Carlos Eduardo Florence *
O paradoxo, filho carnal e incestuoso da intransigência com a mediocridade, concebido na alcova da tristeza e sob as bênçãos da solidão, não é exclusivo da filosofia existencial com que os deuses do Acanlácio Maior substantivaram o homem renegado da sua idealização saudável, paranoica, para transformar sua meta de liberdade ainda mais inexplicável e conflitiva. Tudo para lhe impor o sofrimento da racionalidade antes de enviá-lo como sapiens para desandar sobre a terra. Por que do paradoxo à relevância para a evolução da espécie?
A resposta é simples e direta. Se não fosse a carência da mulher para observar de frente o esplendor do azul, impor-se em posição ereta e arvorar-se ao bipedismo e, portanto, aos partos pré-maturos, para em contrapartida compensar a afronta aos deuses com os coitos frontais, salvo, tal não se dando, estas variáveis em descalabro da história às alternativas à reprodução da espécie ofereceria solução quaternária, revisionista, retrógrada e o orgasmo não viria a se tornar angústia freudiana para os nascidos entre janeiro e dezembro do calendário gregoriano. São João Batista, capitulo amoroso, versículo desconhecido ou encoberto.
Este preâmbulo poderia ser relegado ao escrutínio, fugindo da análise acurada, não fosse a necessidade de colocar a figura humana como observadora e síntese exclusiva da existência do Antropocus Urius. Em tempos históricos em que as hordas se estraçalhavam pelas savanas, desertos e planícies dos continentes, em Urius brotou a figura híbrida do Antropocus com a finalidade de apaziguar os delírios provocados pela ansiedade, pelo erotismo e pela mentira.
A origem comportamental da humanidade deve-se única e exclusivamente a estes três valores dos quais degeneraram todos os demais recalques civilizatórios emanados do Antropocus. A ansiedade é exatamente o momento do nascer em que o abandono do Éden uterino reflete o sacrifício para o salto ao desconhecido, cruel, mórbido. O erotismo é o único propulsor para a perpetuação da espécie além de outros descompassos e devaneios. A mentira é fruto da genialidade do sapiens para suportar-se e fingir que se entende.
Divagamos em prol da síntese e da racionalidade. Estes preâmbulos paradoxais e conflitivos impuseram-se não mais do que para esmiuçar a grandeza do Antropocus em sua linhagem esbelta, racionalista e relevante. Ao ser concebido para edulcorar a humanidade, ao Antropocus foi oferecida solidão profunda, com uma crista perfeita dividida em dois segmentos, contendo, na primeira, modulações externas por onde o vento recortava a oitava sinfonia e na outras pinceladas de saudades por onde o poente grená encontraria a solidão divina ao se preparar para meditar.
Encerrando, é sobre sua pele delicada e aprazível, que o Antropocus acolhe as demências mais cativantes, alimenta as fantasias dos homens, sonha que a felicidade existe, insinua que todos são iguais perante os delírios. Ao cair da noite encanta com sua flauta mágica os imbecis, deixa adormecer os retardados, embebeda os tolos para acreditarem que o mundo encontrará a felicidade e transforma os mais afoitos em crianças para fingirem que serão felizes quando os deuses se distraírem e eles poderão trucidar o próprio Antropocus no altar da fantasia. Réquiem ao paradoxo.
* o autor é economista, blogueiro, escrevinhador, e diretor-executivo da AMA – Associação dos Misturadores de Adubos.
Publicado no https://carloseduardoflorence.blogspot.com.br/
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