domingo, 20 de janeiro de 2008

Você é de esquerda ou de direita?

Richard Jakubaszko
A questão é mais confusa que ninho de minhoca, e ninguém sabe onde começa ou termina, onde fica a cabeça ou a ponta do rabo. Afora o posicionamento físico propriamente dito, de estarmos no lado esquerdo ou à direita de algo, essas expressões carregam significados místicos de posições políticas ditas radicais, ideológicas por assim dizer.

Se você perguntar a inúmeras pessoas de onde surgiram tais expressões, verá que a esmagadora maioria não imagina nada, não tem a mínima ideia de onde surgiu esse negócio de esquerda ou direita. Entretanto foram preferências que, cada uma em seu tempo, e conforme a latitude ou longitude, seja em relação a qualquer paralelo ou ao meridiano de Greenwich, ou à linha do Equador, poderiam levar seus simpatizantes a serem guilhotinados, ou simplesmente perfurados por balas diante de um paredón, ou esfolados pelo macartismo politicamente correto, quem sabe enforcados ou queimados em fogueiras dos encapuzados da Klu Klux Klan, ou asfixiados nas câmaras de gás dos nazistas. É isso aí, caro leitor, o ser humano já viveu dias perigosos na história da humanidade, apenas por adotar posições políticas sobre as quais grupos dominantes tivessem discordância.

No Brasil esse negócio de ser adepto da direta ou da esquerda tropicalizou-se, ou seja, esculhambou-se o que era pretensamente sério. Nas últimas eleições presidenciais tivemos uma guerra sem sangue, limpa e civilizada, via Internet. Como tudo que fazemos dentro desse espírito, e considerando a especialidade nacional na sofisticada técnica do deboche, acabou por se banalizar, ao mesmo tempo em que se criou, importou e incorporou eufemismos para minimizar ou exacerbar a importância dos posicionamentos. E dizem lá fora que somos cordiais e avessos ao radicalismo.
Lembro que, antigamente, dez ou vinte anos atrás, neoliberal era um adepto da direita, e hoje se transforma para a autodenominação de progressista, ou desenvolvimentista, que já foi prerrogativa de uso da esquerda, e ser da esquerda podia ser humanista. Direita já significou ser nazista, também fascista, que se imaginavam superiores e purificadores das raças, enquanto seguidor da esquerda era comunista, mais conhecidos como comedores de criancinhas. Uma simples questão de semântica, como se vê, mas em algum momento da mutação tropical virou xingamento, e embute nessa tragicomédia o milenar questionamento da teologia agostiniana do bem e do mal, denominada maniqueísmo, ou seja, só haveria duas posições, a favor ou contra, ou do bem ou do mal, dependendo da ótica, é claro, e da posição em que se coloque o oponente.
Vemos que um pouco de cultura inútil é sempre interessante. Saibam que as expressões esquerda e direita surgiram logo no início da revolução francesa, após a queda da Bastilha, e eram plenas de significados. Para as ralés francesas, que acompanhavam com torcidas organizadas o debate acalorado da constituinte que se seguiu às decapitações, importava saber quem disse o quê. 

Como os interesses na constituinte eram polêmicos, teve muito bate boca, como é de se imaginar, com desaforos de parte a parte, demonstrando que não é apenas o brasileiro que sabe debochar de seus adversários. À esquerda do plenário do Gran Palais ficavam os jacobinos, radicais, libertários, xenófobos, liderados por Robespierre, e à direita do mesmo plenário ficavam os adeptos dos girondinos, representantes da então decadente oligarquia francesa, alguns monarquistas, abastados comerciantes, enfim, a burguesia, e eram, em verdade, dois “partidos políticos”, que ainda não recebiam essa denominação porque a democracia francesa estava em implantação. Os jacobinos eram xingados de “democratas radicais”, uma definição semântica que, à luz dos significados isolados de cada uma das duas palavras, demonstra certa incompatibilidade, mas devia ofender de fato, ou pelo menos se pretendia a tanto.
Modernizações linguísticas e o mundo contemporâneo introduziram a terceira via, o que vai deixar os futuros historiadores enlouquecidos para descobrirem o que isto significa exatamente. Temos posições de centro, afora as de centro esquerda e de centro direita, que são intermediárias entre o centro e a esquerda ou direita mais radicais, ou seja, nem é moderado e tampouco é da ponta radical. Para indicar radicalismos absolutistas recorre-se ao termo xiita, importado dos árabes, e a mídia adotou a exótica denominação fundamentalista, para designar os radicais posicionados em qualquer dos lados, na esquerda ou direita, sempre que haja alguma influência religiosa na posição política. Mas isso já existia na revolução francesa, pois os jacobinos eram formados por inúmeros grupos de dominicanos, democratas, mas radicais. Comprova ainda que Pasteur, posterior à Bastilha e antes do tropicalismo, sabia das coisas, pois nada se cria, tudo se transforma.
No Brasil, longe de ser xenófobo como os jacobinos, o brasileiro tropicalizou o radicalismo e adotou a xenofilia, expressão equivalente ao tupiniquim puxa-saco. A propósito, esse comportamento do puxa-saco é um amálgama da cultura luso-judaico-católico com hábitos de povos importados à força, e uma outra hora qualquer escreverei sobre isso, hoje o espaço não permite essa digressão. Então é por aí, seja de esquerda ou direita, tudo isso representa rigorosamente o linguajar de uma época. Para nós, que somos viajantes de outros tempos, significa rigorosamente nada, ou quase nada, pois os valores e significados se perderam, será apenas trabalho futuro para os historiadores.
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segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Vou parar de ler jornais

Richard Jakubaszko

Chega! Bastam-me meus próprios pânicos, medos, ansiedades e angústias. Não vou mais procurar sarna pra me coçar. Essa sarna que sai diariamente nos jornais é dos outros, não é minha, afora o fato de que são notícias mal escritas, fatos mal contados, histórias deturpadas do cotidiano, e repetidas ad nauseum por quase toda a mídia como verdades eternizadas. 
A realidade, assim me parece, é que quase tudo o que sai em jornal (e nas revistas e TVs), hoje em dia, é ideologizado. Extrapolou o paradigma do “se há governo sou contra”. É óbvio que existem altíssimos interesses em jogo. Seus autores, entretanto, parecem não se dar conta das bobagens que dizem. Como a preferência é pela “má notícia” todos primam pela procura insana de ver o lado mais negativo daquilo que noticiam. Afinal, é isso que vende jornal e que dá audiência. E tome-se notícia ruim! 

Na economia (os juros vão subir, existe o perigo da inflação aí na frente; como se houvesse demanda reprimida, ou como se a Taxa Selic tivesse alguma coisa a ver – no Brasil, é claro – com os juros reais de mercado) ou na questão ambiental (temos de economizar água, vai faltar; como se a água pudesse sumir do planeta!). Tem gente que não entende de quase nada, ou entende menos da metade, e dá entrevista para TV e jornal afirmando um monte de asneiras. Em alguns casos é para defender interesses escusos, noutros para simplesmente aparecer na mídia. E a mídia dá espaço apenas a quem interessa a seus propósitos. Leio o jornal e tenho pesadelos.

Isso não é de hoje  
Essa preferência humana pela “notícia ruim” é antiquíssima, vem de tempos imemoriais, talvez do milenar oriente. Chegou às plagas americanas, acompanhada da modernidade pela mídia, sempre entre o épico e o drama. O livro dos livros já registrava em detalhes a maior e derradeira tragédia, o Apocalipse. Pelo noticiário da mídia o Armagedon já começou lentamente a mostrar que vai efetivamente acontecer dentro em breve. Se havia ainda alguma dúvida sobre o vaticínio da Bíblia é só a gente ler os jornais ou assistir TV e, em especial, frequentar os sites dedicados às questões ambientais, para nos convencermos de que essa é uma possibilidade real. Até os press releases ultimamente andam contaminados por essa idiossincrasia humana na preferência pela notícia ruim. 

O único sinal otimista que se verifica é a procura por uma idealização chamada de “sustentabilidade”. Não vejo como é que a ciência vai “descobrir” a sustentabilidade, pois o problema maior não está na sujeira ou poluição causada pelos humanos, mas no excesso de consumo que tem como causa a explosão demográfica. Será que Malthus tinha razão quando fez suas previsões? O que verifico é que os jornalistas de hoje em dia, tão diferentes dos jornalistas de antigamente, também fazem suas previsões negativas, chegam a empatar com os vaticínios bíblicos. A diferença é que jornalista, antigamente, e estou falando de trinta anos atrás, era profissional ligado ao povo, preocupado com os anseios do povo. Hoje em dia os jovens jornalistas consideram-se partes integrantes das elites, pois possuem diploma, e pensam conforme as elites. Mas escrevem muito mal, e essa é outra questão que vai se deteriorando a fundo perdido. 

Ondas de negativismo 
Quando eu era moleque o grande medo era a bomba H, a ameaça é de que iríamos derreter devido ao calor provocado pelos mísseis nucleares lançados por americanos e soviéticos na busca pela hegemonia planetária. O mundo parou, no início dos anos sessenta, para acompanhar a briga dos mísseis em Cuba. Passado o perigo iminente da III Guerra Mundial veio a guerra fria. Ficou em cartaz por mais de duas décadas, uma espada de Dâmocles sobre nossas cabeças, permanentemente. Nem bem a guerra das estrelas foi saindo de cena chegou a AIDS para bagunçar a vidas das gerações futuras. Nostradamus era relembrado frequentemente. Na sequência ao pesadelo da AIDS, que continua vivo, entremeada por guerras de verdade e guerras ao tráfico de entorpecentes, mais as guerrilhas urbanas, com bala perdida para todos os lados, fomos brindados por manchetes que anunciavam sobre a vaca louca e a gripe aviária. Não esqueçamos ainda dos transgênicos que trariam mutações humanas jamais vistas e provocariam desequilíbrios ambientais inimagináveis. No momento somos atormentados pelo aquecimento global, líquido e certo de que vai acontecer. Temos de reduzir as emissões de CO2! Vai faltar água, combustível também, o petróleo vai acabar, os mares vão subir, e qualquer furacão ou terremoto se transforma em avant premiére apocalíptica. Leite adulterado é fichinha, assunto para uma semana, apenas.  

A negação do óbvio 
Os sinais do fim dos tempos estão nas causas das notícias, e não na notícia em si. Explico melhor: neste fim-de-ano assistimos na mídia brasileira um farto e repetitivo noticiário sobre os recordes de consumo do povão que foi às compras. Vimos todos os templos de compras com gente saindo pelo ladrão. Depois os congestionamentos em estradas e aeroportos, na ida e na volta. Nas praias o povão consumindo dava seu show, com filas de até duas horas para comprar pãozinho em padaria, ou mais tempo ainda na fila dos supermercados, tudo com ausência de vagas para estacionar, trânsito caótico, e a inefável falta de água em cidades despreparadas para receber tamanho fluxo de gente de uma só vez. Ilha Bela agora vai até cobrar pedágio e proibir a entrada de gente. Em resumo, não existem políticas públicas capazes de abastecer o povão quando este tem poder e capacidade de consumo. No caso brasileiro é só uma amostra grátis, imaginem o que anda acontecendo na China, que está fazendo inclusão social de trezentos milhões de chineses, trazidos do campo para as cidades para trabalhar nas indústrias de exportação. Essa multidão de gente quer comida! O resultado está nos preços dos commodities: recordes de preços em tempos de paz. Em mais de quarenta anos que acompanho o agronegócio jamais vi recordes de safras com recordes de preços. Lamentavelmente o planeta precisa, urgentemente, de um rígido controle demográfico. Senão vamos para o vinagre mais rapidamente. Estamos com 6,3 bilhões de pessoas e chegaremos aos 9,5 ou 10,0 bilhões em 30 ou 35 anos à frente. Sociólogos e geógrafos dizem que haverá declínio apenas a partir de 2.050. Não sei se a bola de cristal deles é tela em LCD. Sei que até lá vai piorar, e muito. Na Europa o controle demográfico se faz pelo alto custo de vida e pela busca de independência pessoal, sem obrigações para com os filhos. A China anda fazendo isso, mas a inclusão social, por seu lado, neutraliza esse esforço. Pior é na Índia, Bangladesh, Indonésia e Brasil, onde não existe controle demográfico, e nem incentivo para tanto, pelo contrário, incentiva-se o aumento das proles. Em paralelo, a inclusão social aumenta exponencialmente os consumidores. E o planeta vai se esgotando... 

Pessimismo 
A mídia, entretanto, não noticia as causas e nem debate essas questões. O que só nos faz acreditar que a Bíblia está correta. Está lá, escrito: “no final dos tempos não nascerão mais inocentes”. Não haveria manchete mais realista. Como desgraça pouca é bobagem qual a razão então para ler jornais? Aos que não me conhecem informo que alguns amigos me comparam ao otimista da piada, mas reconheço que tenho algumas recaídas, afinal, pesadelos são pesadelos.
Como poderia ser diferente diante do que se lê? Propositalmente, neste artigo, defenestrei o otimismo. Entretanto, penso que o jornalismo deve debater, repensar e reavaliar a sua função social, o que não deixa de ser uma proposição otimista.
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quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

O que será do agronegócio daqui a alguns anos?

Richard Jakubaszko
(artigo publicado no Agrolink em 15-08-2007, e na DBO Agrotecnologia, ago/set/2007) 
Não é uma tarefa tão difícil assim a de projetar como será o agronegócio daqui para frente, digamos de 15 ou 20 anos. Nem precisa de uma fértil imaginação. Ocorreu-me escrever sobre esse futuro a partir do gentil convite do Agrolink, fato que muito me honrou, para comemorar 2.000 crônicas já publicadas.

Pensei então sobre um dos mais profundos anseios humanos de todos os tempos, o de prever o futuro, um tema sobre o qual valeria a pena uma abordagem para comemorar as 2.000 brilhantes colunas já publicadas por este pujante site do agronegócio. É exatamente isso que as pessoas mais querem saber. Vamos ao futuro, ora, pois, e vejamos algumas projeções daquilo que imagino que vai e pode acontecer, ou seriam profecias idealizadas?

Assim, participem, critiquem, comentem, tem um espaço democrático aí embaixo, no fim da coluna, para o leitor se manifestar. Não há pessimismo ou otimismo em nada do que passo a conjecturar. 
A mais importante, e talvez a mais polêmica das minhas "profecias": dentro em breve, coisa para 15 ou 20 anos, no máximo, os alimentos de uma forma geral terão excepcional valorização monetária, irão agregar altíssimo valor ao trabalho do homem do campo. Não haverá necessidade de se fazer marketing para vender mais, e com isso se tentar agregar valor.

Nos próximos 10 a 15 anos os compradores ainda terão o privilégio de fazer o preço daquilo que o produtor rural vende hoje, ao contrário do que acontece com a indústria, que determina o quanto vai receber. Mas isso vai acabar, pela simples razão de que o aumento populacional irá atropelar a produção de alimentos, e não se conseguirá manter grandes estoques reguladores, ou de segurança – no caso segurança para os agentes financeiros de mercado.

Os fundos de investimento descobriram nesta primeira década dos anos dois mil que comida pode gerar muito lucro em suas especulações. Pelo menos quatro ou cinco questões variáveis justificam essa "profecia", que nada tem a ver com a teoria de Malthus, conforme alguns apressadinhos poderiam imaginar.

Afora o aumento populacional, que é a mais importante, a primeira variável diz respeito à melhoria na qualidade de vida de populações até então excluídas do consumo, em especial chineses e indianos. Somente a China, nos últimos 10 anos, urbanizou mais de 300 milhões de trabalhadores rurais, e outro tanto deve ser urbanizado nos próximos 10 anos, inclusos nessa  outra conta os indianos, além de trabalhadores de outros países orientais como Indonésia, Vietnã, Coréia, etc., que deixarão de produzir para sua subsistência e serão apenas consumidores urbanos, com seus automóveis e outros bens de consumo.

A segunda questão diz respeito à falta de áreas novas para a produção agrícola, áreas que no planeta são existentes em grandes extensões apenas no Brasil, e sem os críticos e neuróticos "policies" ambientalistas, como ocorre na Europa. O crescimento da área de plantio de cana-de-açúcar, no Brasil, não há dúvidas, vai absorver áreas de pastagens e até mesmo de plantio de grãos, empurrando-as para novas áreas do cerrado no Brasil Central.

Nos USA o plantio de milho continuará a crescer, para produção de etanol, e roubará áreas da soja, que ficará cada vez mais tropical e brasileira. Já o biodíesel brasileiro deverá estabilizar a produção utilizando-se da nossa maior diversidade de fontes de matérias primas. A soja será o parâmetro, funcionará como baliza e fiel da balança em relação às matérias primas. Se o preço da commodity soja cair no mercado o seu uso cresce como matéria prima do biodíesel, e se o preço subir outras fontes substitutas serão usadas. 
Acho que as duas coisas, somadas, já seriam explosivas, até porque os estoques de grãos começam a se reduzir.

Outras variáveis
Vejamos, entretanto, as variáveis climáticas. No hemisfério Sul há os fenômenos El Niño e La Niña, com excessos de chuva e seca, o que já ocorre faz alguns anos, sendo de todos conhecidos e temidos. Deverão ser intensificados, não tenhamos dúvidas, por conta do tal do aquecimento ambiental do planeta. Com isso teremos safras frustradas com maior freqüência. Essas variáveis climáticas vão atingir de forma mais intensa o hemisfério Norte. Não precisa de bola de cristal para prever que os furacões americanos serão mais freqüentes e destrutivos.

O mercado é um animal arisco, medroso, e o que mais gosta de fazer é especular. Lembremos dos preços do milho na última safra e safrinha, apesar dos recordes de produção, brasileiro e americano. Em outros tempos os preços teriam despencado e haveria uma quebradeira geral, tipo efeito dominó, com tsunami de sobremesa. Foi a primeira vez, em mais de 40 anos que acompanho o agronegócio, que vi commodity batendo recorde de produção e recorde de preço ao mesmo tempo. Um espanto.

Outra variável diz respeito aos ambientalistas. Pelo andar da carruagem, por exemplo, os transgênicos ainda levam de 5 a 10 anos para ter liberação de plantio comercial no Brasil. Lamentavelmente o Brasil se distancia de seus competidores – USA e Argentina - como fornecedor de grãos, porque a nossa tecnologia começa a se atrasar, perdemos competitividade, a ciência está travada, e não será fácil conquistar a dianteira no quesito produtividade.

Para complicar mais a vida dos agricultores os ambientalistas arrocham a fiscalização no quesito irrigação. Eles "entendem e imaginam" que a água vai acabar. Alegam que irrigação na agricultura "gasta" água, portanto deve ter o uso restrito, seja pela burocracia, seja pela cobrança de taxas. Será mais um fator limitante da agricultura competitiva, em especial no Centro-Oeste. 
Com isso a oferta adicional de alimentos, proveniente do Brasil, não será tão substancial como desejaríamos para atender os novos consumidores urbanos, sejam chineses ou indianos.

Lei de Murphy
Por fim, dentre as minhas "profecias", destaco a Lei de Murphy como variável que colocará os preços dos commodities em alta, para daqui a 15 ou 20 anos. Ou seja, se alguma coisa poderá dar errado para o consumidor, isso vai acontecer, não há dúvidas, a diferença é que o fenômeno Lei de Murphy pode ocorrer no mês que vem, ou daqui a 2 ou 3 anos, e antecipar o cenário que estou prevendo para daqui uns 15 ou 20 anos. Além de guerras e conflitos, a Lei de Murphy se apresenta por problemas pontuais que "enlouquecem" os agentes de mercado: um foco de Aftosa, como o que ocorreu meses atrás na Inglaterra é um bom exemplo. Ou a vaca louca nos USA e Canadá, ou mesmo a Aftosa aqui no Brasil ou Argentina. Os preços atingem níveis nunca vistos.

Bom, não esqueçamos da gripe aviária, ela anda voando por aí nas migrações de aves, sem passaportes e apátridas. Sabemos que o ser humano tem "cutucado a onça com vara curta", de forma irresponsável na questão ambiental, como se já não bastassem os desastres climáticos do tipo El Niño ou La Niña, mas os desastres que prevejo não necessariamente implicam na ação da natureza, mas na ação do homem.

Imaginem, por exemplo, como mais uma interferência da Lei de Murphy, o estouro ou desmoronamento de uma única das 10 ou 12 eclusas existentes no rio Mississipi, que serve de transporte para mais de 80% da produção do Corn Belt americano. Imaginou? Pois os preços praticados pelo mercado iriam explodir, em dois ou três dias bateriam todos os recordes históricos. Essa é uma catástrofe anunciada por alguns setores agrícolas dos americanos, que não conseguem as autorizações legais para fazer a manutenção das tais eclusas, por conta das dificuldades impostas pelos ambientalistas.

Ou seja, ambientalista brasileiro ou americano é tudo igual, é do contra, por princípio, sem nem saber porque, a qualquer hidrelétrica, barragem, até mesmo poço artesiano. Mexeu com água? Então não tem conversa, eles são contra. 
E aí? Dá para acrescentar algo de novo nesses cenários?

Devo explicar que não acredito no aparecimento de novas tecnologias salvadoras da pátria, para aumentar a produtividade, salvo um ou outro produto pontual, em especial nos agroquímicos, estimulando especialmente a fisiologia das plantas. Podemos ter aperfeiçoamentos e evoluções em máquinas, novos cultivares, quem sabe alguma evolução dos transgênicos, e ainda novas técnicas de manejo, mas nada significativo se vislumbra no horizonte. Daqui para frente o aumento da produção terá de ser pela incorporação de novas áreas e pela melhoria das produtividades médias, que ainda andam baixas perto das médias americanas e argentinas. Será ver para crer. Acredito que o horizonte do agronegócio brasileiro é risonho e altamente positivo. Não sou especialista como o agrônomo André Pessôa, mas também faço minhas previsões. 

Em tempo: após as minhas “previsões” acima, feitas em agosto último (2007), os preços dos commodities grãos estouraram no mercado. Errei no prazo, previsto para daqui a 10 ou 15 anos. Pois já começou. A revista The Economist, de 6 de dezembro 2007, fez matéria de capa sobre o tema, reconhecendo o aumento dos preços como definitivo. Vejam também a capa na aba lateral este blog.  Tenho, assim, a íntima satisfação de ter dado um "furo" nos ingleses. Entretanto, sem querer ser pessimista, a situação vai piorar, e pode ser já em 2008. Poderá até haver um certo equilíbrio de preços nos anos seguintes, mas entraram no jogo fatores de enorme influência, e que são os fundos de investimento. Eles descobriram nos commodities um excelente foco de especulação.
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quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

IPCC: e se os cientistas estiverem enganados?

Richard Jakubaszko 

Foi com esse questionamento que redigi a matéria de capa na revista DBO Agrotecnologia, edição 11, que circula a partir dessa semana, e também sobre a instigante entrevista em profundidade realizada com o engenheiro agrônomo e doutor Odo Primavesi, pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste – São Carlos, SP. 
A questão em si tem inúmeros desdobramentos e a história nos ensina que é evidente que cientistas se enganam. Como registrei na abertura da referida matéria a ciência trabalha com certezas, e em cima dessas certezas constrói novas hipóteses para chegar a outras certezas, e assim enriquece o saber humano. O que não deve ocorrer é a construção de certezas em cima de hipóteses, pois o castelo desmorona por falta de base sólida.

É o que parece acontecer com o IPCC, sigla em inglês para Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, que anunciou em maio último o início do fim do mundo para dentro breve.

A lógica de raciocínio do relatório do IPCC é límpida e cristalina: devido ao mau uso – e consumo perdulário – do planeta a humanidade está a perigo de ir para o vinagre a qualquer momento. Não iríamos para o brejo, o que seria bem melhor, isto porque deve faltar água para formar brejos. Tudo por culpa dos gases de efeito estufa, os GEE, que esquentam o planeta, segundo o IPCC, vão derreter as calotas polares, aí os mares vão "transbordar" e invadir os continentes, e a agricultura vai ficar delimitada a algumas regiões do planeta, migrando para outras terras, assim como milhões de pessoas terão de escapulir para outras regiões à procura de alimento, água e de menos calor. 
Com essa antevisão do apocalipse o IPCC recomenda a redução drástica e urgente da emissão de GEE, entre eles o já popular CO2, o gás carbônico, vomitado pelas chaminés das fábricas, escapamentos de veículos, queimadas, e outras ações tresloucadas do bicho homem.

Todavia, a peleja não é tão simples. Se os cientistas estiverem enganados não vai adiantar nada essa tentativa de redução de GEE. 
Verifica-se que muitos cientistas, alguns governos e batalhões de gente no planeta não acreditam numa única palavra do relatório do IPCC. Por não acreditarem não mudou nada no comportamento. Tem até gente que compra indulgência e paga para plantar árvores, mas é muito pouco ou quase nada perto do que deve ser feito. 

Primavesi é um dos 17 cientistas brasileiros relatores e revisores do relatório do IPCC. Assinou o relatório, concordou com as previsões, mas tem opinião contrária quanto às causas apontadas. Primavesi sabe muito do que fala. A tese do contraditório, de sua autoria, tema sobre a qual fiz a entrevista publicada na DBO Agrotecnologia, está sendo desenvolvida há dois anos, e afirma de forma categórica que o aquecimento do planeta é gerado pela ação do sol que incide nos solos degradados e desprotegidos em regiões semi-áridas, áridas e desérticas, e, aí sim, o calor em excesso, o calor refletido, que antes escapava para o espaço, agora é obstruído e contido pelo aumento da concentração dos GEE na atmosfera. 

Nesse caso os GEE funcionam como um cobertor para quem já está com calor. As fotos dos satélites da NASA / NOA / INPE, e de satélites australianos, que ilustram a matéria da DBO Agrotecnologia, mostram os níveis de calor no solo em diversas regiões do planeta, algumas atingem mais de 300 W de calor por m². A conversão explica que existem áreas com temperaturas de mais de 50 graus centígrados no ar acima do solo, e de até 70 graus na superfície do solo. 
Para quem sabe que as raízes das plantas não absorvem água e nutrientes com temperatura igual ou maior do que 33 graus Celsius, pois elas murcham e param de fazer a fotossíntese, fica fácil dimensionar o tamanho da encrenca e de entender a profundidade e importância da tese de Primavesi. 

Primavesi tem ideias claras, conforme registrei na matéria: "a natureza tem normas rígidas, e se estas não são seguidas levam à morte imediata ou lenta do ser humano. O mais inteligente não é subjugar a natureza às nossas tecnologias, mas aliar nossas tecnologias às normas ambientais, como os princípios ecológicos, garantindo e reforçando seus processos naturais, o que vai resultar em elevada eficácia dos insumos utilizados".  

Causas das mudanças 
O 'ponto de não retorno', o antes do pré-apocalipse pode estar muito mais próximo do que imaginamos. Há cientistas que colocam prazo: de 6 a 10 anos para começar a acontecer. Não é pessimismo, mas não dá para brincar com isso. 

Primavesi argumenta: "nas regiões tropicais, onde a temperatura em geral é mais elevada, os processos biológicos, entre eles a decomposição de matéria orgânica no solo, que resultam em liberação de gás carbônico, ocorrem em velocidade de cinco a dez vezes superior em condições normais, e até 50 vezes mais rápido em condições extremas, do que nas regiões de clima temperado. 
Reduções estatisticamente significativas no teor de matéria orgânica de solos agrícolas sob manejo convencional ocorrem no período de 50 anos na Áustria, por exemplo, e em até um ano no Brasil". 

É isso, os gringos entendem de clima temperado e não têm a menor noção do que é que acontece aqui nos trópicos. Para quem deseja aprofundar conhecimentos dessa teoria é recomendável uma leitura da matéria de capa da DBO Agrotecnologia, aqui neste espaço não há como mostrar essa riqueza de detalhes, a começar pelas imagens. 

Isto pode ser feito no site da revista www.dboagrotecnologia.com.br e se desejar pode fazer uma assinatura, que é gratuita para agricultores, agrônomos e técnicos. 
Para complementar o tema tem outra matéria sobre meio ambiente e aquecimento, onde há outro questionamento interessante, se "O agronegócio é culpado ou inocente?". 

Na mesma edição, matérias sobre "Boas práticas agrícolas", texto do próprio Primavesi, que tem propostas concretas para resolver a questão do aquecimento, entre elas fazer plantio direto até em pomares e reflorestar os oceanos de lavouras – e ainda nas urbes – nem que seja com árvores de plástico. 

Afora tudo isso tem uma deliciosa crônica do ruralista de quinta geração, o filósofo Luiz Suplicy Hafers, sobre café sombreado, que remonta às origens da Etiópia para mostrar que os antigos tinham tecnologia e razão. 
A revista é sobre agrotecnologia, mas isto não quer dizer que boas tecnologias não possam ser antigas e eficientes. 

De outro lado, a razão dessa crônica é lembrar o óbvio: existem cabeças que pensam diferente de outras, e isso é uma das maravilhas da vida, entretanto, para que nos livremos do vinagre, vamos ter que agir em conjunto, num mesmo sentido e com igual objetivo. Se alguém aqui não entendeu a importância da questão do engano dos cientistas explico melhor: é que antes da teoria do Primavesi a gente só poderia resolver o problema do aquecimento global assoprando muito, pra ver se conseguiríamos refrescar e dispersar os gases CO2, mas agora vai dar para abanar também, e só isso já é uma boa alternativa pra aliviar os beiços, além de mitigar a ameaça de fritura que já apontou lá no fim do túnel.
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Sinais do fim do mundo? As abelhas estão indo embora...

Richard Jakubaszko 
A notícia estava em página interna da Gazeta Mercantil da última sexta-feira, 30 março, em míseras duas colunas, com 7 cm de altura, e anunciava que "enxames de abelhas sumiram sem deixar rastro", no Illinois, USA. 
Embora especializado em agronegócio sou quase neófito em abelhas. Porém, a especialização em agricultura fez com que a displicente e "insignificante" notícia estampada num jornal de negócios me deixasse senão horrorizado, pelo menos de cabelos em pé, isto é, quase a mesma coisa. 
A ciência tem como fato que sem abelhas não há agricultura e, portanto, sem elas não há alimentos. Esse laborioso inseto, ao qual os urbanos ficam histéricos só pelo fato do mesmo sobrevoar por perto, poderia ser chamado de "operário de Deus", pois é incansável na polinização das plantas, e sem a qual estas não produziriam alimentos e tampouco se reproduziriam. Existem outros insetos e até mesmo pássaros polinizadores, mas a abelha é, de longe, o mais difundido e mais importante. 
Nenhum outro grande jornal deu a notícia, afora o Estadão, e a Gazeta do Povo, do Paraná. Estes se limitaram a registrar os despachos das Agências EFE e Bloomberg News, onde constava o estupor e incredulidade de especialistas e apicultores, que informavam não ter explicações para o estranho fenômeno. As abelhas foram embora e largaram a rainha, conforme as notícias, e não deixaram pistas. 
Diante da insuficiência de dados nos jornais pesquisei na Internet, e esta mostrou as razões de seu sucesso diante da mídia impressa. Lá existem indicações de que o dito fenômeno não está restrito a Illinois, mas ocorreu em outros estados americanos, e foi observado também em algumas regiões da Alemanha. 
Êpa! Nenhum jornalista atentou para o importante fato? Será que desconhecem a importância das abelhas? Ou foi mais uma barriga imperdoável? Barriga, no jargão jornalístico, é a omissão de notícia ou fato importante., e também a notícia publicada de forma errada. Desconheço o coletivo de barriga. 

Antecedentes 
 Não satisfeito com o encontrado na Internet entrevistei por telefone Paulo Cezar Brosmann, apicultor em Goiânia, e que há 27 anos atrás concluiu um doutoramento em apicultura na Alemanha. Confirmou que o fenômeno é, efetivamente, raríssimo, mas há antecedentes. Um fato recente na história ocorreu em Chernobyl, quando vazou radioatividade naquela usina nuclear. Horas antes de a tragédia ser constatada os sensores das abelhas detectaram o problema. Em algumas colméias as abelhas fecharam-se e morreram sufocadas. Em outras abandonaram rapidamente o local sem deixar pistas. 
Existem muitas possíveis explicações para os sumiços coletivos das abelhas, como uso de agrotóxicos fortíssimos, presença de ácaros ou formigas em grande quantidade, ou ainda inusitados e raros fenômenos da natureza, como enxames de gafanhotos ou besouros, mas seriam causas localizadas, não teriam se reproduzido repetitivamente em todo o estado de Illinois. 
Na Internet, demonstrando que falta credibilidade no que se registra em seus milhões de sites e blogs, já há sugestões e até mesmo acusações explícitas e irresponsáveis, de que os transgênicos seriam os responsáveis pelos sumiços dos enxames de abelhas, em especial o milho Bt, que tem propriedades inseticidas. 
Como alguns internautas, especialmente em sites ambientalistas, "navegam e surfam na maionese", aparecem outras explicações de que seria, por exemplo, o uso excessivo de telefones celulares que estaria provocando o desaparecimento das abelhas. Argumentam que os celulares promovem desorientação sensorial nas abelhas, fazem com que "percam o rumo de casa", e assim dispersam-se. Explicação plausível, mas isso não iria ocorrer só com as abelhas de Illinois e da Alemanha, até porque se calcula em centenas de colméias a debandada das abelhas. 
As causas devem ser outras, com certeza. Estes fenômenos se mostram localizados e restritos, ou específicos, mas podem se alastrar. Não é o caso, aqui neste espaço, de se assumir uma postura catastrofista, ou mesmo alarmista, síndromes que fazem parte do sangue e do DNA de jornalistas, mas que a notícia merecia destaque maior merecia, e uma investigação mais profunda, fosse pela Internet ou entrevistando algum especialista. Não apenas os leitores, mas as abelhas mereceriam essa atenção. 
Não se conhecem as causas, é fato, mas de toda forma é um sinal da natureza ao qual a grande mídia não deu a mínima importância, sonegando uma informação que já preocupa até mesmo o Congresso Americano, conforme registros nas próprias notinhas publicadas, reproduzidas quase fielmente, o que já demonstra certa preguiça profissional. 
Ora, se não tiver abelha não vai haver polinização, e vamos ter de viver de plantas que não tenham polinização. Seria previdente a ciência começar a fazer as contas. 
Considerando que a Amazônia é neutra na captação de carbono e emissão de oxigênio, porque são árvores maduras, e dessa forma ela não é o pulmão do mundo como se apregoa, significa dizer que boa parte do saldo positivo da fotossíntese é feito por plantas jovens, no caso as lavouras comerciais de soja, cana, milho, algodão, pastagens etc. 
Assim, estamos mal arranjados meus amigos... 
Um desequilíbrio desses acelera a bancarrota de forma irremediável de boa parte do planeta. Espero que seja problema localizado no Illinois, ou só do poderoso USA. Assim eles começam a acreditar na merreca que se está fazendo do planeta, eles à frente. 
A julgar pelas palavras de Albert Einstein, ditas há mais de 60 anos atrás, "olhem as abelhas, se elas sumirem a humanidade tem um máximo de quatro anos de sobrevida, pois não haverá plantas e nem animais, a polinização é a grande responsável pela produção de alimentos". 
Se a grande mídia considera não importante o sumiço de 25% dos enxames de abelhas de Illinois, e não informa que idêntico fato ocorreu em outros estados americanos, e ainda em regiões da Alemanha, isto não quer dizer que não seja importante, e nem que não tenha acontecido também em outros apiários, mundo afora. Não são apenas os apicultores donos das colméias de abelhas fujonas que estão estarrecidos, ou os especialistas, eu que escrevi, e provavelmente você que acabou de ler esse texto, também estamos incrédulos com a grande mídia. 
Bom, e preocupados para saber a causa da diáspora das abelhas, porque aí tem coisa, e não é um bom sinal. Seria prudente ficar de olhos abertos.

Agrônomo espertinho

Richard Jakubaszko 
Tem gente que por falar demais arruma muitas encrencas, e tem gente que por falar de menos faz bons negócios. 
Essa é uma história da qual acabei, indiretamente, participando como espectador, lá nos idos dos anos 80, e registrei esse fato no livro “Marketing Rural – Como se comunicar com o homem que fala com Deus” pelo exemplo emblemático de um tipo de decisão de consumo (emocional) tomada por um agricultor. 
Havia um agrônomo, lamentavelmente já falecido, que era especialista em pulverização de agrotóxicos. Trabalhava numa multinacional de defensivos, que hoje nem existe mais, e dava assistência a grandes clientes nas pulverizações, principalmente em casos de pulverizações aéreas. 
Era um profissional dedicado, competente, e um perfeccionista de mão cheia, além de inteligente e honesto. Bom, pelo menos não era exatamente desonesto, o que já seria uma brutal diferença entre uma coisa e outra. 
Por volta de 1982, época em que os tempos da economia estavam numa recessão brava, esse agrônomo perdeu o emprego na multinacional. Pegou o dinheiro do FGTS e as economias e comprou um avião Ipanema usado. Montou no norte do Paraná uma empresa de aplicação de defensivos, e começou a ganhar dinheiro. Era o único, e prosperou rápido. Logo, mais dois aviões estavam incorporados ao que já era quase uma frota de 3 exuberantes aeronaves. Até que, em 1987, reencontrei o agrônomo, ainda dono da companhia agrícola de aviação. Conversa vai e conversa vem, a situação naquele momento estava péssima. Tinha o financiamento dos aviões para pagar e nenhum agricultor passando perto da porta da empresa dele. E nenhuma perspectiva, afinal, estava-se em plena ressaca do Plano Cruzado. 

O que ele fez? Coisa de gênio do “marketing rural” e do “jeitinho brasileiro”, segundo as más línguas. Dava uns vôos em áreas periféricas próximas a determinadas propriedades. No dia seguinte, num movimento que começava de manhãzinha, recebia a visita de dez ou doze agricultores, todos curiosos, preocupados, alguns muito falantes, querendo saber o que é que ele estava aplicando, e o agrônomo quieto, só ouvia, não dava explicações. 
Se o agricultor insistisse muito ele só dizia que estava dando uns vôos em áreas pequenas. Um dos visitantes falantes comentava que um dos donos daquelas propriedades parece que tinha visto umas lagartas novas na lavoura da soja ou do milho. 
E o agrônomo quieto, não confirmava e nem desmentia. Após uma conversa rápida, que faria inveja a muito camelô, ficava marcado para o dia seguinte a aplicação de algum veneno, pois “afinal, os bicho tavam mesmo demorando a chegar, mas se eles já estavam na vizinhança, mais dia menos dia iriam chegar, e era bom prevenir....”.
Bom, os aviões tinham de voar e o nosso amigo da história tinha de pagar as suas contas. Não se fazia de rogado, agendava o trabalho, dava orçamento e até recebia adiantado. 
Na conversa que tive com ele, em que me contou os fatos, ria matreiro, e complementava “não vendi nada, eu ficava quieto, eles que vinham, falavam, falavam, e mandavam pulverizar...”. 
É óbvio que essa “descoberta” foi casual, e aconteceu depois de um dos vôos de exercício e manutenção das aeronaves. Na ausência de trabalho para os aviões os mesmos tinham que voar de qualquer jeito, não podiam ficar parados para não enferrujar, e assim acabavam gastando combustível e tempo hora dos pilotos, gerando mais despesas para a empresa. Enchia-se o tanque de combustível dos aviões, e também os tanques dos locais reservados para os agroquímicos, nesses casos simplesmente com água, e lá iam os aviões “trabalhar” e fazer sua manutenção. 
Como os pilotos agrícolas gostam de “viver perigosamente”, e nessa profissão de doido que é ser piloto agrícola, que mais parece suicida alegre, o que não falta é maluco, eles simulavam pulverizações reais, davam rasantes e ficavam voando a 3 metros de altura sobre a lavoura... 
O que não era casual era a curiosidade e a ingenuidade dos agricultores vizinhos...
A empresa de aviação agrícola, não precisa nem dizer, voltou a exibir um pujante e maravilhoso incremento nos seus negócios. Tudo porque o dono não era desonesto, mas ficou esperto sem querer e sem planejar, e ainda por cima porque falava pouco... 

A crônica acima foi extraída e adaptada do livro “Marketing Rural – Como se comunicar com o homem que fala com Deus”, de autoria do jornalista e publicitário Richard Jakubaszko. Este livro foi reeditado, em 2ª edição, 2006, pela Editora UFV, da Universidade Federal de Viçosa – MG.

Você já viu ministro da agricultura correr de trator? Eu vi.

Richard Jakubaszko
Foi assim: nos idos de 1976 eu trabalhava na assessoria de imprensa e relações públicas da Valmet Tratores, hoje Valtra, do Grupo AGCO. Preparamos durante meses o lançamento do trator florestal, intimamente conhecido como florestão. 
Tivemos muitas idéias para promover o lançamento, e de especial mesmo criamos um evento a se realizar na fábrica, com presença de altas autoridades, afinal o inédito equipamento merecia, tinha na genética a tecnologia Valmet Oy, finlandesa líder mundial no segmento. 
 
Preparamos a lista dos convidados com ministros, jornalistas, congressistas, fornecedores, clientes, revendas, o clero. Estávamos em outubro, e a data marcada, por coincidência, coincidiu com o Salão do Automóvel daquele ano, que seria inaugurado pelo presidente Ernesto Geisel. 
 
Tentamos incluir o presidente, já que estaria em São Paulo, e despachamos convite via telex, porque não existia internet nem fax naquela época. Se ele viesse, a festa estaria garantidíssima. Como o alemão era gente positiva, e não fazia nhém-nhém-nhém, no dia seguinte veio o aviso de que não seria possível, por compromissos de agenda. 
 
O ministro da agricultura de Geisel, o competente engenheiro agrônomo Alysson Paolinelli confirmou de bate pronto o convite por telex ao presidente da Valmet, na ocasião o Professor Hugo de Almeida Leme, ex-ministro da agricultura de Castelo Branco. 
 
Por telefone combinamos com a assessoria detalhes da visita, horários, translado do ministro por helicóptero, do aeroporto de Congonhas até a fábrica em Mogi das Cruzes, e depois escala ao Parque Anhembi quando Paolinelli se juntaria à comitiva presidencial. 
 
Os problemas começaram no dia do evento, quando veio um telefonema do Palácio dos Bandeirantes, que emprestara o helicóptero. Queriam as coordenadas de voo. Passamos longitude, latitude etc. Mas tinha de ter uma biruta. Você não sabe o que é isso? Pois biruta é aquele saco de ar, super comprido, que parece um enorme saco de coar café, que fica pendurado em mastro bem alto, para dar a direção do vento aos pilotos das aeronaves. 
 
Como não tínhamos a biruta, e o voo se daria dali a poucos minutos, pois o piloto estava saindo para ir a Congonhas, ele deu instruções técnicas detalhadas: "fixem no chão um mastro com barra de ferro, na altura de pelo menos 6 metros de altura, e lá em cima colem com fita adesiva uns 2 a 3 metros de papel higiênico, pra ficar balançando". 
 
Fizemos conforme solicitado, e resolveu. A inusitada cena do higiênico papel tremulando ao vento mogiano causou muito ti-ti-ti, durante e depois do evento... 
Outro pedido incomum: "façam um círculo no chão, com tinta branca, de 5 metros de raio, com risco de 30 cm de largura, e uma cruz vermelha bem no meio do círculo". Perguntei brincando se podia ser um "x". Podia, para o piloto lá em cima era tudo igual, fosse cruz ou "x".
 
O helicóptero aterrissou perfeito no círculo de tinta fresca cerca de 1 hora depois, com direito a parabéns do piloto e comandante, pela rapidez e eficiência. 
E a visita de Paolinelli, comitiva, e mais de 150 convidados, transcorreu conforme planejado. Mas a Lei de Murphy existe mesmo. Tínhamos vencido o primeiro round, mas faltava o resto. E Murphy por perto... (a Lei de Murphy é assim: se algo pode dar errado, então vai dar errado!). 
 
Depois de percorrer a linha de montagem os visitantes foram concentrados no pátio da fábrica, que era ladeado por um gramado plantado em um enorme barranco, tinha uns 5 a 6 metros de altura, com declividade de uns 25 a 27 graus, era íngreme mesmo. Ali no pátio se daria o grande momento do evento, o clímax. 
 
Para demonstrar a capacidade do trator florestal da Valmet de trabalhar em áreas acidentadas, o que é típico das áreas florestais, mesmo carregado de toras de madeira na carroceria, planejamos o florestão descer pelo fofo gramado do tal do barrancão. Quando estávamos no meio do pátio, o tratorista lá em cima do barranco foi avisado, ligou o motor, que mais parecia motor de avião a jato, pelo que me lembro eram 450 cv no motor, e ainda tinha o peso do "donzelo", mais de 15 toneladas, sem contar as 30 toneladas de toras de madeira na caçamba. 
 
Quando aquele monstrengo de quase 4 metros de altura (o florestão, gente!) apontou lá em cima, e se tornou visível a todos nós que estávamos bem embaixo, e o "bichão" começou a descer, um barulhão ensurdecedor, primeiro todo mundo congelou. Aí, o trator deslizou de lado uns 2 metros na grama fofa, com toda a sutileza e suavidade de seu peso e tamanho. 
 
O motorista deu uma acelerada na rotação do motor, para provar que estava no controle e dono da situação, e reiniciou sua firme descida com plena segurança, mas lá embaixo a assistência havia descongelado: todo mundo disparou a correr, uma corrida civilizada é claro, eu primeiro, o ministro junto, e todos os convidados também, sai da frente, sô! O Professor Hugo Leme ficou para trás, já estava com certa idade, mas moveu-se com agilidade, repentinamente entusiasmado e adepto de esportes velocistas. Como foi tudo surpresa, não houve tempo para ensaio, os fotógrafos contratados pela Valmet, e também fotógrafos da imprensa tinham corrido, ou melhor, descongelado também. 
 
O florestão desceu são e salvo, ninguém se feriu, foi só um susto, nada demais. Lamentavelmente não houve uma única foto para registrar a brilhante demonstração. Foi assim que vi um ministro da agricultura correr de um trator. Na verdade nem isso eu vi, quando o florestão derrapou na grama bem em cima da minha cabeça, corri na frente de todos, caso contrário, me ocorreu hoje, eu talvez não pudesse contar essa história, 30 anos depois. 
 
Entretanto, tenho de admitir com honestidade que eu saí na frente, talvez tenha provocado o "estouro da boiada", mas o ministro chegou primeiro ao lugar que conseguimos avaliar como "área de segurança", alguns metros à frente, até porque ninguém se atreveu a olhar para trás e esperar para saber se estava a salvo mesmo. Simplesmente corremos o necessário, mas naquele momento, que o susto foi grande, isso foi. 
 
Até hoje eu me lembro. O Murphy tinha deixado a sua marca. Lembrei dessa história a propósito da merecida homenagem feita ao Allyson Paolinelli e ao Edson Lobato, da Embrapa, que ganharam o World Food Prize, que pela primeira vez saiu para o Brasil, vide www.worldfoodprize.org uma espécie de "prêmio Nobel da Agricultura", como definiu o agrônomo Fernando Penteado Cardoso, presidente da Fundação Agrisus. O World Food Prize foi inspirado por Norman Borlaug (Prêmio Nobel da Paz) e instituído pelas Indústrias Kemin, dos USA, e premiou o extraordinário trabalho de conquista do cerrado brasileiro, em parte feito por esses dois gigantes do agronegócio. 
Antes tarde do que nunca. 
Parabéns, amigos!
 
 
 
 
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A Igreja Católica não é criminosa

Richard Jakubaszko 
Discordo da opinião de que a Igreja Católica é criminosa ao inibir as ações de políticos e do governo em distribuir preservativos nos sertões do Brasil, e de que essa posição seria a principal causa do avanço da AIDS.

Não distribuem porque não dá voto, assim como esgoto não dá voto. Discordo, porque a disseminação da AIDS não é no sertão ou nos interiores do Brasil, está nas grandes cidades e, principalmente, nas turísticas e portuárias. Nas pequenas o moralismo é evidente, funciona como freio moderador para atos não sintonizados com o que a sociedade pensa, e onde todo mundo se conhece.
Nas grandes a juventude é livre – na condição de anônima - e pratica o que acha que pode, seja sexo ou drogas.

Lamentavelmente a AIDS avança silenciosamente no Brasil em todas as classes sociais e econômicas, dissimulada por falsas estatísticas que indicam sua involução, em especial doentes das classes C e D, acobertadas por médicos coniventes que mascaram diagnósticos. O modismo da elite intelectual brasileira de responsabilizar a Igreja pelo descontrole e avanço da AIDS incomoda-me como católico porque é mais uma hipocrisia brasileira, como tantas que grassam pelo país.

Apesar de a Igreja pactuar o sexo apenas no casamento – e para procriação da espécie – isso não foi obedecido. Então, o que se pretende agora? Que a Igreja contrarie e ignore o dogma milenar e recomende o preservativo? Adiantaria? Se os "fiéis" não praticaram o preceito antes, porque o fariam agora? Nem alguns padres usaram os preservativos, e estão com AIDS. Os cônjuges que traem jamais vão usar em casa, seria admitir culpa.

Ora, meus amigos de opinião contrária, saiam desse modismo e mudem de opinião. Não me envergonho de mudar de opinião, porque penso. Então, raciocinem comigo. Pedir que a Igreja Católica recomende o uso de camisinhas é um paradoxo e uma quimera, assim como pedir ao Ministro da Justiça que – ante a antiga legislação permissiva para armas de fogo – autorizasse usar silenciador para não incomodar o vizinho. O mesmo da recomendação malufiana: estupra, mas não mata!

O problema da AIDS está na matriz cultural do povo: macho não usa camisinha; macho come todas e dá 3 ou 4 por dia; usar camisinha é como chupar bala com papel; virgindade dá câncer; e a pior, quem passa AIDS é bicha, mulher não, porque tem vagina lubrificada etc. O avanço da AIDS só vai perder velocidade se o governo encarar o problema de frente: escola para todas as crianças – com educação sexual.

Em paralelo façamos campanhas realistas e agressivas, e não à base de desenho animado, ou com artistas globais e simpáticos, e apenas durante o Carnaval, hipócritas campanhas lights.

Tem de dizer que cada transa com parceiro novo é 50% de chance de pegar AIDS, porque o outro tem ou não tem o vírus. Na segunda transa mais 50% de chance, o que eleva a chance para 75%, e na terceira vez o sujeito está com 87,5% de chances de ter contraído AIDS. O risco é progressivo.

Quem sobe num avião com 50% de chances dele cair?

O paradigma implícito de que felicidade e sucesso está no sexo - apregoado na TV, cinema, nas revistas, deve ser repensado. Sexo quase explícito na novela das 8 faz mais pelo avanço da AIDS – como incentivo à prática – do que discurso de padre recomendando uso de camisinha para deter a epidemia.

Isso me lembra a história do marido que levou a esposa ao zoológico e mandou-a mostrar pernas e seios para o orangotango na jaula. Depois de alguns safanões o macacão derrubou a porta e avançou para a mulher enquanto o marido avisava: agora diz rápido prá ele que tá com enxaqueca, diz que tá com dor de cabeça, diz... 

Não vi nenhum padre proibir preservativo, no púlpito ou na TV. É fácil incentivar o jovem – que é inseguro – e excitá-lo, e depois culpar a Igreja porque não recomenda a camisinha. Não estou sugerindo que voltemos à era vitoriana, mas lembremos o que ocorreu como conseqüência da epidemia de sífilis, também fatal naquela época. Houve uma mudança de paradigma no comportamento da sociedade para deter o avanço da epidemia.

Não culpem a Igreja de proibir o uso – ela não proíbe explicitamente, nem adiantaria, apenas não incentiva o uso.

A ação e a postura da mídia, ao lado das indústrias do lazer e da moda, de estimular sedução, é a principal incentivadora da epidemia – junto com os hormônios próprios da idade. Não há diretor de filme ou novela que não tenha sua concepção individual e imperiosa necessidade de mostrar no mínimo uma cena caliente de sexo (acho estranho isso...).

Guardo em meu mais profundo íntimo uma plena identificação na contestação de inúmeros hábitos e tradições da sociedade humana, a exemplo da personagem Emília dos livros de Monteiro Lobato, onde aprendi minhas primeiras letras. 
Em paralelo, até por uma questão de caráter, e também da atividade jornalística, onde convive-se no dia-a-dia com opiniões contrárias, acredito piamente no embate das idéias como fator de crescimento individual e coletivo, e lamento profundamente o silêncio dos que se sentem agredidos pela postura dos críticos da Igreja Católica.

Há flagrante omissão, é uma fuga e um comportamento galináceo dos católicos brasileiros nesse assunto, em que comprovam o horror atávico aos temas polêmicos, o que também não deixa de ser uma autêntica hipocrisia.

Assim não dá, meus caros amigos a favor ou do contra, eu não sou lobo e nem vocês ovelhas, mas vocês estão turvando as águas dos rios da vida. Não é possível viver em cima do muro e conviver, sistematicamente, com uma no cravo e outra na ferradura.


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Jatropha curcas?

Richard Jakubaszko
O e-mail foi chegando na tela do meu computador e sua leitura revelou aos poucos o longo texto de um press release distribuído por assessoria de imprensa e relações públicas para jornais e revistas e TVs do mundo todo. 
Ao mesmo tempo me deixava intrigado e curiosíssimo. 
O texto, como todos os textos de todos os press releases, é de um otimismo avassalador. Trazia a solução definitiva para todas as problemáticas do mundo e mostrava a empresa que estava por trás de toda essa solucionática, a Bayer CropScience, da Alemanha. 
 
O Professor Friedrich Berschauer, Presidente do Comitê Diretivo da Bayer CropScience AG, na coletiva anual realizada em Monheim, em 6 de setembro último, revelou ao mundo a Jatropha curcas, miraculosa solução para o futuro dos biocombustíveis.  
 
Jatropha curcas – dizia o press release: “uma matéria prima alternativa para biodíesel. Em resposta à enorme demanda global por biocombustíveis, a Bayer CropScience está trabalhando formas de usar plantas que não tenham sido utilizadas na agricultura como matérias-primas economicamente eficientes. Uma dessas plantas é a Jatropha curcas, um arbusto oleaginoso com fruto não comestível que cresce predominantemente em regiões áridas. As sementes consistem em mais de 30% de óleo que pode ser usado para fazer um biodíesel pouco poluente que reduz as emissões de CO2. A vantagem é que este biodíesel pode ser usado em diversos motores no mundo inteiro sem a necessidade de modificação técnica extensiva. A Jatropha pode ser cultivada em áreas marginais nas regiões tropicais e subtropicais ou, em outras palavras, em áreas inadequadas para a produção de culturas para alimentos”. 
E concluía o Professor Berschauer: “esperamos que nossa pesquisa nessa área se torne uma contribuição fundamental para o desenvolvimento de uma indústria de biocombustível sustentável”. 
 
Fiquei ainda mais curioso, pois sei desde criancinha que, se é Bayer é bom! Mas que raios de planta é essa Jatropha curcas? Fui pesquisar, e descobri: para quem não sabe, a Jatropha curcas é o nosso já popular, mas ainda desconhecido pinhão manso, agora descoberto pelos alemães. 
 
Ora, a Bayer CropScience deve saber do que fala, e com certeza seu presidente mundial avaliou cuidadosamente o texto da mensagem, olhando a questão por diversos ângulos, seja no científico em geral e no agronômico em particular, além do financeiro, jurídico e mercadológico, sem esquecer do mais importante, o compromisso com os acionistas, que são os patrões da Bayer. 

A Bayer Ag não brinca em serviço, pensei comigo, é empresa centenária, já passou do faturamento de um bilhão de euros e caminha para os dois bilhões, conforme enfatizou seu chefe supremo na coletiva mencionada. Portanto, olha só a importância que eles dão para as nossas coisas, e que nós menosprezamos todos os dias. A informação transmitida no press release me levou a uma reflexão sobre a situação como um todo, e isso me proporcionou algumas conclusões, que vou dividir com os leitores: 

1 – conforme disse o Professor Berschauer, “A inovação e as novas tecnologias ajudarão a atender à crescente demanda por plantas produtoras de alimentos e de energia”. Portanto, concluí que a biotecnologia vai trazer inúmeras novidades no futuro próximo. Vai ser de assustar os ETs o que vem aí pela frente. Vai aparecer solução, na área da biotecnologia, que trará benefícios não apenas aos agricultores, ou à agroindústria, mas aos seres humanos. As vacinas são apenas uma avant premiére do que vem por aí. 

2 – a Bayer CropScience, nos revela o Professor Berschauer, iniciou um programa no ano 2000 com a finalidade de trazer para o mercado 26 novas substâncias ativas para proteção de culturas, previsto para até 2011. “Esperamos que estas substâncias tenham o potencial combinado de vendas para atingir o pico de aproximadamente 2 bilhões de euros”. 
Ou seja, é inegável que eles sabem ganhar dinheiro. Prova disso é de que com o café os alemães ganham muito mais dinheiro do que nós brasileiros, lá na Alemanha, sem plantar um único pé de café. 

Já falei disso no livro Marketing da terra (Editora UFV - 282 pg., 2005 – atenção: faça um autor feliz, adquira e leia esse livro, pelo amor ao seu negócio! ligue 11 3879.7099 ou mande e-mail para richardassociados@yahoo.com.br). 

3 – se a Bayer CropScience já reconhece o pinhão manso como uma das solucionáticas, a ponto de o presidente mundial da empresa colocar isso como fato relevante de seu discurso numa coletiva anual, o que devemos nós, os brasileiros, achar disso? 
 
Tenho ouvido e lido muita baboseira a respeito do futuro fracasso do biodíesel brasileiro, em paralelo sobre o etanol, de que é um ufanismo tupiniquim, e de que plantar biodíesel ou etanol vai tomar áreas de plantio de alimentos, e ainda de que no futuro só vai ter rapadura pra comer.
Sem contar o pessimismo da elite nacional, tucana ou não, de achar que “esse é o novo programa do presidente Lula para arrumar mais votos em 2010”. 

4 – até quando o brasileiro vai persistir com a mania de desvalorizar o que é nosso e só admirar e respeitar o que é dos gringos? Até quando vai vigorar a síndrome e o complexo de Macunaíma? Que herança maledeta! 

5 – olho vivo minha gente! Daqui a pouco, assim como já fizeram com a rapadura, algum gringo espertinho registra e patenteia o pinhão manso, ou melhor, a Jatropha curcas, e aí como vamos ficar? 

6 - já sei, com as curcas na mão!
 
 
 
 
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O carrasco, a pipoca e a santa.

Richard Jakubaszko
Aprendi que nunca se deve misturar as coisas. Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Se umbanda funcionasse o campeonato baiano terminava sempre empatado, conforme o aforismo de Nenê Prancha, futebolista juramentado. 
 
Inesquecível Itália 3 x Brasil 2, Copa do Mundo, Espanha, 1982, o carrasco Paolo Rossi 3 e nós 2. Uma tortura! Tínhamos o mais belo dos padrões de jogo de seleções brasileiras de todos os tempos, sob o comando de Telê Santana, que se mandou embora semanas atrás, às vésperas, portanto, e vai assistir a copa no telão de plasma do divino, 128 polegadas, som quadrifônico, sem delay. Telê vai lembrar que, no Sarriá, Zico, Falcão, Éder, Cerezzo & Cia., jogavam por música. A seleção encantava até os inimigos. Pode não ter sido a melhor seleção de todos os tempos, mas foi das melhores. 
O Brasil inteiro jogava embalado pelo ritmo daquela seleção, tão ou mais que a seleção de hoje na Alemanha. 
 
Lá em casa, antes do jogo, fizemos a preparação das mandingas tradicionais como em todos os jogos da seleção em mundiais. Antes do jogo pipoca na panela e cerveja no freezer. Tudo ficava pronto, em estado de concentração, à espera do grande momento. Quando a TV abria o sinal da transmissão direta acendia-se o fogão, a pipoca explodia até os piruás em comemoração prévia. 
 
Na audição dos hinos a farta tigela de pipoca já "segurava" a expectativa da turma. Minha mulher, as duas filhas, elas na época com 9 e 7 anos, e eu, com os rituais de sempre, na frente da telinha. São raros os brasileiros que não têm seus rituais, esses eram os nossos... tem gente que assiste os jogos sempre com o mesmo chinelo, ou a mesma camisa velha, boina, e até cueca, sem nunca lavar, porque se uma vez funcionou tem de funcionar sempre. Tenho um tio, hoje na casa dos setenta, que na copa de 58 teve o braço quebrado, e ouviu pelo rádio a copa inteira com o braço engessado. Pois até hoje, em todas as copas, ele engessa o mesmo braço, na certeza de que mais uma vez vai funcionar... bem, funcionou 5 vezes, vai funcionar pela sexta vez? 
 
Em 1982 a bola rolou no Sarriá, muita ansiedade na sala de casa, a pipoca se foi rápida, e Paolo Rossi fez o primeiro. Mais nervosismo. Empatamos, que alegria!!! Agora vai... 
 
Veio o intervalo e no reinício do segundo tempo Rossi fez 2 x 1, que sofrimento! Quase uma eternidade depois, empatamos de novo! Que festa! A seleção crescia em campo. Somos melhores, vamos ganhar! 
 
A primogênita ia da sala para o dormitório, sem disfarçar o pânico. Fazia orações para Santa Rita de Cássia, padroeira da família. Não dei importância para suas idas e vindas, mas percebia o movimento, até que Rossi - carrasco filho da puta!!! - fez 3 x 2, quase no fim do jogo. Que decepção! Maledeto esse Rossi! No final do jogo, estupefata, candidamente, minha filha comentou que não entendia mais nada, rezara e acendera vela para Santa Rita, e nos dois gols anteriores o pedido tinha dado certo. 
 
Aí caiu minha ficha! Descarreguei a raiva de uma só vez:- maluca, bandida, panaca!!!, Você rezou prá santa errada, Santa Rita de Cássia é italiana, nunca iria atender teu pedido... 
 
A santa meteu seu dedo em favor da azurra? Vai saber... Na dúvida nunca mais misturamos orações e futebol, só pipoca e cerveja, e seguimos adeptos de Santa Rita de Cássia.
 
 
 
 
 
 
 
 
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Oração dos jornalistas

Richard Jakubaszko  
"Oração à Nossa Senhora dos Salários Baixos"  
Por Jor Analista dos Dias Santos 
Ajudai-me Nossa Senhora... porque têm vários dias para chegar ao fim do mês e o salário já extinguiu-se, e no mercado financeiro o ministro da fazenda de plantão enxuga o meio circulante, reduz o déficit fiscal e orçamentário, e torna a vida dos cidadão comum como nós uma ciranda financeira sem dinheiro à vista... 
...segundo opinião do chefe de redação "isso é culpa dos incompetentes e dos incultos dos maus colegas de profissão, que nada fazem contra o mau patrão", eles demitem gente preparada e experiente como a mim e contratam mocinha jornalista bonita com diploma novo afim de reduzir a média dos proventos de nossa missão jornalística... porque essa profissão... se a Senhora não sabe, minha santinha, é missionária... é mais importante que a missão dos padres progressistas que insistem na reforma agrária para os sem teto e esquecem de tentar salvar as almas dos pecadores e dos políticos... 
...é mais importante que a missão dos médicos que não exitam de prolongar a dor e sofrimento dos doentes para faturar e viver nababescamente com os frutos de suas regalias e prerrogativas de senhores feudais de nossas vidas. 
Dái-me força minha santinha, porque a gravidez dos fatos urge a sua ação e interferência... e dái a luz aos colegas semi-analfabetos que temos em nosso meio ambiente, um pouco poluído, é verdade, se bem que a gente tem de reconhecer que a nossa língua pátria é prá lá de malandra e çafada, porque... veja bem, minha santinha... uma língua que pode dizer "calça as botas e bota as calças" não é língua de gente séria e comprometida com o vernáculo, seria muito pior o contrário... não fosse a realidade dos fatos diante da visão distorcida dos acontecimentos... 
...esses são pesadelos que me invadem os sonhos diuturnos, e das más notícias que os jornais publicam, que atormentam a vida cotidiana do cidadão carente e contribuinte, isso com a graça de Deus, e também do bom patrão e dos anunciantes rotineiros, tipo de gente boa que ainda existe, sim, minha santinha... 
Me dê forças, minha santinha protetora, para ser isento, não no imposto de renda, porque quase nada ganho pra pagar esse tributo, mas nas minhas matérias... 
Me ilumina para ver só a verdade e a crueza dos fatos sob a luz das mistificações que nos atentam diariamente como mitos e assombrações impertinentes... 
Me ajuda a conseguir uma matéria boa, minha santa, que o pauteiro esteja distraído e me revele suas intenções, e que o chefe de redação me dê essa árdua incumbência, quem sabe eu ganho o próximo esso e assim o Natal será mais farto. 
Livrai-me, minha santa, dos press releases... Afastai-me das pegadinhas... 
Me ajuda, minha santa, a esclarecer alguns desses escândalos e corrupções que todo dia sai nas TVs e nos jornais, eles parecem notícias criadas pelo anjo caído, só com o escopo de confundir quem escreve nos jornais e blogs da Internet, que não deixam o governo governar, tem muita mentira deslavada nisso minha santinha...
...mas aproveita minha santinha protetora, e diz pra aquele torneiro mecânico que tá lá na capital, o aviso pode ser num sonho dele, diga que, se ele beber, que não governe, assusta ele minha santinha... 
As coisas hão de parar de piorar nesse Brasil, minha santinha, com a sua ajuda... 
..lembra o Deus pai que Ele é brasileiro por opção própria... e que se ele optar por não jogar no nosso time, então que fiscalize, pelo menos isso, minha santinha... 
E se a senhora me ajudar a ganhar na mega sena acumulada prometo que monto um jornal, um site e também uma rádio honesta, pra dar só notícia boa e verdadeira e de interesse e utilidade pública das pessoas, e dou emprego pagando excelente salário pra um monte de amigo que está em dificuldades... 
Amém" 
(a oração acima é fruto de recortes de textos jornalísticos publicados, uma pequena colcha de retalhos do cotidiano, de frases e comentários ouvidos nas redações, e de um pouco de imaginação deste escriba, que ninguém é de ferro)

Escolha: agricultura pode gerar riqueza ou miséria

Richard Jakubaszko  
Esta história é exemplar. Aconteceu com a soja, numa pequena cidade chamada Giruá, perto de Passo Fundo, no norte do Rio Grande do Sul. Antes da soja, Giruá era um município independente e emancipado, mas pobre. Tão pobre que a prefeitura não tinha nenhum veículo automotor. Os poucos carros que circulavam tinham placas de outras cidades. Veio a soja, a partir de 1969/1970, e com ela a cidade prosperou, vivendo um momento de riqueza esplendorosa, digna das histórias das "mil e uma noites". Isso aconteceu porque a soja, que apresentava bons preços, repentinamente teve seu preço multiplicado por cinco no mercado internacional. 
Corria o ano agrícola de 73/74, logo depois do primeiro "choque" do petróleo. As nações européias resolveram suspender importações de carne como forma de reduzir despesas com importações e poder continuar importando o petróleo que havia subido de preço a partir dos acordos da OPEP (Organização dos Países Produtores de Petróleo). A importação de carne estava proibida pela CEE (Comunidade Econômica Européia), principalmente dos países da América do Sul, porque grassava uma epidemia de aftosa por estas bandas de cá. 
Portanto, os países europeus precisavam importar, de qualquer maneira, nutrientes protéicos para alimentar e engordar seus rebanhos. Encontravam no atum do Peru uma boa fonte, alternativa e barata, para enriquecer a ração com a farinha de peixe. A grande procura, o aumento da pesca, e a depredação por parte dos pescadores ao meio ambiente ao praticarem a pesca de cardumes em época de desova, obrigaram o governo peruano a proibir a pesca de atum por um período mínimo de doze meses. 
A Europa, em pleno inverno, foi em busca de alternativas e encontrou na soja o substituto mais adequado. Os estoques reguladores dos norte-americanos mal deram para atender as primeiras necessidades dos importadores europeus. A Bolsa de Chicago, durante semanas seguidas, estourou seus índices de aumentos. E tudo em dólar. 
Em plena entressafra norte-americana, e na época da safra brasileira. Se já vivíamos o "boom" na economia brasileira, se estávamos em ritmo de crescimento e euforia de "Brasil Grande" (o Brasil do "Ame-o ou deixe-o!" do "Prá frente Brasil!") imagine o que aconteceu em Giruá! Com a riqueza inesperada, circulando afoita, o volume de automóveis em Giruá foi de 1,2 per capita. Ou seja: 5 mil habitantes e 6 mil carros. Superou o índice de Los Angeles que era de um para um, e então o mais elevado do planeta. Assim, como exacerbação e demonstração do poder de consumo, os sojicultores de Giruá fizeram a festa e comemoraram junto com seus então quase 5 mil munícipes. É claro que ninguém estava dando carros de presente no meio da rua, até porque não eram todos carros 0 km. Mas o fato comprova que consumidor em potencial vira consumidor real quando tem dinheiro sobrando. E que o lixo do rico é a sobremesa do pobre. 
O poder de consumo dos sojicultores, naquela época, e a maneira de demonstrar essa condição, não diferiram daqueles que observamos no citricultor paulista quando este ganhou dinheiro com as geadas nos laranjais norte-americanos ou nos plantadores de qualquer outra cultura que repentinamente atinge a condição de alta procura e pouca oferta. 
Entre outras coisas, essa história demonstra que o produtor rural não é um bicho de sete cabeças e de um único comportamento. Porque, antes de tudo, ele é um ser humano, e como tal não está imune às emoções e idiossincrasias do comportamento humano em relação ao consumo. De qualquer maneira o consumismo torna-se um hábito comum. Não apenas nos produtores rurais, mas em qualquer trabalhador ou investidor, ou empresário, quando tem dinheiro muito além daquilo a que está acostumado. 
No que diz respeito aos produtores rurais, é muito freqüente observarmos que seu hábito como consumidor de insumos se altera na mesma proporção que a alta ou baixa do preço final do seu produto. Na alta ele se revela grande consumidor, inclusive de produtos urbanos. Na baixa, o produtor rural adota a mesma postura gerada por uma recessão: reduz consumo. Até aí nenhuma novidade. A diferença está em que, na recessão, os seres urbanos reduzem seus gastos com o supérfluo, enquanto o produtor rural reduz não apenas supérfluos, mas investimentos, e despesas básicas à manutenção da sua atividade. Ou seja, se regularmente usa adubo, ele passa a usar doses menores; se usa herbicidas de pré-emergência, passa a usar doses menores na expectativa de usar ou não um de pós-emergência. Em sua recessão, o produtor semeia e espera para ver o que vai dar; não se arrisca a comprar antecipadamente os inseticidas e fungicidas na esperança de não precisar deles; não faz nenhum tipo de estoque além do absolutamente necessário e inevitável uso na lavoura; não compra nem tratores e nem implementos. 
O pecuarista reduz ou elimina temporariamente a ração comprada pronta; alguns deixam de aplicar vacinas, e os focos epidêmicos das doenças acabam voltando. E a roda vai girando assim, porque esse é um hábito do produtor rural como consumidor, que, na verdade, se reforça na esteira dos solavancos de nossa economia. 
Estamos hoje (2006) no avesso da história de Giruá. O consumo de quase tudo caiu de forma sensível nas principais regiões produtoras de grãos, em especial no Brasil Central. Ninguém está comprando nada. Sabe aquele sujeito que não paga ninguém? Mesmo quando tem dinheiro sobrando ele compra e não paga. Pois até esse, agora, não está comprando nada... 
O mercado consumidor é perverso, não tenhamos dúvidas. Entretanto, se alguém tem culpa da crise atual este alguém é o produtor rural, independentemente do que vier a acontecer com o câmbio. Se o agricultor hoje é parte do problema, deve entender que faz parte da solução, por isso é que precisa auto-regular o mercado, ajustar o plantio e a oferta de acordo com as necessidades do mercado consumidor, caso contrário teremos, à nossa escolha, a geração de riquezas ou miséria. 
O agricultor precisa de muita união, não para protestar, mas para reconstruir o futuro. Não dá para enfrentar o mercado de peito aberto, é suicídio! E, olha só, temos mais sorte que juízo: vem ai o biodiesel e, principalmente, vem ai o H-Bio, novas alternativas de uso dos grãos, em especial soja, que devem reduzir os atuais estoques. Mas o agricultor precisa se preparar, pois novas crises acontecerão no futuro breve, e cada vez serão piores que as antecedentes. União, minha gente!  
A crônica acima foi extraída e adaptada do livro "Marketing Rural – Como se comunicar com o homem que fala com Deus", de autoria do jornalista e publicitário Richard Jakubaszko. Este livro foi reeditado em 2006, em 2ª edição, pela Editora UFV, da Universidade Federal de Viçosa – MG.