Este blog é um espaço de debate onde se pode polemizar sobre política, economia, sociologia, meio ambiente, religião, idiossincrasias, sempre em profundidade e com bom humor. Participe, dê sua opinião. O melhor do blog está em "arquivos do blog", os temas são atemporais. Se for comentar registre nome, NÃO PUBLICO COMENTÁRIOS ANÔNIMOS. Aqui no blog, até mesmo os biodesagradáveis são bem-vindos! ** Aviso: o blog contém doses homeopáticas de ironia, por vezes letais, mas nem sempre.
domingo, 24 de dezembro de 2017
Cadências em superlativos e outras anuências.
Não paira dúvida, no entanto, de que no dia azul marinho, do mês da parca semeadura, do ano da fome farta e, portanto das disputas infindáveis, introduziu-se o código de Artépios, descendente de Kartona, rainha filha do criador do universo, a qual, depois de um reinado conturbado, mas duradouro, foi enterrada embalsamada entre lírios de conduta duvidosa e ao sabor de seitas cabalísticas, na ala norte do templo para adorações a Sermisium. A nós devotos é fundamental saber que acompanharam a soberana os cantos, as profecias e as poesias premonitórias Creônicas para traçarem os destinos dos recém-nascidos, semideuses, Átora, Atora e Atorá.
A realidade traçada para o futuro obscuro, que às vezes irreverentes incréus ousam destruir, foi que as seitas seguiram rigorosamente as métricas inflexíveis das rimas dos astros e as fantasias descritas nos cerimoniais fúnebres. Eliminando assim habilmente as incoerências, os semideuses constataram que havia restado, após milênios, somente três crenças, seguidas pelos canalhas, pelos caolhos e pelos calhordas: a psicanálise, com suas interrogações insolúveis e permanentes, o materialismo histórico, adorado pelos criadores dos projetos inviáveis e, por último, o mercado, endeusado pelos futurólogos e justificadores dos erros pretéritos. As demais seitas, até tradicionais, passaram a atuar mais em áreas da prestidigitação de magias, desencarnações dos demônios e, com eficiência, junto às finanças e aos dízimos.
Cumprindo os mandamentos proféticos, Átora, Atora e Atorá, encontraram-se, pelos caminhos da fortuna, exatamente no lugar em que O Todo Poderoso, extasiou-se ao infinito, dando o melhor de si e caprichando no fino acabamento daquilo que acabara de concluir com muito amor. Comovido com a beleza da natureza que criara, chorou de alegria, derramando ali uma única e afetiva lágrima a qual se transformou no perene Carioca, rio idealizado e fantasiado por ele, com ternura. Assim, a trindade, ungida pelo destino de criar uma só e abençoada liturgia, preparou, com afeto, o porvir, respeitando rigorosamente as cerimônias proféticas que lhes foram determinadas.
Para tanto, procurara, cuidadosamente, uma carinhosa fé, enredaram-na nos ombros firmes e aconchegantes de um batuque insinuante, após uma noite em que não faltara luxúria e amor, os dispuseram, fé e batuque, embevecidos e sonolentos, entre quatro velas tagarelas, duas garrafas de pinga exuberante, um risonho galo de briga preto com pescoço pelado, valente, e uma inibida pomba branca, virgem. Destaque-se, por derradeiro, neste ofertório mágico, uma encabulada farofa, entre dengosa e tímida, com as persistentes insistências dos afagos de um mambembe vira-lata, agnóstico, entisicado, mordiscando suas intimidades. E mais, na encruzilhada entre o Beco dos Velhacos e a subida do morro, assistiu a tudo, um cacoete bêbado, maltrapilho, olhando ainda de soslaio, à jusante, a natureza esplendorosa da Baia da Guanabara, deleitada com a delicadeza da sonoridade de um berimbau gingado, o reco-reco honesto, mais o cavaco competente, sem deixar o tamborim risonho separado.
E deste sincretismo singular, sob as bênçãos do cacoete, a ternura do coro de instrumentos e o amor da trilogia profética, viu-se nascer e criar, com muita veneração, os Santos Irmãos Siameses, orgulho da união, da pureza e dos sonhos, o Carnaval e o Futebol. Mas, infelizmente, a brisa da previdência ou da imprevidência, assoprou leve o registro desta cerimônia que se perdeu, no repique do sempre, para ninguém mais chorar sem alegria.
* o autor é economista, blogueiro, escrevinhador, e diretor-executivo da AMA - Associação dos Misturadores de Adubos.
Publicado originalmente em: http://carloseduardoflorence.blogspot.com.br/
.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Obrigado por participar, aguarde publicação de seu comentário.
Não publico ofensas pessoais e termos pejorativos. Não publico comentários de anônimos.
Registre seu nome na mensagem. Depois de digitar seu comentário clique na flechinha da janela "Comentar como", no "Selecionar perfil' e escolha "nome/URL"; na janela que vai abrir digite seu nome.
Se vc possui blog digite o endereço (link) completo na linha do URL, caso contrário deixe em branco.
Depois, clique em "publicar".
Se tiver gmail escolha "Google", pois o Google vai pedir a sua senha e autenticar o envio.