Richard Jakubaszko
Depois de 2 anos sem ser realizada, a maior feira do agronegócio voltou a despontar. Os encontros e reencontros dos amigos, parceiros e conhecidos de longa data, e não foram poucos, mostraram-se emocionantes. Muita gente, depois dessa pandemia (que ainda não acabou...), retornou ao nosso convívio gregário com algo a mais, mais amigo, mais gente, como um ser humano mais lapidado e mais fraterno. São pessoas que deixam a vida da gente mais leve.
Outros retornaram mais hipócritas e imbecis, mais ambiciosos e mais vaidosos do que nunca, exacerbando as diferenças. A beleza e o encantamento do convívio humano, para aqueles que a sentem, foi inesquecível. Aos que já eram pessoas avinagradas a pandemia parece ter acelerado esse processo. Alguns lances e episódios mostro aqui nesse rápido descritivo, evitando ao máximo revelar os autores, porém denunciando alguns feitos episódicos que comprovam a natureza humana de ser também um predador de sua própria espécie.
De uma forma geral a Agrishow foi a mesma de sempre. Tudo é superlativo nessa feira, palco de exibição de muita tecnologia para a agricultura.
Excetuando os grandes expositores, as empresas maiores fabricantes de tratores, porque difícil a gente falar com os diretores responsáveis, todos os amigos que contatei reclamaram das condições impostas pela Agrishow aos expositores e aos visitantes. Condições que são melhores em outras feiras, mais bem estruturadas, como o Show Coopavel ou a Cotrijal.
Ora, na Agrishow tem muita gente, mais de 35 mil pessoas por dia, que é um público de clássico de futebol, e isso traz encrenca de tudo o que é jeito, a começar pelo acesso por automóvel, seja no início do dia, desde antes das 8 da manhã ou no fim do dia depois das 18 horas. Entrar ou sair da feira é um enorme pesadelo. Os que deveriam ajudar o fluxo do tráfego parecem receber ordens para complicar ainda mais o visitante da feira, seja expositor ou visitante. Houve muitos casos de gente que ficou mais de 3 horas em filas de carros à procura de uma vaga para estacionar. Debaixo de um sol escaldante... Para sair do parque, eu mesmo, depois de um dia cansativo, por volta de 19:00 horas, demorei mais de duas horas para ter a sorte de entrar na rodovia, num trânsito que na feira era afunilado, parece que propositalmente. Na segunda, em dia de visita do presidente Bolsonaro, o caos foi perfeito, provocado pela segurança. Cheguei de São Paulo na feira menos de 9h00, mas só consegui entrar no parque 11h40. Bolsonaro entrou a cavalo na feira, e provocou tumultos de toda ordem, evidentemente, porque pensa de forma urbana, e acredita que aquilo lá é um imenso rodeio de peões.
A queixa acima foi observada e vi relatos mil comprovando que os administradores da Agrishow (a Informa) não estavam num bom ano, ou, o mais provável, contrataram gente com pouca prática pra gerenciar um evento daquela magnitude. Se a gente diagnostica mal um problema, qualquer solução será paliativa e pode até piorar o problema.
O trânsito a pé na feira é perverso, pois apenas a avenida central é asfaltada, e a praça central é coberta com blocos de concreto, cerca de uns 500 m2, as demais ruas (95% da feira) são de terra com brita. A caminhada na brita é penosa, cansativa, até mesmo perigosa. Destruí, este ano, literalmente, um par de sapatos e uma botina, ambos ainda de pouco uso, por conta do piso. A poeira chega a ficar sem importância no final do dia, ou mesmo o calor e a baixa umidade da atmosfera, típicos da época em Ribeirão Preto. A brita esgota os visitantes.
Outra reclamação, bastante antiga, foram os banheiros, sempre cheios, e cujas equipes de limpeza parecem ser incapazes de manter os locais sempre limpos. É muita gente, isso é verdade, mas a administração parece ignorar as reclamações dos expositores quanto a isso. E pior, o incompetente ou pouca prática que estava mandando este ano, mandava fechar os banheiros a partir de 19h00, provocando um fenômeno de descartes de urina a céu aberto na Agrishow, de gente que ficava nos estandes tomando uma cervejinha e conversando, esperando o trânsito amainar e quando queria ir ao banheiro não tinha nada aberto. Na emergência os apertados faziam xixi em qualquer grama por perto, deixando por conta do sol quente do dia seguinte ferver os líquidos indevidos e disseminando esses odores aos nossos narizes.
Queixas contra os organizadores da Agrishow sempre existiram. Que era uma feira muito mais cara que as outras, que os hotéis e restaurantes exploravam com preços até 10 ou 20 vezes maiores, além da arrogância típica daqueles que possuem o monopólio de algum mercado ou segmento. Críticas de que os expositores não podiam, por exemplo, usar um guindaste próprio dentro do espaço da feira, porque devem usar - e pagar - por um guindaste de alguém de dentro da feira, e um serviço desses de R$ 200,00 reais ou 300,00 num mercado normal, dentro da feira saia sempre por R$ 2.000,00 ou mais, deixando raiva e indignação em quem era obrigado a pagar por isso. Muitas outras queixas sempre existiram pelo excesso de burocracia, altíssimo volume de normas - só se pode entrar na feira, no período de montagem, equipado com botas, capacete e óculos especiais -, e que este ano incentivou aos "fiscais" da feira a ameaçarem e cobrarem multas de alguns expositores que "transgrediam" essas normas e regras. Há queixas mais graves, de que alguns funcionários causavam dificuldades propositalmente, durante o período de montagem da feira, para depois aparecer com uma solução, um dia depois, desde que o expositor pagasse 2, ou 5 mil, conforme o caso. Os relatos de alguns expositores indicavam cobranças até maiores de 8, 10 mil reais, ou mais. A coisa, ou exploração, como queira o leitor, tinha até nota fiscal para oficializar o achaque, em forma de prestação de serviços. Como é prática, ao que parece generalizada, pode ser que algumas empresas expositoras tenham essas notas fiscais para mostrar à empresa organizadora a pilantragem que andam fazendo.
A maior queixa, entretanto, foi generalizada, e concentrou-se no wi-fi, porque só aqueles que pagaram muito caro tinham internet na feira. Como cliente fui reclamar no estande da Vivo, também uma das expositoras da feira, e eles também reclamaram que o wi-fi deles era insuficiente para as necessidades deles. Compraram mais de 500 megabytes por segundo e recebiam menos de 30, ou nem isso em alguns momentos.
A questão do sinal fraco, apontavam todos os analistas, seria para uma decisão administrativa equivocada dos organizadores da feira, que optaram por conceder exclusividade de mercado dentro da feira a um único provedor. Este cobrava o que queria, e conforma a cara do freguês. Tive relatos de gente que estava pagando 32 mil, mas a pedida original tinha sido de 55 mil reais, por apenas 5 dias de uso; típico caso de exploração de um fornecedor exclusivo. Ou seja, se alguém descobre um grupo de 200 pessoas com sede no meio de um deserto, o copinho de água mineral geladinha pode custar uns 5 mil reais, quem sabe 20 mil se o cliente tiver cara de rico. Com certeza alguns seres humanos são predadores de outros, e na Agrishow 2022 isso não foi diferente na questão da internet.
Foram generalizadas as queixas, e críticas. Teve empresa expositora de pequeno porte que sujeitou-se a pagar 5 mil reais pelos 5 dias para ter internet para uso exclusivo de 5 pessoas, diretores e gerentes. Dá para entender que a região é de baixa demanda (é área rural) de uso de internet nos demais 360 dias do ano, o que não incentiva nenhuma empresa a investir lá apenas para o período da Agrishow, o que torna a encrenca mais difícil de resolver. Isso deve piorar com a chegada da internet 5G, porque as antenas do 5G possuem envio de sinal com menor distância do que a do 4G. Me parece, entretanto, que conceder o privilégio de exclusividade a apenas um fornecedor incentiva a prática da exploração. O que se observou na prática é que alguns expositores mais espertos conseguiram pagar "preços até que razoáveis" de 10 ou 12 mil reais por 5 dias, enquanto que outros pagaram o dobro ou o triplo disso, mas o provedor não conseguiu entregar a todos o que tinha vendido. Com isso, ninguém tinha internet, e, sem celular, a alegria da vida, dos encontros e negócios fechados, chegou a entrar em colapso em alguns momentos. Conforme a Vivo, mediram picos de 1.200 acessos por segundo, e o sistema - parece que ainda provisório, depois de 27 anos - tem capacidade máxima para um pico de 200 / 300 acessos.
Venderam a mãe, bem caro, e não entregaram, o que provocou mais irritação ainda dos expositores, que se sentiram explorados. Conversei em público - mais de 5 pessoas ao redor - com um dos altos dirigentes da feira. Apresentei as queixas de forma resumida, especialmente a de custos, internet, e ele me disse que só via um grupo de pequenos / médios empresários descontentes e críticos, e que as empresas de tratores e outras grandes até concordavam que alguns preços estavam caros, mas não iriam abandonar o barco por causa disso, porque entendiam as dificuldade do gigantismo e das distâncias da feira. Afora isso, me informou ele que há uma fila de 200 empresários esperando para entrar na Agrishow. Fechou a conversa esclarecendo que os incomodados é que se mudam. Não contestei publicamente meu interlocutor, até porque é um amigo, mas acho que mentiram para ele, a Agrishow 2022 tinha alguns espaços nobres vazios na feira, um deles até mesmo na avenida principal, e mais ainda, alguns amplos espaços nas avenidas G e H. A não ser que esses 200 ansiosos expositores candidatos queiram espaços ainda melhores.
Fiquei pensando com os meus botões que essa é a resposta de quem não quer resolver os problemas. Argumenta que o problema não existe. Minimiza, sem nenhuma empatia, o problema dos outros. É um sintoma também do "novo normal". no pós pandemia. O processo de liderança, no caso de omissão, permite as distorções e barbaridades que acontecem na feira, tornando a questão muito desagradável.
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