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quinta-feira, 27 de dezembro de 2007
IPCC: e se os cientistas estiverem enganados?
Foi com esse questionamento que redigi a matéria de capa na revista DBO Agrotecnologia, edição 11, que circula a partir dessa semana, e também sobre a instigante entrevista em profundidade realizada com o engenheiro agrônomo e doutor Odo Primavesi, pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste – São Carlos, SP.
A questão em si tem inúmeros desdobramentos e a história nos ensina que é evidente que cientistas se enganam. Como registrei na abertura da referida matéria a ciência trabalha com certezas, e em cima dessas certezas constrói novas hipóteses para chegar a outras certezas, e assim enriquece o saber humano. O que não deve ocorrer é a construção de certezas em cima de hipóteses, pois o castelo desmorona por falta de base sólida.
É o que parece acontecer com o IPCC, sigla em inglês para Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, que anunciou em maio último o início do fim do mundo para dentro breve.
A lógica de raciocínio do relatório do IPCC é límpida e cristalina: devido ao mau uso – e consumo perdulário – do planeta a humanidade está a perigo de ir para o vinagre a qualquer momento. Não iríamos para o brejo, o que seria bem melhor, isto porque deve faltar água para formar brejos. Tudo por culpa dos gases de efeito estufa, os GEE, que esquentam o planeta, segundo o IPCC, vão derreter as calotas polares, aí os mares vão "transbordar" e invadir os continentes, e a agricultura vai ficar delimitada a algumas regiões do planeta, migrando para outras terras, assim como milhões de pessoas terão de escapulir para outras regiões à procura de alimento, água e de menos calor.
Com essa antevisão do apocalipse o IPCC recomenda a redução drástica e urgente da emissão de GEE, entre eles o já popular CO2, o gás carbônico, vomitado pelas chaminés das fábricas, escapamentos de veículos, queimadas, e outras ações tresloucadas do bicho homem.
Todavia, a peleja não é tão simples. Se os cientistas estiverem enganados não vai adiantar nada essa tentativa de redução de GEE.
Verifica-se que muitos cientistas, alguns governos e batalhões de gente no planeta não acreditam numa única palavra do relatório do IPCC. Por não acreditarem não mudou nada no comportamento. Tem até gente que compra indulgência e paga para plantar árvores, mas é muito pouco ou quase nada perto do que deve ser feito.
Primavesi é um dos 17 cientistas brasileiros relatores e revisores do relatório do IPCC. Assinou o relatório, concordou com as previsões, mas tem opinião contrária quanto às causas apontadas. Primavesi sabe muito do que fala. A tese do contraditório, de sua autoria, tema sobre a qual fiz a entrevista publicada na DBO Agrotecnologia, está sendo desenvolvida há dois anos, e afirma de forma categórica que o aquecimento do planeta é gerado pela ação do sol que incide nos solos degradados e desprotegidos em regiões semi-áridas, áridas e desérticas, e, aí sim, o calor em excesso, o calor refletido, que antes escapava para o espaço, agora é obstruído e contido pelo aumento da concentração dos GEE na atmosfera.
Nesse caso os GEE funcionam como um cobertor para quem já está com calor. As fotos dos satélites da NASA / NOA / INPE, e de satélites australianos, que ilustram a matéria da DBO Agrotecnologia, mostram os níveis de calor no solo em diversas regiões do planeta, algumas atingem mais de 300 W de calor por m². A conversão explica que existem áreas com temperaturas de mais de 50 graus centígrados no ar acima do solo, e de até 70 graus na superfície do solo.
Para quem sabe que as raízes das plantas não absorvem água e nutrientes com temperatura igual ou maior do que 33 graus Celsius, pois elas murcham e param de fazer a fotossíntese, fica fácil dimensionar o tamanho da encrenca e de entender a profundidade e importância da tese de Primavesi.
Primavesi tem ideias claras, conforme registrei na matéria: "a natureza tem normas rígidas, e se estas não são seguidas levam à morte imediata ou lenta do ser humano. O mais inteligente não é subjugar a natureza às nossas tecnologias, mas aliar nossas tecnologias às normas ambientais, como os princípios ecológicos, garantindo e reforçando seus processos naturais, o que vai resultar em elevada eficácia dos insumos utilizados".
Causas das mudanças
O 'ponto de não retorno', o antes do pré-apocalipse pode estar muito mais próximo do que imaginamos. Há cientistas que colocam prazo: de 6 a 10 anos para começar a acontecer. Não é pessimismo, mas não dá para brincar com isso.
Primavesi argumenta: "nas regiões tropicais, onde a temperatura em geral é mais elevada, os processos biológicos, entre eles a decomposição de matéria orgânica no solo, que resultam em liberação de gás carbônico, ocorrem em velocidade de cinco a dez vezes superior em condições normais, e até 50 vezes mais rápido em condições extremas, do que nas regiões de clima temperado.
Reduções estatisticamente significativas no teor de matéria orgânica de solos agrícolas sob manejo convencional ocorrem no período de 50 anos na Áustria, por exemplo, e em até um ano no Brasil".
É isso, os gringos entendem de clima temperado e não têm a menor noção do que é que acontece aqui nos trópicos. Para quem deseja aprofundar conhecimentos dessa teoria é recomendável uma leitura da matéria de capa da DBO Agrotecnologia, aqui neste espaço não há como mostrar essa riqueza de detalhes, a começar pelas imagens.
Isto pode ser feito no site da revista www.dboagrotecnologia.com.br e se desejar pode fazer uma assinatura, que é gratuita para agricultores, agrônomos e técnicos.
Para complementar o tema tem outra matéria sobre meio ambiente e aquecimento, onde há outro questionamento interessante, se "O agronegócio é culpado ou inocente?".
Na mesma edição, matérias sobre "Boas práticas agrícolas", texto do próprio Primavesi, que tem propostas concretas para resolver a questão do aquecimento, entre elas fazer plantio direto até em pomares e reflorestar os oceanos de lavouras – e ainda nas urbes – nem que seja com árvores de plástico.
Afora tudo isso tem uma deliciosa crônica do ruralista de quinta geração, o filósofo Luiz Suplicy Hafers, sobre café sombreado, que remonta às origens da Etiópia para mostrar que os antigos tinham tecnologia e razão.
A revista é sobre agrotecnologia, mas isto não quer dizer que boas tecnologias não possam ser antigas e eficientes.
De outro lado, a razão dessa crônica é lembrar o óbvio: existem cabeças que pensam diferente de outras, e isso é uma das maravilhas da vida, entretanto, para que nos livremos do vinagre, vamos ter que agir em conjunto, num mesmo sentido e com igual objetivo. Se alguém aqui não entendeu a importância da questão do engano dos cientistas explico melhor: é que antes da teoria do Primavesi a gente só poderia resolver o problema do aquecimento global assoprando muito, pra ver se conseguiríamos refrescar e dispersar os gases CO2, mas agora vai dar para abanar também, e só isso já é uma boa alternativa pra aliviar os beiços, além de mitigar a ameaça de fritura que já apontou lá no fim do túnel.
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Um comentário:
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Richard,
ResponderExcluirDepois de seus comentários na página que iniciei, resolvi ler os artigos que você recomendou e quero discutir a frase "a ciência trabalha com certezas". Como estou fazendo doutorado e ensino ciência - sou professor de Análise Instrumental em química - discordo da frase e gostaria de oferecer uma análise.
A ciência trabalha com hipóteses e probabilidades, pelo menos de acordo com o que estudei até hoje. Recomendo fortemente a leitura de "A Estrutura das Revoluções Científicas", de Thomas Khun, que considero um clássico e um livro fantástico. Para mim, foi eletrizante, quando o li, há muitos anos atrás. Nesse livro, você poderá conhecer a hipótese de Khun: de que as Ciências se desenvolvem em torno de algumas hipóteses básicas, os paradigmas, que no entanto, podem ser mudados.
Paradigmas mudariam quando fatos experimentais entrassem em contradição com os resultados esperados em tal monta, que seria impossível manter as hipóteses básicas dos modelos (os paradigmas) e eles teriam de ser substituídos. Ou seja, as 'certezas' podem cair. Os exemplos dados pelo livro são muito bons e cito alguns como a mudança da Física Aristotélica para a Física Clássica (Galileu, Newton, Copérnico etc.), e desta para a Física Relativística e Probabilística (Einstein e Schrödinger). Não lembro se ele menciona a mudança da Biologia descritiva para a Biologia evolucionária (Darwin), e desta para Biologia genética e biomolecular (descoberta do DNA por Watson e Crick).
Não é que os paradigmas anteriores estejam “errados”. Eles simplesmente não eram paradigmas, pois abrangiam apenas os fatos considerados até uma certa data. Ou seja, funcionariam dentro de um escopo limitado pelas observações tecnologicamente possíveis ao seu tempo. As novas descobertas que os contradisseram, levaram à formulação de novas hipóteses centrais (novos paradigmas). Mas não se engane, de acordo com Khun, os paradigmas atuais também vão cair um dia.
A Ciência de hoje aponta um mundo menos seguro e com muito menos certezas. Einstein, por exemplo detestava a Quântica de Schrödinger ("Deus não joga dados" é frase Einsteniana famosa) e tentou provar que a Quântica estava errada até o fim de sua vida, sem sucesso. Mas é com essas incertezas que temos de conviver e considerar.
Desculpe o tom professoral, é a força do hábito.
Abraços,
Ademário
P.S.: Agradeço pelos seus artigos, pois, no mínimo, fizeram com que eu pensasse e escrevesse esse resumo das idéias sobre Ciência que giram em minha mente faz tempo, condensando e aprofundando minhas próprias concepções sobre o assunto. No mais, seus artigos também levantam várias questões e desafiam paradigmas vigentes. Parabéns.