Carlos Eduardo Florence *
Quem deu por cadenciar moroso e dolente os proseados, como era das suas temperanças, arribado sobre a mula alazã passarinheira como preferia aleguar nas trilhas encarrilhadas tropeando burrada xucra pelas serras e sertões foi o muladeiro renomado Amandácio do Catadeu, no restado dos dias antes de prover morrer muito amasiado com a tranquilidade e destino, pois iria bater quase cem, sem nenhum remorso por jamais ter matado ou castigado um cristão, mesmo de má catadura, sem as estritas justiças e modos condizentes nos respeitos as regras do senhor. Amoldado às vontades de contar seus casos, mas por carente das regras das ciências das leituras e das letras não se atreveu a deixar de refazer nas lembranças nenhum diminutivo ou atrevimento e no contra verso me mandou atentar nas memórias para depois recontar como desse e assim ficou o que sobrou das catas.
Pelos que salvei das falas de Amandácio, enquanto comíamos poeira atrás da tropa, deduziu ele muito justo como sempre que das contradições carecidas de serem grafadas sobre as desavenças ou as premonições, nem se sustentaram nas crendices ou se atiçaram esclarecidas de todo, mas isto não desmereceu serem contadas e vão agora devagarosas, paciencientadas, como era do seu jeito para apaziguar o verbo como quem lambesse a palha de milho para o cigarro cheiroso ou para bajular as fantasias e não desvirtuar o ouvido de quem atentava.
Achegada a hora, mais caberia começar a aurora, depois das doze derradeiras estrelas escolhidas pelas luas, agraciadas pelos sonhos e seresteiros, chorarem em seus recantos de silêncios para começarem a se recolher. Por conta das rotinas coube ao sol já ir se preparando atrevido para espionar por trás das torres da matriz beijadas pelos ventos e desventuras.
Era assim o anseio para se converter em madrugada, carrilhões da praça atenderam os recados engraçando embalos coloridos para os primeiros fiéis compartilharem achegos aos serviços em tempo justo dos portais da catedral abertos, pois nos pêndulos das artimanhas entre o fim da noite e o parir do dia acalantariam os aninhos das meretrizes e dos proxenetas des-abnegarem escaldados das agruras que enfrentaram, para merecerem seus repousos. Antes das luzes serem recolhidas, a garoa lacrimou nos ombros das mágoas, os pecados sem arrependimentos não se persignaram frente aos vitrais abençoados da matriz e os desatinos procuraram achego nas solidões.
Pairava um azul acabrunhado e dolente envolvendo os achegos, coisas dos imprevistos e das solidões. Nisto, por justo dos caminhos, as torpezas foram escapando dos dentes da boca da noite fechando e o ranço do tráfego agitando a tristeza de cada desgraçado portando suas desavenças com os próprios destinos. Nos palpites jogados tais búzios para interpretarem os rancores não atinavam mais se haveriam motivos de serem recontados, mesmo até porque os preceitos e os provérbios não foram vistos com os mesmos olhos entre os enfeitiçados, que lambiam uns os sovacos do demônio e os outros demais, desprovidos de alentos, assuavam de deus os ranhos, fingindo arrependimentos cínicos. Foi começando nestas prosas que a mula de Amandácio aprimorou para as canhotas e sumiu nas fantasias como gostava de fazer para enganar as imaginações. Os restados das estórias vieram posteriormente e desvirtuadas como eram seus temperamentos.
* o autor é economista, blogueiro, escrevinhador, e diretor-executivo da AMA – Associação dos Misturadores de Adubos.
Publicado no https://carloseduardoflorence.blogspot.com.br/
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