terça-feira, 15 de setembro de 2015

Guerra à pirataria

Richard Jakubaszko
Circulando, a Agro DBO de setembro 2015, que traz na matéria de capa denúncia sobre a pirataria nas sementes.
Há uma guerra em curso.
Mais um percalço da nossa agricultura, não bastasse o clima adverso, os custos pela hora da morte, os juros na casa do chapéu, a falta de infraestrutura.

Nesta edição o leitor encontrará muitos temas de interesse, como "Energia", e saberá as culturas que os gaúchos investem, ricas em amido, para produzir etanol. No café mostramos um produtor mineiro que faz a poda e colheita ao mesmo tempo com a ajuda da "Papa-galhos", e ainda a proposta de um pesquisador da Embrapa que indica culturas alternativas intercaladas com a lavoura principal para facilitar o controle biológico das pragas.
No vídeo abaixo, Tostão, o editor da Agro DBO dá outras dicas da edição,


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segunda-feira, 14 de setembro de 2015

O IAC começa a virar sucata

Henrique Mazotini *
O texto abaixo é cópia da divulgação feita pelo Correio Popular de Campinas, na edição de domingo 13/setembro!

Referência na área de pesquisa no Brasil e um dos ícones da cidade, o Instituto Agronômico de Campinas (IAC) acaba de perder o seu acervo entomológico com mais de 8,5 mil amostras de insetos e pragas, coletadas ao longo de 80 anos. O material foi transferido para a Capital, mesma cidade para onde também será levado o Herbário nos próximos dias. A coleção de plantas conta com mais de 56 mil amostras e 11 mil espécies catalogadas. Algumas delas são anteriores à própria fundação do IAC, há 128 anos. Segundo a Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo, a instituição vem enfrentando um processo de desmonte, que passa pela defasagem no quadro de pesquisadores e encerramento de linhas de pesquisas, que pode trazer consequências sérias para a área da agricultura no Estado.



O acervo entomológico do IAC era composto por uma coleção exclusiva no País, totalmente voltada para o benefício da agricultura, por meio de informações acerca das variadas pragas que atacam as lavouras no Estado de São Paulo. O vice-presidente da Associação dos Pesquisadores do Estado de São Paulo (APqC), Carlos Jorge Rosseto, que trabalhou na unidade de Entomologia do IAC de 1961 a 1987, diz que são pesquisas de muitos anos que custaram caro ao Estado e de enorme valor para os agricultores. Mas o valor histórico, científico e monetário não impediram que a coleção fosse transferida quase que na “calada da noite”, na semana da Independência. O material foi alocado dentro do Instituto Biológico. Os próprios pesquisadores foram surpreendidos com a transferência.



A coleção, segundo Rosseto, é um verdadeiro catálogo sobre a ocorrência de insetos relacionados com plantas no Estado de São Paulo, que permitia saber quais insetos já foram observados causando dano a determinada planta nos últimos 80 anos no Estado, bem como que plantas hospedeiras ele foi observado atacando, qual o tipo de dano causado, época e região de ocorrência e seus inimigos naturais. “A coleção do IAC tem um valor maior que outras coleções de insetos do ponto de vista agronômico. A Constituição exige eficiência e, em nome disto, a coleção deveria ser mantida no IAC, pelo menos até a aposentadoria de seu curador.”



A próxima coleção a ser transferida é a do Herbário. “São 56 mil amostras de plantas desidratadas e todo esse acervo vai ser transferido”, afirmou um pesquisador. De acordo com a associação, os pesquisadores do Herbário também ficaram sabendo da notícia por intermédio de colegas do Instituto de Botânica de São Paulo. Além das pesquisas realizadas por cientistas, o acervo é usado por estudantes e pela própria Prefeitura de Campinas, que faz consultas, por meio da Secretaria do Verde. A tentativa de argumentação de que se trata de uma coleção valiosa foi ignorada. “O IAC tem 128 anos de história, de atividade. O Herbário tem 80 anos, mas há amostras anteriores à criação do Próprio IAC”, afirmou um pesquisador. Projetos de pesquisa estão em andamento no herbário.



Joaquim Adelino de Azevedo Filho, presidente da Associação dos Pesquisadores Científicos de São Paulo, afirma que o processo de desmonte do IAC vem ocorrendo há cerca de 20 anos, com a defasagem do quadro de servidores. Um estudo feito em 2012 apontava que o instituto funcionava com 171 pesquisadores, quando deveria ter 311. Na década de 90, o IAC tinha mais de 400 pesquisadores. A defasagem nos quadros técnicos e administrativos ultrapassam 70%. “Já tínhamos esses cargos em vacância desde 2012. Desde lá a situação se agravou porque servidores se aposentaram ou foram trabalhar em outros órgãos e não houve concurso.” O último concurso foi realizado há cerca de dez anos.



Sobre a transferência dos acervos, Azevedo acredita que a medida foi adotada pela diretoria com diretrizes da Secretaria de Agricultura para redução de gastos. “Estão desocupando o prédio para ficar sem uso ou reduzir custos. Acham que esses acervos não são uma missão do IAC. Isso é o que a diretoria está alegando para fazer o desmonte. Mas o material pertence ao IAC e faz parte da história de Campinas. Estão passando por cima de tudo isso. Acham que é um objeto qualquer que pode ser mudado sem nenhum dano”, disse. Segundo Azevedo, o Instituto de Botânica já teria se manifestado que o material do herbário não tem interesse porque não tem relação com a linha de trabalho deles.



Preocupação

O encerramento de linhas de pesquisas com determinadas culturas também preocupa os pesquisadores. O IAC trabalhava com mais de 100 culturas, mas segundo Azevedo esse número deve ser reduzido para oito. “A proposta da diretoria é que se escolha em torno de oito culturas. Aquelas que os pesquisadores já se aposentaram estão sendo encerradas.” Segundo Joaquim, já foram encerradas as pesquisas com trigo, girassol, mamona e arroz, entre outras. A pesquisa com algodão era feita por oito pesquisadores. Hoje conta com apenas três, sendo que dois deles são aposentados e trabalham como voluntários. A falta de pesquisas pode significar pouca diversidade, insegurança alimentar e até desabastecimento alimentar. “No Estado de São Paulo não tem outros institutos que fazem pesquisa com esse material. Exceto a universidade, mas nenhuma delas tem programa forte de melhoramento que é o caso do IAC. Trabalham com pesquisas pontuais. O melhoramento exige uma sequência. Essas culturas anuais gastam no mínimo dez anos para você começar fazer seleção e começar cultivar no ponto do agricultor utilizar”, explicou.



* o autor é engenheiro agrônomo e presidente-executivo da Andav - Associação Nacional dos Distribuidores de Insumos Agrícolas e Veterinários


domingo, 13 de setembro de 2015

Papa Francisco: “Dói na minha alma quando vejo desmatamento”.

Richard Jakubaszko
Durante entrevista a uma emissora de rádio, a rádio Paroquial Virgem del Carmen, em Campo Gallo, da província de Santiago del Estero, ao norte da Argentina, dia 8 de agosto último, o Papa Francisco falou como um cidadão comum. Não falou como Papa. Até porque, se falou como Papa, como diz meu amigo Evaristo de Miranda, está muito mal assessorado. Francisco acentuou que “a preservação do meio ambiente deve prevalecer sobre os ganhos financeiros”. Por isso, “dói na alma do Papa ver desmatamento para a plantação de soja”, afirma. Francisco prognosticou que “Demoraremos milhares de anos para recuperar as florestas”. E pediu: “Cuidem das árvores e da água”.

Data vênia Papa Francisco, devo informar Vossa Santidade alguns equívocos relevantes que se repetiram na citada entrevista. Esses equívocos também se encontravam em vossa encíclica, a Laudato Si. Com o exercício de 50 anos de jornalismo especializado na agropecuária, exaspera-me encontrar na mídia essas críticas infundadas e recorrentes, que levam ao senso comum recorrente.

A questão é um paradoxo, Papa Francisco. Ou se planta, ou muita gente vai morrer de fome, pois os cidadãos urbanos empilhados em prédios nas grandes cidades ainda não encontraram alternativa para essa necessidade humana. A população mundial, como se sabe, cresce a olhos vistos, confirmação feita pelas estatísticas de entidades como a ONU. Lamentavelmente, apenas 1,2 bilhões de humanos no planeta são católicos, e estão localizados majoritariamente no Ocidente, como nas Américas e na Europa. Nos países da Ásia e África, onde a fé cristã não é majoritária, o crescimento demográfico é ainda maior do que nos países de fé católica. Os católicos, especialmente europeus, parecem não obedecer ao dogma milenar de “crescei e multiplicai-vos”, e andam reduzindo a velocidade do crescimento demográfico em seus países. Mas só isso não impede a necessidade de aumentar as áreas de plantio para se produzir mais alimentos.

Posto isto, Papa Francisco, permita-me comentar:
1 – antes de faltar água, faltará comida para os 7,3 bilhões de pessoas que povoam hoje o planeta. O crescimento demográfico ainda é elevado, porque a expectativa média de vida cresceu substancialmente nas últimas décadas. Se, um século atrás, grosso modo, 2,0% de taxa de crescimento sobre 2 bilhões de pessoas era suportável, hoje com 7,3 bilhões e uma taxa demográfica de 1,7% é suicídio coletivo. No primeiro caso, tínhamos 40 milhões de novas almas/ano. Na taxa atual são 124,7 milhões de pessoas/ano. Insuportável, Papa Francisco, reconheçamos, os percentuais não nos revelam a realidade.

2 – Vai faltar terra agricultável para plantar alimentos, Papa Francisco. Onde há terra disponível, como na África ou China, falta água, porque Deus e a natureza não abençoaram essas regiões de forma igual, como no Brasil e na sua Argentina. Para se fazer agricultura precisa-se de terra, sol e água. Na falta de um desses três elementos não se produz alimentos, nem por milagre.

3 – Agricultores no mundo inteiro estão envelhecendo, e seus filhos não querem seguir a carreira paterna. Cada vez há menos agricultores no mundo, porque o trabalho rural é estafante, mesmo com as modernas tecnologias, e isolado, sendo que as pessoas querem ser gregárias nas urbes.

4 – Agricultores também podem e devem ganhar dinheiro como sustento de seu trabalho, e eles fazem isso. Mas é uma atividade incerta, Papa Francisco, pelas manipulações dos compradores, ou pelos malfeitos do clima, ora amigo, ora inimigo. E isso é milenar, acontecia no antigo Egito, como já sabemos. Agricultores não fazem o preço daquilo que produzem, o mercado faz isso, e esse mercado tem incentivado com bons preços a remuneração dos agricultores em todo o mundo. Mas os insumos, Papa Francisco, os fertilizantes, sementes, agroquímicos, máquinas, que trazem novas tecnologias, para produzir mais, na mesma área, tratam de socializar esse lucro justo que seria dos produtores rurais.

5 – O paradoxo maior está em se limitar as áreas novas de plantio. O Brasil fez isso, Papa Francisco, criou o Código Florestal, mas o mundo inteiro não copiou essa nossa jabuticaba. A gente fez essa lei agora, Papa Francisco, mas o Brasil nem precisava, pois mais de 60% do território brasileiro ainda é de floresta original, de quando os lusitanos aqui chegaram em 1500. Na Europa as reservas florestais são inferiores a 1% do território, portanto, vosso aviso chegou tarde para eles.

6 – As áreas florestadas jamais serão recompostas, Papa Francisco. Isso é um desiderato utópico de Vossa Santidade e de todos os ambientalistas. A humanidade, tal e qual um formigueiro, irá depredar tudo à sua volta, como Vossa Santidade criticou na encíclica, pelo consumismo perdulário,

7 – As áreas brasileiras desmatadas não foram para plantar soja, Papa Francisco, porque uma árvore quando derrubada deixa um toco na superfície, mas cheio de raízes. Estas devem apodrecer por um mínimo de 5 a 10 anos antes que se possa arrancar as raízes do solo profundo. E soja, Papa Francisco é uma lavoura onde 100% do que se faz é mecanizado. São máquinas caras e sofisticas, Papa Francisco, custam fortunas, mas são “enjoadas”, elas não conseguem trabalhar em solos onde há tocos de árvores decepadas pelos madeireiros, porque agricultores não derrubam árvores, pelo contrário, até plantam muitas árvores, como macieiras, laranjeiras, pessegueiros e cafeeiros e até mesmo eucaliptos.

8 – Os preços de terras estão pela hora da morte Papa Francisco, fruto da especulação financeira. Agricultores, para sobreviver na atividade, precisam plantar com alta produtividade, usando os tais insumos caríssimos, e se tentarem ludibriar a natureza, usando menos tecnologias, terão baixa produtividade, e com isso abrem falência, perdem a terra para os bancos que emprestaram dinheiro para a compra dos insumos, e a quem deram sua terra como garantia. Até recentemente, Papa Francisco, os agricultores buscavam terras mais baratas em áreas novas, e toda década tinha uma fronteira agrícola nova no Brasil, mas isso agora acabou. Acabou por dois motivos, Papa Francisco, primeiro, porque todas as áreas novas já estão praticamente ocupadas, no Brasil e no planeta inteiro. Segundo, que nas áreas ainda disponíveis no Brasil e na Argentina, além de caríssimas, são terras ruins de pastagens degradadas. E no Brasil ainda tem as limitações do Código Florestal, como a Reserva Legal para mata natural, de no mínimo 20% no Sul e Sudeste, de 50% em regiões como o Pantanal e algumas do Brasil Central, e de até 80% na Amazônia.

9 – Vossa Santidade ficará com dó na alma quando mais pessoas, além de 1 bilhão de pessoas, como ocorre hoje, vierem a passar fome, enquanto nós brasileiros estaremos admirando nossas verdes e intocáveis florestas tropicais? Ou Vossa Santidade dará apoio aos países desenvolvidos que iniciarão movimento de confiscar a Amazônia dos brasileiros, porque eles não a exploram convenientemente? Esse movimento já existe Santidade, apesar de tímido.

10 – Desculpe-me pela ironia acima, Papa Francisco, mas essa é a realidade, é que escrevi todas essas coisas acima, e outras mais, em meu novo livro, título “CO2 - aquecimento e mudanças climáticas: estão nos enganando?”, onde denuncio a ação de grupos econômicos pseudo "ambientalistas" que estão provocando essas suas dores na alma. O problema maior do planeta chama-se superpopulação, esta é a causa principal de todos os males que afligem a humanidade, seja de ordem econômica, social, política e de bem estar, por causa da poluição e de doenças endêmicas, e também pela falta de alimento e água potável.

Em resumo, Papa Francisco, lotação planetária esgotada. Nem revendo o dogma da Santa Madre Igreja sobre a proibição de as famílias católicas estabelecerem programas de controle familiar, ou de os governos criarem políticas públicas de incentivo para reduzir a velocidade do crescimento demográfico, haverá salvação para toda a humanidade. Lamentavelmente, os mais pobres sofrerão mais, como sempre foi.

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sexta-feira, 11 de setembro de 2015

A geografia da pele

Richard Jakubaszko
É o 40º livro de Evaristo de Miranda. Haja fôlego e conhecimento para escrever tanto
 

Lançamento nacional do livro “A Geografia da Pele” acontece em Campinas
Livro conta experiências, aventuras e traz à tona o delicado toque da humanidade através das lembranças da experiência vivenciada pelo autor na África
No próximo dia 14 de setembro, acontecerá, na Livraria Cultura do Shopping Iguatemi, em Campinas, o lançamento nacional do livro “A Geografia da Pele”, do escritor e pesquisador Dr. Evaristo Eduardo de Miranda. O lançamento é uma parceria da livraria Cultura com a Editora Record. O evento terá início a partir das 19h, com um bate-papo entre o autor e o jornalista Fernando Kassab, no piso Térreo da livraria.

Sobre o livro
A obra reúne experiências vivenciadas pelo pesquisador ao longo de três anos no Níger, país africano esquecido por rotas de turismo e cuja história e geografia são pouco conhecidas. Miranda conta suas aventuras, descreve ambientes e expressa emoções, frutos de sua convivência com tribos africanas entre 1976 e 1979, período em que participou de um programa da pesquisa agropecuária francesa. A viagem teve o intuito de analisar a relação entre os desequilíbrios agrícola e ecológico, estudo até então inédito. No entanto, a rica experiência em solo africano não se deteve no campo do conhecimento técnico. Miranda percebeu que geografia da região imprime marcas na pele e na alma de todos aqueles que nela habitam. Com ele não seria diferente. Elementos da natureza, como o sol e o vento, modificaram o tom da pele do pesquisador, enquanto que o contato com o povo africano e a inserção em sua rica cultura transformaram para sempre a vida do jovem paulistano. Os resultados de sua pesquisa e de seu doutorado acabaram levando a Embrapa e contratá-lo e designá-lo para criar e instalar a Embrapa Semi-Árido em Petrolina (PE) na década de 1980.

Entrevista de divulgação - “A geografia da pele”, com o agrônomo e pesquisador da Embrapa, Evaristo de Miranda.


A África é tema frequente na literatura, em livros de viagem e na mídia, sobretudo nos documentários de TV. O que difere sua “Geografia da Pele” do que se conhece sobre o continente?
O Niger, o país onde vivi, está fora das manchetes. Lá não há leões, nem gorilas, elefantes ou safáris. É um dos pontos mais centrais da África, ao sul do deserto do Saara. Um ponto de cruzamento entre diversas etnias, as últimas a serem dominadas pelos colonizadores europeus. O Niger não está em filmes de natureza, nem frequenta roteiros de viagens ou de safáris fotográficos. É o país mais pobre do mundo e, no entanto, sua população não é famélica. A região onde trabalhei é feita de areia, pastagens, choupanas de palha, tradições, cabras, ovelhas e campos infindáveis de cereais, povoada por animais invisíveis, em meio a acácias e baobás.

Você adota as palavras “imerso” e “profunda” no subtítulo do livro (“um brasileiro imerso na África profunda”). O que o fez caracterizar as experiências relatadas com tais palavras?
Não passei por lá apenas numa viagem de aventuras, nem fiz rápidas visitas turísticas. Eu vivi como agrônomo e pesquisador, durante vários anos, com a população local: os nômades, os pastores, os agricultores. Aprendi a falar suas línguas, morei nas aldeias, comi sua comida e compartilhei de seu modo de vida para tentar entender – e ajudar a reduzir - os desequilíbrios agrícolas e ecológicos que afetam a região. Foi realmente uma imersão numa África profunda, pouco conhecida e extremamente surpreendente.

Em quais momentos dos anos passados nessa África “profunda” você se sentiu num beco sem saída, seja por questões culturais, seja por limitações físicas?
No livro “A geografia da pele” relato diversos desses episódios. Foram situações muito variadas, desde ser convidado a comer morcegos fritos até a dificuldade em encontrar a maneira certa, não ofensiva, de recusar uma jovem escrava buzú, que me foi ofertada em sinal de amizade por um grupo tuaregue, para que eu a levasse à França. E houve também situações de real perigo, no deserto do Saara, e em meio a experiências surreais, em estados alterados de consciência.

Por que você esperou mais de trinta anos para publicar suas vivências? Quando estava lá, você já acumulava os relatos com ideia de compor a obra ou só se dedicou ao resgate de memórias recentemente?
Durante todo o meu tempo na África eu registrei minhas experiências, como faço até hoje ao trabalhar com os pequenos agricultores do Nordeste ou da Amazônia. Num determinado momento, após uma progressiva vivência com a população hauçá, eles decidiram me revelar alguns segredos sobre sua produção agrícola, alguns costumes secretos e o destino de seus cereais. Antes, porém, me fizeram jurar que manteria o segredo por 28 anos. Foi o que fiz: mantive a promessa. Nem em meu doutorado mencionei tais coisas. Agora, o mestre do tempo me autoriza falar, nesse livro.

Você voltou a percorrer os caminhos daquela época? Acha que aquelas paisagens e aquela diversidade de culturas permanecem vivas? Ou eles vão sucumbir com a entrada de movimentos como o Boko Haram?
Nunca mais. Às vezes tento identificar, em imagens de satélite, as transformações na vegetação, estradas e aldeias da região. É uma de minhas especialidades científicas na Embrapa: monitorar a agricultura por satélite. Com a ajuda da tecnologia, enxergo poucas mudanças: vilarejos cresceram, estradas melhoraram, mas a paisagem segue igual, assim como os arranjos de vegetação relacionados ao cultivo de alimentos e manejo do gado. Alguns ecos de grandes alterações vêm pela imprensa, como essa ameaça do Boko Haram e do islamismo radical. Os militantes desses movimentos agem livremente, sequestram mulheres, atacam vilarejos, incendeiam igrejas, estupram e escravizam jovens cristãs. Ao norte, a revolta armada dos tuaregues, a derrubada do ditador Kadafi na Líbia, a criação abortada de um Estado islâmico pela Al-Qaeda no Mali e a intervenção militar da França e dos países africanos trouxeram violência e insegurança, inéditas para os nômades do Saara e para os vilarejos nas fronteiras do Sahel com o grande deserto, onde eu vivi. Em meio a emboscadas, combates, bombardeios e controles militares, eu imagino os agricultores e os pastores que conheci prosseguindo silenciosamente na busca de seus humildes sonhos verdes.

Qual a sua interpretação, hoje, das marcas em suas pernas e braços que compõem “A geografia da pele”?
Como digo no início de meu livro, minha pele não suportou anos no deserto do Saara. Animado pela ousadia dos deuses da juventude, não percebi o quanto ela era tatuada pelo sol, vento, vegetação, animais e seca. Uma estranha geografia marca minha epiderme. Percorro suas manchas, rugas, máculas, dobras e cicatrizes como quem caminha entre colinas, montanhas, cordilheiras, países e continentes. Nas entranhas da memória, diversas sonoridades identificam essas paisagens africanas de meu corpo. Mas não consigo entender. Há trinta anos estou mudo em hauçá. Não ouço, nem falo ou leio. A areia do tempo apagou e soterrou essa língua africana em meu coração. Após estarem por anos em minhas noites, os olhares peuls, a luta dos hauçás, as espadas dos tuaregues, as interrogações de um guia zarolho e até o sorriso de uma jovem parteira sem braços desapareceram de sonhos e pesadelos. Na memória ficaram sinais hieroglíficos, espelhados nos céus da epiderme, que o tempo não apagou. Diluíram-se em meio a outros, amazônicos, polares e nordestinos. Mas à noite, eles ainda cintilam.

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quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Oportunidades no Sudeste Asiático

Marcos Sawaya Jank *
Quando falamos dos países emergentes da Ásia, quem vem de cara à nossa mente são a China e a Índia, países que somam mais de um terço da população do planeta e que crescem a taxas superiores a 6% ao ano.

Mas há uma região da Ásia que ainda é pouco conhecida no Brasil e da qual esses dois gigantes não fazem parte: o Sudeste Asiático. Com 625 milhões de habitantes vivendo numa superfície equivalente à metade do território brasileiro, a maioria dos países do Sudeste Asiático conquistou a sua independência apenas no fim da Segunda Guerra Mundial e logo iniciou um lento e efetivo processo de integração.

Em 1967, no auge da Guerra Fria, cinco países da região – Indonésia, Malásia, Filipinas, Cingapura e Tailândia – fundaram a chamada Asean (Associação das Nações do Sudeste Asiático). O objetivo inicial era buscar a estabilidade geopolítica numa região marcada pelo vácuo da descolonização e a uma intensa disputa entre os Estados Unidos e a União Soviética. Com o tempo, outros cinco países aderiram ao bloco – Brunei, Camboja, Laos, Vietnã e Myanmar.

Os dez membros da Asean formam um grande caleidoscópio de países com tamanhos, línguas, religiões e culturas distintas. A Indonésia é o maior país muçulmano do planeta, as Filipinas são católicas, e a Tailândia, budista. A imensa diversidade é também flagrante na área econômica, com renda per capita variando de US$ 900 por ano em Myanmar a US$ 55.000 em Cingapura.

A partir de 2000, os dez países originais da Asean assinaram acordos de livre-comércio, de tipo Asean+1, com China, Índia, Japão, Coreia do Sul, Nova Zelândia e Austrália. No final deste ano, o bloco se transformará na chamada Comunidade Econômica da Asean, ou AEC em inglês.

Nesse contexto, pode-se dizer que a AEC será o segundo maior bloco econômico do planeta, atrás da União Europeia. E as oportunidades são imensas: tamanho do mercado, comércio, investimentos, inovação tecnológica, infraestrutura, serviços etc. O PIB (Produto Interno Bruto) da região triplicou desde 2000, atingindo US$ 2,4 trilhões, e no momento cresce regularmente à taxa de 5,5% ao ano. As exportações e as importações da Asean somam a impressionante cifra de US$ 2,5 trilhões por ano.

A presença do Brasil na região é insignificante. Representamos apenas 0,7% do volume total de comércio da Asean. No ano passado, exportamos modestos US$ 11 bilhões, sendo metade composta por produtos do agronegócio responsáveis pela situação superavitária que temos com o bloco. Países asiáticos e árabes, Estados Unidos, Europa, Austrália e Rússia exportam de 2 a 20 vezes mais que o Brasil.

Tenho andado por todo o Sudeste Asiático e vejo o comércio e os investimentos bombando, nossos concorrentes ampliando suas representações diplomáticas e comerciais, multinacionais expandindo suas atividades e expatriados de todo o mundo vivendo até mesmo nos locais mais ermos da região.

Se o século 19 foi da Europa e o 20 da América, o 21 voltará a ser da Ásia, como já o foi durante muitos séculos. Enquanto isso, o Brasil quer crer que faz parte do núcleo relevante e decisório do mundo. Um pouco mais de realidade, modéstia e pé no chão (e na estrada) faria bem.

* Marcos S. Jank é especialista em questões globais do agronegócio.

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quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Manoel Henrique Pereira (Nonô Pereira)

Antonio Roque Dechen *
Faleceu em 8 de setembro de 2015, em Ponta Grossa (PR), Nonô Pereira, que junto com Herbert Bartz e Frank Dijkstra, foi responsável pela implantação e difusão do sistema de plantio direto na palha, no Paraná e depois difundido para as regiões agrícolas do Brasil.

O plantio direto é uma técnica que conserva o solo, pois os agricultores não precisam arar e gradear o solo antes da realização do plantio. A palha que fica no solo transforma-se em matéria orgânica, aumenta a fertilidade e conserva a umidade do solo. Hoje o plantio direto abrange mais de 30 milhões de hectares no Brasil.

Nonô Pereira foi três vezes presidente da Federação Brasileira de Plantio Direto e Irrigação e, atualmente, era Diretor Honorário Fundador, ao lado de Herbert Bartz e Frank Dijkstra.

Durante homenagem recebida da Itaipu Binacional, os pioneiros do plantio direto, entre eles Nonô Pereira, frisaram que a única certeza que os produtores tinham quatro décadas atrás, para evitar o avanço da erosão e a perda de produtividade, era a de que algo tinha que ser mudado na agricultura tradicional: “do jeito que era, estávamos com os dias contados, porque o solo é o nosso maior patrimônio e temos de conservá-lo”.

Os pioneiros do plantio direto pregavam a sustentabilidade do sistema produtivo brasileiro e foram também inspiradores do Dr. Fernando Penteado Cardoso na criação da Fundação Agrisus (Agricultura Sustentável).

Nonô Pereira finaliza suas grandes realizações em prol da Agricultura Brasileira com Sustentabilidade. Trabalhou arduamente na conservação de nosso patrimônio maior, nosso solo, deixando-nos o exemplo de dedicação, competência e responsabilidade. Uma perda incomensurável, com realizações que marcaram o novo cenário da Agricultura Brasileira com Sustentabilidade.

* o autor é Prof. Titular do Departamento de Ciência do Solo ESALQ/USP, Presidente da Fundação Agrisus, Presidente do Conselho Científico de Agricultura Sustentável – CCAS e Membro do COSAG/FIES

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Ato falho no Jornal Nacional

Richard Jakubaszko
Terá sido ato falho do apresentador Alexandre Garcia, no Jornal Nacional? Em vez de rodada do Brasileirão, o âncora substituto "leu" roubada no telepromter...
O ativismo político partidário já virou neurose...

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terça-feira, 8 de setembro de 2015

'Memes' do futebol

Richard Jakubaszko
Alguns "memes" são realmente engraçados, outros são zoeira pura, e assim vai se criando uma tradição no futebol, que anda cada vez mais distante do bom espetáculo. Os juízes têm sido as estrelas, cartões amarelos são distribuídos a rodo aos jogadores reclamões, prejudicando os times num campeonato brasileiro longo e estafante.

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domingo, 6 de setembro de 2015

Devemos entregar o ouro?

Richard Jakubaszko
A verdade é uma só: enquanto o Brasil não se entregar completamente ao capital estrangeiro não ficaremos em paz.

Já entregamos a produção da energia elétrica, privatizou-se tudo. Temos uma das energias elétricas mais caras do planeta, e estamos sempre na marca do pênalti de faltar eletricidade. As concessionárias multinacionais impedem o uso da energia solar integrada ao sistema nacional. A eólica também.

Já privatizamos a telefonia, a celular é deficiente, a internet é ridícula, e é também uma das mais caras do mundo.
Abrimos o capital da água, a Sabesp foi a pioneira, quem manda são os fundos de investimento em Wall Street. Eles não investem, querem só os lucros, e toca a faltar água na maior cidade do país...
Estamos para “dividir” o pre-sal com os americanos, com o aval do Congresso, em projeto “desinteressado” do “independente” senador José Serra.

Já “socializamos” nossos minérios. Portanto, já entregamos o ferro e o ouro, o nióbio, a bauxita e os cristais, e agora só falta entregar a alma...

Caminhamos para entregar e privatizar até o meio ambiente, nossa maior riqueza, a biodiversidade tropical. As ONGs multinacionais já “administram” o PAC através dos “estudos de impacto ambiental”, necessários para a construção de qualquer ferrovia, rodovia, barragem, açude ou hidroelétrica, até mesmo para usar pivot na irrigação.

Há projetos internacionais de ONGs para a instalação do “corredor ecológico” que cortará a Amazônia transversalmente, de Leste a Oeste, numa faixa de largura de

250 km até 1.500 km, um “território neutro” a ser administrado por “organismos internacionais” para “preservar nossa biodiversidade”.

Falta privatizar e internacionalizar o ar, o nosso oxigênio? Não vai faltar isso também. Conforme denuncio no livro “CO2 - aquecimento e mudanças climáticas: estão nos enganando?”, durante a COP21, a realizar-se em Paris, em dezembro próximo, os ambientalistas engajados, ONGs e multinacionais, pretendem a instalação da Agência Internacional Ambiental, que terá poderes supranacionais sobre os estados soberanos, como o Brasil, por exemplo, para impor regras e normas que, se descumpridas, darão direitos a sanções econômicas e políticas e até mesmo intervenções militares, como vem sendo praticado contra Irã, Cuba, Coreia do Norte, Afeganistão e do hoje pobre Iraque, seja por serem países “comunistas”, seja por intenção de uso da energia nuclear, seja pela “acusação” infundada de possuir armas químicas de destruição humana em massa.

Vamos pagar até mesmo para respirar. Tudo isso sob o guarda-chuva dessa imensa falácia global chamada “aquecimento” e das “mudanças climáticas”.
 

Depois de entregar o que resta, teremos total democracia, dolarizamos a economia, vai ter inflação baixa, vamos viver de renda, com pleno emprego, e farta energia elétrica fornecida por usinas nucleares com "risco zero" de radioatividade...

Para quem pretende informar-se sobre o assunto, o livro “CO2 aquecimento e mudanças climáticas: estão nos enganando?” custa R$ 40,00 mais despesas postais, não está à venda em livrarias, e pode ser adquirido apenas pelo fone 11 3879.7099 (DBO Editores Associados, onde também pode ser retirado) ou pelo e-mail co2clima@gmail.com

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sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Inocentes pagarão pelos pecadores

Richard Jakubaszko
“Ato de solidariedade burocrática do capitalismo”
A foto da situação estúpida do menino imigrante de 3 anos morto pela imbecilidade do capitalismo selvagem correu mundo, mas aqui no Brasil, publicada pelo UOL, foi alvo de críticas de alguns leitores politicamente corretos e de coleguinhas em sites que se imaginam como “especialistas em jornalismo”. As críticas estavam numa pretensa discussão sobre a propriedade, conveniência e pertinência, de a mídia publicar o retrato de tamanha tragédia humana, e acusavam os editores responsáveis de manchetismo escandaloso na busca de audiência.

Ora, cui bono? Sim, a quem interessa a não publicação? Única e exclusivamente aos líderes do monstruoso capitalismo internacional e dos políticos manipulados. Não foram eles (Otan, ONU, e demais organismos internacionais) que permitiram as invasões a países como Iraque e Afeganistão? Não foram eles que estimularam e provocaram a destruição das economias desses países, através de guerras civis, como a Síria, Líbia, Iêmen, Nigéria, e outros estados independentes na África e Oriente Médio adentro, sem contar a questão Palestina, onde Israel pratica um holocausto contemporâneo, e a mídia não discute as causas, não debate os problemas, limita-se a reproduzir os press releases da Casa Branca?

Uma curiosidade intrigante: nunca se viu tantas embarcações afundando sem causa específica, tanto no Adriático como no Mediterrâneo. Serão minas remanescentes do nazismo?

Não foram esses mesmos países que, antes da atual crise financeira eclodir, em 2008, quando a economia andava lucrativa, estimulavam ou permitiam “na moita” a importação de trabalhadores braçais desses mesmos países, para substituir seus compatriotas cujos salários andavam "altos demais"?

A diáspora africana (e a do Oriente Médio) vai prosseguir. Inocentes pagarão pelos pecadores, como profetizado por Cristo. A hipocrisia da mídia nacional, tal e qual a mídia internacional, também vai continuar. Discute-se os problemas pelas bordas, e esquecem que um homem com fome é um revoltado, mas que um pai cujo filho esteja com fome é um revolucionário em potencial. Já milhares de pais com filhos esfomeados tornam-se o quê?

As projeções estatísticas indicam que em 2030 os países do hoje Mercado Comum Europeu terão maioria de cidadãos muçulmanos. Caminho semelhante é projetado nos EUA, mas dividindo os espaços com cucarachas.

No Brasil, ainda somos uma ilha de paz e tranquilidade, os africanos e haitianos mal começaram a chegar, mas já se fazem notar

Esqueci: se editor fosse, a ter de decidir sobre a publicação da dita foto, não apenas publicaria a mesma, de margem a margem, como colocaria a legenda: “ato de solidariedade burocrática do capitalismo”. A manchete? “Massacre macabro”.

Jornalista que discute com a notícia não é jornalista, é um imbecil.
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quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Expo Milão 2015

Richard Jakubaszko
Estarei em visita à Expo Milão a partir de 15 de setembro. O debate pela produção sustentável de alimentos para 9,0 bilhões de pessoas vai até 31 de outubro quando se encerra a grande mostra deste ano. O Brasil está presente nesse debate através da Embrapa e de diversos ministérios.

Viajo à Itália a convite da CNH Industrial (New Holland/Grupo Fiat), uma das patrocinadoras do evento.
A exemplo da Expo Água, realizada em Zaragoza, Espanha, em 2008, a qual também visitei, milhões de pessoas passaram pelas catracas dos dois Mega Eventos, um espaço gigantesco de estandes onde chegam a construir um metrô de superfície para facilitar a mobilidade dos visitantes.


Durante os 6 meses do evento, a organização espera receber mais de 20 milhões de visitantes em um espaço de 1 milhão de m². O pavilhão brasileiro conta com 4 mil m², onde acontecem exibições, atividades culturais e gastronômicas, seminários, eventos de negócios e de relacionamento. Com o tema Alimentando o Mundo com Soluções, o Brasil mostra na Expo Milão 2015 a nossa capacidade para produzir alimentos com tecnologias inovadoras, e com qualidade capaz de atender às demandas mundiais.
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terça-feira, 1 de setembro de 2015

Delfim Netto: “Ao contrário de ser uma tragédia, estamos a caminho da sociedade civilizada”

Richard Jakubaszko 
Reproduzo abaixo uma boa entrevista, feita pela revista MundoCoop, dirigida ao sistema cooperativista brasileiro, com o ex-ministro Antônio Delfim Netto. Como sempre, Delfim é um arguto analista da situação político-econômica do país>

“Ao contrário de ser uma tragédia, estamos a caminho da sociedade civilizada”
Professor catedrático na Universidade de São Paulo, economista, ex-ministro da Fazenda de 1967 a 1974 (governos Costa e Silva e Médici) e ex-deputado federal por cinco mandatos consecutivos (de 1987 a 2007), Antonio Delfim Netto, aos 86 anos, permanece referência em política econômica, sendo reconhecido também por sua experiência política iniciada na extinta Arena, passando por PDS, PPB, PPR, PP e PMDB, em que ingressou em 2005.
Como ministro da Fazenda, Delfim Netto acumulou muitos cargos. Além de ser presidente do Conselho Monetário Nacional e da Comissão de Programação Financeira, foi membro do Conselho de Segurança Nacional e Conselho Interministerial de Preços.

Também exerceu o cargo de governador pelo Brasil do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial. Participou da direção do Banco Interamericano de Desenvolvimento e do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento. Foi embaixador do Brasil na França entre 1975 e 1978, ministro da Agricultura e também ministro-chefe da Secretaria de Planejamento da Presidência da República, permanecendo no cargo até 15 de março de 1985.
No final de março, a revista MundoCoop foi recebida por ele em seu escritório, para entrevista exclusiva. Crise, ajustes, manifestações, política econômica, opções para o País são alguns dos temas por ele enfocados. Confira!


O senhor é figura de expressão no cenário econômico. Como o senhor vê o Brasil neste ano? Quais as expectativas para os próximos anos?
Eu acho que, no fundo, o Brasil é vítima de uma doença, ele está sempre num estado ciclotímico. Ou ele está muito bem ou está em depressão. É uma coisa curiosa. Na história recente você vê isso. Começa em 1994, no governo do Itamar Franco. O crescimento era de mais de 5%, na média; preparava-se o Plano Real, o presidente acumulava reservas – nunca aplicou estelionato em ninguém, por isso que é esquecido, porque ele é um ponto fora da curva.

Ele sustenta o Plano Real. Há um enorme sucesso. Fernando (Henrique Cardoso) se elege, reelege-se depois de muita confusão no meio do caminho, mas o que importa é o seguinte: era o instante de expansão do Brasil; enxugou-se o Estado; conquistou-se uma coisa que parecia impossível, que era a instabilidade monetária, através de um plano que é uma pequena joia – o Real é o plano que honra a inteligência dos economistas que participaram da sua feitura – e, no final, Fernando se reelege com um estelionato eleitoral e começa o segundo governo muito mal.
No segundo mandato, recebemos uma ajuda do Fundo Monetário Internacional, e ele termina o governo muito mal: ao final dos oito anos, o crescimento per capita do PIB é 0,9%.

Tem início os oito anos de governo do Lula…
Entra o Lula, tem um entusiasmo enorme. Primeiramente, um pânico, o Lula diz que recebeu uma herança maldita, mas tinha recebido uma herança boa – o Fernando já tinha feito a terraplanagem do terreno. Entra com o (Antonio) Palocci, tem uma expansão bastante forte, o Brasil recebe uma ajuda externa muito boa, entra em pleno entusiasmo a ponto de transformar um tsunami numa marolinha. O Lula sai, também faz um estelionato eleitoral e vende a Dilma como ideal.

E tudo muda?
Acontece que, quando entra a Dilma, o mundo tinha mudado tudo; na verdade, o vento de cauda do governo Lula terminou em 2010. Quando a Dilma entrou, a situação era totalmente diferente. Internamente, já tinham consumido muito das reservas fiscais para eleger a Dilma, e o mundo tinha mudado. A Dilma entra, faz um ajuste, e o País começa a entrar de novo num estado de desconforto. Vai indo, indo, indo, e termina o governo num estado de grande desconforto.

Faz um gasto extraordinário, um desequilíbrio fiscal gigantesco para se reeleger, também aplica o estelionato eleitoral, prometeu que vai fazer isso, aquilo, e faz menos isso, menos aquilo. Mas entra e tem uma coragem enorme de fazer uma conversão na economia equivalente a que o São Paulo fez na Estrada de Damasco. Desse modo, hoje estamos num momento em que dá impressão que tem uma confusão geral, é uma atrapalhada, o povo na rua… Quando você vai olhar, é tudo um equívoco.

Qual é a grande notícia? 2/3 da população estão contra a Dilma, mas ela foi eleita exatamente com 2/3 da população contra ela. Presta atenção, 1/3 mais um pouquinho votou nela, 1/3 menos um pouquinho votou no Aécio e 1/3 votou contra os dois. Mas o que que acontece? Esse 1/3 que votou contra os dois protestou no lugar errado, que era a urna, e no segundo turno elegeu a Dilma. Haja o que houver no segundo turno ela teve 50 + 1. O que eu digo é o seguinte: boa parte dessa gente que está na rua, está na rua porque teve pouca inteligência e não compreendeu que o segundo turno é exatamente para chegar a um entendimento melhor.

Quando o Lula foi eleito o que mudou?
Há uma mudança na filosofia… Coisa importante, o presidente anterior era um intelectual, muito bem votado, mas no seu governo a inclusão social era um detalhe. Entra um operário, com pequena educação formal, mas uma inteligência absolutamente tremenda e uma habilidade política gigantesca, que transforma a inclusão social no objeto do Governo.

O que significa isso? É um avanço da democracia. Com isso, ele deu poder à sociedade, que foi aprendendo a impor a sua vontade, a querer ser respeitada e a definir as suas prioridades. O panelaço é consequência do empoderamento da sociedade; é uma manifestação do aperfeiçoamento democrático na construção de uma sociedade civilizada.

Por isso, eu acho que há um equívoco enorme no julgamento de tudo isso. Não há lógica, é uma coisa meio primitiva, porque nem o Governo entendeu realmente o que está acontecendo. É tão somente o resultado do aperfeiçoamento do processo democrático, na construção de uma sociedade civilizada.

Nessa busca, em que momento estamos hoje?
Essa é a sociedade prevista na Constituição de 1988. Nela os homens têm liberdade, igualdade e uma certa eficiência positiva, e por isso que precisa de mercado, porque igualdade e liberdade não combinam. A liberdade exagerada não leva à igualdade, e a igualdade exagerada mata a liberdade. Hoje, esta sociedade está sendo construída.

O que mais me espanta é que as pessoas não percebam que estão num momento necessário de evolução do processo. É o reconhecimento de que a inclusão social e a igualdade são valores fundamentais, e que ter as três coisas (liberdade, igualdade e inclusão social) não é inteiramente conciliável. É preciso ter um jogo entre a urna e o mercado.

Quer dizer que, se o mercado exagera, quer só crescimento econômico, não se interessa pela distribuição, a urna vem e joga fora o governo e elege outro. Se o governo vem e diz só querer distribuição, diminui o crescimento; no próximo round, o mercado vem e joga ele fora. Este processo de aproximação dessa sociedade é que estamos vivendo.

E a crise, como ela se desenha nesse cenário?
Não me parece que exista uma crise institucional. O panelaço e a passeata são duas manifestações de uma sociedade com energia, que está aprendendo e amadurecendo. Dizem que há uma luta entre o Legislativo e o Executivo. Não! O Legislativo está recuperando a posição que perdeu.

Nós tínhamos um parlamentarismo muito ruim, em que através do que se chama presidencialismo de coalizão, onde só um partido tem todo o poder e domina os ministérios adjetivos. Todo o resto não tem nenhuma decisão de poder e domina os ministérios subjetivos, não participam das decisões, simplesmente comem lá umas migalhinhas.

Quando há essa mudança, o Congresso assume seu verdadeiro papel de poder independente, ainda que harmônico com o Executivo. O fato de o Governo ter de ir lá, bater na porta, negociar, é absolutamente importante. As instituições é que estão funcionando. Por que eu tenho tanta tranquilidade?
Porque o Superior Tribunal Federal é independente, é de fato o garantidor dos direitos individuais e da independência entre os poderes. É importante compreender que a Constituição de 1988 montou uma estrutura que está amadurecendo e, isso que parece confusão, isso que parece uma crise gigantesca, não é nada. Apenas revela primeiro as instituições sólidas.

Vamos respeitar as instituições. Vamos corrigir os excessos que foram cometidos durante o processo eleitoral. Não vamos ter ilusão, até 2013 não tinha nenhum descalabro muito maior do que o atual. O que acontece é o seguinte: como é que você poderia imaginar um déficit nominal de 3,7% em 2014? Isso poderia se imaginar na Idade Média, não hoje. Então, ele revela o quê? Revela um esforço para se reeleger. O resultado final é que, reeleita, a Dilma vai colocar ordem, mudar, e ela mudou a política econômica em 180°.

A presidente estaria sofrendo resistência do Congresso, da sociedade e do próprio partido?
Isso tudo é uma injustiça. A Dilma é absolutamente honesta, tem absoluta honestidade de propósitos, intervém na Administração, para dar certo. Ela precisava ter 180 horas por dia de trabalho, mas como só tem 18 horas fica difícil, porque ela interfere, ela quer detalhes, ou seja, ela atrapalha, atrasa e também tem ideias, algumas equivocadas, o que é natural, porque todos nós temos alguma coisa.

Em outras palavras, não vejo nada que possa justificar esse movimento que, insisto, não aconteceu nada de diferente. As pessoas que votaram errado é que estão arrependidas. O sujeito que não foi votar, achava que nem a Dilma e nem o Aécio valiam nada, não sabia que estava tendo a oportunidade de dizer, “bom, tem um menos ruim que o outro, eu não gosto dos dois, mas eu gosto menos de um deles”.
O segundo turno é a oportunidade de qualificar o voto. Agora, essa pouca inteligência no voto não justifica o pedido absurdo que eles estão fazendo. Não vamos nos preocupar.

Para o senhor, as reivindicações fazem parte de um processo natural? 

Em que lugar não tem passeata? Em Paris, em Londres, em Frankfurt, na Áustria, nos Estados Unidos, na Argentina, em todo lugar tem panelaço. O que acontece hoje é o resultado desse movimento que foi nascendo lentamente em 1968, esse empoderamento da sociedade.

Isso é um processo natural, a libertação tem esse mecanismo, o que me espanta é que a gente não tenha uma ideia clara de que não estamos na beira do abismo, estamos num desequilíbrio que se não for consertado pode nos jogar no abismo.

O que o senhor acha das escolhas para os ministérios da Fazenda e do Planejamento? Os titulares, Joaquim Levy e Nelson Barbosa, conseguirão fazer os ajustes necessários mesmo sendo de linhas econômicas opostas?
São dois profissionais altamente competentes, formados em escolas diferentes, o que é muito bom, porque não existe uma Ciência Econômica, existe Escola. Todas elas têm alguma coisa que presta e tem muita coisa que não presta. Selecionar o que presta é o que não presta é muito bom. O Governo não se esgota na área econômica, nos dois ministros.

Tem também uma grande ministra na Agricultura (Katia Abreu). Escreve o que estou lhe dizendo: na Agricultura, nós vamos ter um plano de safra muito melhor do que todos que foram publicados até aqui e que têm sido muito bons nos últimos anos. Continuará dando ênfase ao seguro agrícola que é uma questão fundamental, vai reduzir os subsídios, até porque não precisa mesmo daquele excesso de subsídios.

Por outro lado, tem um ministro de Desenvolvimento e Indústria, o Armando Monteiro, que tem um excelente programa industrial e para acelerar a exportação, que vai demorar mais tempo. Na verdade, há quatro pessoas comandando as áreas críticas, e nenhuma delas tem engajamento político.

E o senhor acha que o ajuste necessário será feito ainda este ano?
Não nesse ano, nem no ano que vem, mas será feito com inteligência, com equanimidade, se for feito pelo Governo, apoiando o programa da atual Política Econômica da Dilma.
Se isso não acontecer, o Brasil perderá o grau de investimento, ai o mercado fará o ajuste no porrete, sem se preocupar com custo, sem se preocupar com equanimidade, fará uma destruição. Por isso, não há opção, não adianta ficar passeando na rua. Por que não passeia na rua para exigir melhor Governo, atenção, tudo? O ajuste é só uma ponte para você ir do outro lado do rio, para começar a crescer.

Quanto mais rapidamente a sociedade absorver a ideia de que o ajuste é uma passagem e que nós precisamos dele o mais urgentemente possível para voltar a crescer, tanto mais depressa nós voltamos a crescer. Sem um ajuste, vamos levar dez anos para voltar a crescer. Há sinais claros de que nós vamos melhorar. O problema critico é o “time”. O Brasil vai fazer o ajuste conosco ou “sem nosco”. Pode colocar isso como certo: vai ter um ajuste, e ele vai ser feito com inteligência.

Especificamente para o cooperativismo como um todo, que mensagem o senhor deixa?
O cooperativismo é uma alternativa, e está inserido na economia de mercado. Tem algumas virtudes importantes, apela muito para o altruísmo, a solidariedade, é muito menos anônimo do que o mercado, tem algumas vantagens e também suas desvantagens, mas, cada vez mais, a organização cooperativa tem se aperfeiçoado. De bom, tem que nós aprendemos uma barbaridade.
 

É só olhar o que eram as cooperativas há 30 anos. Sofremos muito, porque não sabíamos cooperar, tinha um pouco de aventura, eu me lembro bem do Banco Nacional de Cooperativa. O Governo queria estimular, mas o cooperativismo era uma coisa que funcionava muito mal.

Hoje, há cooperativas funcionam maravilhosamente bem. Houve um aperfeiçoamento principalmente administrativo, as cooperativas aprenderam a se administrar, tem muito mais controle hoje do que no passado. Precisa de qualificação técnica. A Embrapa foi a grande revolução, pena que assistência técnica diminuiu; agora está sendo recuperada.

Mais algum recado que o senhor queira dar aos leitores?
Eu fico triste com o seguinte: as pessoas estão confundindo tudo, não tem curto-circuito, não tem atalho, não tem nada que colocar a Dilma fora. Tem de aprender a resolver isso. Estou convencido de que, muito mais cedo do que parece, as pessoas vão começar a entender que, ao contrário de ser uma tragédia, estamos a caminho da sociedade civilizada.


Publicado originalmente na revista MundoCoop (em terça-feira, 23 junho 2015): http://www.mundocoop.com.br/destaque/entrevista-com-o-ex-ministro-da-fazenda-delfim-netto.html

segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Green roof (ou telhados verdes) um modismo?

Richard Jakubaszko
Diante da poluição nas grandes cidades, da falta de verde, e sem alternativas, as pessoas dão vazão à criatividade e andam construindo prédios com "telhados verdes", chamados lá fora de green roof.

EUA: prédio adaptado.

Os arquitetos e paisagistas exibem uma criatividade que não parece ter limites. Já existem no Brasil, mas são raras essas demonstrações; São Paulo é uma cidade com muito mais verde do que qualquer outra grande cidade americana. Perdemos para as poucas metrópoles europeias, lá o verde é cultuado, cultivado e preservado. 
Chicago: prédio planejado e construído com o green roof

Lembremos que as reservas florestais na Europa representam menos de 1% da área verde de 2 ou 3 séculos atrás, enquanto no Brasil ainda temos mais de 60% das matas de quando os lusitanos aqui chegaram em 1500.

Abordo essa questão no livro "CO2 aquecimento e mudanças climáticas: estão nos enganando?". Uma delas é o calor refletido pelo concreto, asfalto e excesso de vidros, além do calor gerado nos motores dos automóveis, e isso faz com que grandes cidades cheguem a ter de 5º a 7º graus Celsius de diferença entre suas áreas centrais e as periferias, por vezes menos de 15 km de distância em linha reta.
No topo do prédio (EUA), um oásis.
Local: Canadá. Prédio planejado.

Centro de convenções em construção: Canadá.
Chicago: prédio planejado.
Alemanha: um dos países, como o Canadá, entusiastas do green roof.
África do Sul: edifício comercial, planejado.
Inglaterra: parece uma maquete para residências de bom padrão.
Em Cingapura, até os donos do hambúrguer aderiram à moda.
Este prédio pode estar na Rússia ou na Turquia.
EUA, todo grande prédio novo construído tem seu green roof.
Inglaterra, escritórios aderiram, em centros planejados.
Incapazes de abrir mão dos seus possantes, as pessoas buscam paliativos e desculpas para sobreviver. Os urbanos são, desta forma, os grandes avalistas da grande mentira do século XXI, que demoniza o CO2, o gás da vida. Os culpados não são eles, segundo a crença, são os produtores rurais. Esquecem os urbanos que sobrevivem em ambientes inóspitos à vida humana, nessas autênticas selvas de concreto.
Quer conhecer a verdade? Sobre a mentira do aquecimento, e do Co2? Leia o meu livro: a verdade custa apenas R$ 40,00 (mais taxa de correio): fone 11 3879.7099 ou pelo e-mail co2clima@gmail.com
Green roof nas laterais dos prédios são comuns, na Bélgica, ou Barcelona.
Na Escócia, uso criativo.
A impressão que dá, é que a casa vai desabar com o peso...
Residência, na Alemanha.
Algum ponto da Alemanha.
A igreja também aderiu ao verde, que te quero verde...
Até casinha de cachorro vale...
A verdade é que green roof custa caro, e tem de ser planejado.


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