domingo, 3 de novembro de 2013

Professores: desistam dessa profissão!

Alessandro Lyra Braga   
Foto: http://www.shutterstock.com/
Todo mundo já sabe que professores, em todo o país, ganham muito mal, apesar de serem os profissionais mais importantes de uma sociedade. Todo mundo sabe que o único profissional que no Japão não precisa se curvar diante do imperador é o professor. Todo mundo já sabe que nossas escolas públicas não têm recursos ou estão, muitas delas, em péssimo estado de conservação. Todo mundo já sabe de tudo sobre os professores. O mais triste, é que todo mundo já sabe que nossos políticos detestam os professores e o que eles significam: a lucidez do povo, mas ninguém faz nada! O povo não luta pelos professores e/ou pelo ensino. O povo luta contra aumento de passagem, pede o fim da corrupção e até diz que luta em favor do ensino, mas na prática não faz nada! Provo isto porque nunca vi alguém sair de sua casa, não sendo aluno ou professor, para ir a uma manifestação, exigir que os professores tenham salários dignos e plenas condições de trabalho.

Lamento muito no que a profissão de professor se transformou. Para boa parte da sociedade, professor, hoje, é profissão de pobre. Pais de classe média querem que seus filhos sejam tudo na vida, menos professores, já que desejam um futuro de conforto, prosperidade e realização para seus filhos, e entendem que isto será impossível de se atingir sendo professores. Já os políticos, principalmente prefeitos e governadores, consideram todos os professores “comunistas chatos” que reclamam o tempo todo. No entanto, esquecem que sua limitada visão da realidade (por só ficarem em gabinetes) e ilimitada ganância fizeram com que o ensino não pudesse ser bom. Um povo instruído sabe que é preterido pela classe política e não acreditaria em praticamente nada do que lhes é prometido em tempos de eleição. Um povo instruído se negaria a votar em urnas eletrônicas que só os TREs e o TSE consideram, no mundo inteiro, um processo seguro e impossível de ser fraudado.

O Brasil vive numa séria encruzilhada. Sabemos que nossa classe política está destruindo o que falta do ensino público, já que desejam se perpetuar no poder. Um povo sem instrução jamais entenderá o que é um embargo infringente e nem que os principais nomes do Mensalão poderão escapar da cadeia. Já o “pobre miserável”, quando levado à Justiça, é condenado em primeira instância e apodrece na cadeia por não saber que tem direito a recorrer, por exemplo. Este pobre, nos tempos de escola, nunca aprendeu nada sobre cidadania porque não tinha professor que o ensinasse. Entendendo o que o nosso país precisa, temos a consciência de que teremos que lutar sozinhos, sem os governos, que se mostram inimigos do povo e não “pelo povo e para o povo”. A sociedade é que terá que se organizar para se instruir, com o cuidado de que politiqueiros baratos não tentem se aproveitar das iniciativas. Que é uma proposta utópica, eu sei. Mas não se idealiza um país sem propostas utópicas, porque sempre desejamos o máximo, e não o meio termo daquilo que é possível.

O que aconteceu no Rio de Janeiro de professores, em legítima manifestação contra ditames insanos do prefeito, serem espancados por tropas da Polícia Militar a mando de governos com várias e sérias denúncias de corrupção e má gestão da coisa pública, foi um exemplo de barbárie política e social sem precedentes em nossa história recente. É curioso como governadores e prefeitos alegam que não há verba para equipar escolas ou remunerar dignamente os professores, mas há verbas em abundância para equipar forças de repressão policial e usar esta verba para esmagar aqueles que de fato alicerçam uma nação. É assim que os governos brasileiros entendem o ensino, como digno de ser espancado!

Em alguns estados e municípios a evasão de professores públicos é imensa. Professores optam por sobreviver e/ou não mais se frustrarem profissionalmente e ou desistem das salas de aula ou migram para o ensino privado, que é inviável para a grande parte da população. Não que o ensino privado seja excelente em seu todo, mas ainda é uma possibilidade de melhoria de trabalho para aqueles que nele ingressam. Devemos também entender que a opção de um modelo baseado em apenas haver ensino de qualidade na rede privada tem consequências absurdamente sérias para a estrutura social do país. É a perpetuação e a concentração do poder de análise (e do próprio conhecimento formal) nas mãos de poucos, o que impede qualquer alteração do status quo político, econômico e social do país. É como manter uma escravidão camuflada, onde o pobre sem condições de questionar, assim permanecerá por toda a vida. Assim, não se muda um país.

Eu não quero que aconteça de ninguém desistir de ser professor. Eu quero é que todos sejam professores. Uns serão professores de História, Geografia ou Matemática. Outros serão de civismo ou “amor ao próximo”. Uns estudarão formalmente para exercer seu ofício, outros viverão plenamente para aprender como exercer sua cidadania. Todos seremos professores. E quando todos formos professores na vida, aí sim teremos um grande país. Até lá, só temos uma piada ou um projeto, como queiram chamar.

É óbvio que quem deseja e pode alterar alguma coisa e ameaçar todo um projeto de poder, será visto como uma ameaça. É óbvio que nossos dominantes políticos não querem que professores atuem com qualidade e eficiência. É obvio que eles querem que todos desistam. Para nossos governantes, a ordem que deveria ser dada é ”Professores, desistam dessa profissão!”. Para nós, que somos o povo, o pedido que fazemos é ”Professores, não desistam do país!”.

* o autor é carioca, por engano. De formação é historiador e publicitário, radialista por acidente e jornalista por necessidade de informação. Vive vários dilemas religiosos, filosóficos e sociológicos. Ama o questionamento.

** Publicado originalmente no site Adital

COMENTÁRIOS DO BLOGUEIRO: sou pai de duas professoras universitárias, uma com doutorado (letras) e outra com mestrado (Antropologia), a caminho do doutorado, e sei bem o que é essa vida dos professores.
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Um comentário:

  1. Pelo pouco que conheço do mundo, sei que o déficit de reconhecimento dos professores não é exclusividade do Brasil. Sei também que ninguém é obrigado a trabalhar na rede pública e que para se examinar adequadamente um tema tão amplo, deve-se levar em conta vários indicadores a médio prazo e sua evolução. Não acho que as manifestações do RJ sejam despidas de finalidades políticas, o que distorce um pouco sua finalidade. Ocupar parlamentos à força e legitimar Black Blocs que saem destruindo tudo, inclusive patrimônio histórico?

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