Roberto Rodrigues *
Em dezembro do ano passado a ONG Friends of the Earth Europe publicou um “estudo” chamado “Da floresta para o garfo: como a pecuária, a soja e o açúcar estão destruindo as florestas do Brasil e afetando o clima”.
O documento teve apoio financeiro da Comissão Européia, embora no prefácio esteja explicitado que não reflete a opinião do financiador. Ainda bem, porque destaca que a expansão da agropecuária no Brasil coloca em xeque o futuro da floresta amazônica e chama a atenção para o fato de que, sendo a Europa o maior mercado do agronegócio brasileiro, ela é, em parte, responsável por esse problema.
O “estudo” é um conjunto de críticas ao agronegócio nacional, onde o Brasil é caracterizado como o 4º maior emissor de CO2 do mundo, e 75% desta emissão viriam da agropecuária e das mudanças de uso do solo. Diz que a expansão da pecuária, da soja e da cana – causariam impactos negativos de caráter social, com a exclusão dos pequenos e médios produtores familiares, o que colocaria em risco a produção de alimentos, aumentaria o desemprego e os preços da terra, encarecendo a implementação necessária da reforma agrária.
E arremata propondo:
- que a União Européia adote medidas urgentes para reduzir a importação de ração animal e carnes do Brasil, incluindo a reforma da política agrícola do bloco (mais protecionismo!!!).
- apoiar o direito de propriedade dos pequenos produtores e dos povos indígenas no Brasil.
- fortalecer as leis ambientais no nosso país.
- rejeitar o comércio de crédito de carbono das florestas, incluindo a regra de REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação).
Como o “trabalho”, foi financiado e publicado com apoio de Comissão Européia, ganha credibilidade.
E, ao apontar para os “perigos” da expansão da soja, da cana e da pecuária no nosso país, a ONG claramente manifesta a necessidade de brecar isso. Ou seja, afastar o eficiente competidor do mercado. Um dado “assustador”: em 2020, a área da soja no Brasil poderá ser do tamanho da Nova Zelândia, ou 26,85 milhões de hectares. Apenas não informa que o Brasil tem 851 milhões de hectares, e isto seria apenas 3,5% do nosso território.
O estudo explora o desconhecimento da geografia. E ignora que o Plantio Direto, praticado entre nós desde a década de 70, melhora as características físico-químicas e biológicas da terra, reduz a incidência de erosão, e economiza óleo diesel, reduzindo as emissões de CO2, ocupando 26 milhões de hectares no Brasil! Ignora ainda os expressivos aumentos na produtividade da soja por hectare, reduzindo a demanda por novas áreas; desconhece a inoculação com Rhizobium que elimina a adubação nitrogenada nesta cultura; faz de conta que não sabe nada sobre a moratória da soja, através da qual os processadores desta oleaginosa não compram o produto oriundo de desmatamento desde 2006; e ignora os programas de governo chamados de ABC – Agricultura de Baixo Carbono, crescentemente exitosos...
Quanto à cana, há erros, como afirmar que os canaviais são fonte de emissão de CO2, esquecendo que a cana absorve CO2 em seu desenvolvimento, e que a partir de 2014 não haverá mais a queima desta gramínea para colheita: será feita com cana crua, mecanicamente. Não cita que as emissões de CO2 do etanol, considerando todo o ciclo da cana, são apenas 11% das emissões da gasolina; desconhece o zoneamento feito pela EMBRAPA o que exclui o Pantanal e a Floresta Amazônica da expansão da cana.
E, sobre a carne, é flagrante o medo da nossa explosiva competitividade, apesar de todos os problemas reais que temos como sanidade e pastagens degradadas.
Enfim, trata-se de mais uma agressão ao nosso agronegócio, metendo-se inclusive em questões políticas internas, sem a menor elegância.
É uma pena que gente inteligente e bem intencionada seja enganada por “trabalhos” desta natureza, tão parciais e comercialmente comprometidos.
* engenheiro agrônomo, professor da UNESP Jaboticabal, ex-ministro da Agricultura, presidente do Conselho de Agronegócio da FIESP e coordenador do Centro de Agronegócio da FGV-EESP.
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