem como um apêndice da sua atividade. As máquinas escravizam ao invés de se tornarem ferramentas de modernidade. Computadores já invadiram salas, quartos e cozinhas. Resta apenas o banheiro, que pelo caráter de extremo individualismo, ainda resiste sabe-se lá até quando. Não é necessário pensar, alguém já o fez. Basta que se siga o que foi definido, sem maiores esforços nem questionamentos.

O que parecia ser a redenção da humanidade através do acesso aos acontecimentos em tempo real e da informação num click, serviu mais para reduzir o tempo disponível ao invés de ampliá-lo. O mundo encontra-se ao alcance da mão, mas ao invés de dissecá-lo para melhor entendê-lo, copia-se e cola-se, sem maiores responsabilidades. Esta atitude não é apenas dos jovens, mas de todos, acostumados que estão com o caráter descartável da excessiva exposição bigbrotheriana de tudo e de todos.

Definitivamente há um espectro rondando o futuro do conhecimento e porque não dizer dos próprios relacionamentos humanos. A materialidade dá lugar à fluidez. Nada é o que parece. E o que parecia já mudou de aparência, como acontece com as sombras espectrais. Resta pouco a ser desvendado e, portanto, a ser estudado e discutido. Nos ágeis cliques dos dedos automatizados a mensagem corrompe a fala, o diálogo, o papo desafiador. Atrás dos aparelhinhos coloridos os defeitos humanos inexistem, apenas divulga-se o que é aprovável pela maioria.

Embora pareça uma dose de excessiva crítica ao que ocorre atualmente nos relacionamentos e na busca do conhecimento, é possível perceber-se vida inteligente em grande parte dos jovens. Talvez a mesma esteja subutilizada pelo excessivo apelo consumista a que é submetida, mas, mesmo latente, é capaz de reagir quando provocada. É preciso justamente isto: Desafios. Esta inteligência, embora marginalizada pela futilidade comercial apelativa, é capaz de sobrepor-se de maneira contundente no momento em que a fome de conhecimento se instala. Conhecimento libertador, capaz de gerar luzes onde persiste a escuridão quase indevassável da alienação moderna.

Cabe à geração mais velha, por vezes entediada com seus problemas e frustrações, tornar-se farol para desafiar esses jovens a encontrarem valores imprescindíveis à convivência e ao resgate do conhecimento.

* O autor é Engº Agrº e Produtor Rural no MT

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