Marketing da terra
O freguês sempre tem
razão
Richard Jakubaszko
O aforismo praticado pelos padeiros lusitanos jamais foi
contestado pelos especialistas da mercadologia, comprovando-se como verdade
insofismável. Entretanto, no mundo contemporâneo, tanto a mídia de massas,
especialmente TVs e jornais, e adeptos de interesses comerciais tentam
desmontar e distorcer a realidade. A tentativa de desconstrução dessa verdade
encontrou respaldo nas afirmações dos ambientalistas de que o consumidor comum
rejeitaria adquirir produtos que contribuíssem para a poluição ambiental ou que
trouxessem perigo à sua saúde. Essas “ameaças” categóricas, causaram receios
entre produtores rurais, o que é natural.
Três exemplos recentes comprovam que o consumidor não
obedece a essa ótica ambientalista, ou não lê jornais e nem assiste TVs, ou
ainda, o que é mais provável, definitivamente, não está nem aí para tais
questões ambientais. Se não, vejamos:
1º – As sacolas plásticas de supermercados.
Conforme divulgado exaustivamente na mídia, os supermercadistas
paulistas realizaram acordo político com o Governo do Estado de São Paulo para acabar
com o fornecimento das mesmas aos clientes. A mídia ambientalista aplaudiu a
iniciativa. Implantada a ideia houve uma reação crítica da sociedade, e as donas
de casa protestaram de forma veemente (sem sequer apelar para a realização de
passeatas) com a ausência das sacolinhas, mais ainda por terem de comprar
outras sacolas, também de plástico (mas chamadas de biodegradáveis...).
Revelou-se, no episódio, que a “meritória” intenção dos
supermercadistas nada tinha de interesse na questão ambiental, mas apenas de
reduzir custos e aumentar lucros. A proibição foi revogada em junho último, e
ninguém reclama mais.
2º – A paridade do etanol versus gasolina.
Há um
consenso antigo de que o etanol deve custar no máximo de 65% do preço da
gasolina para tornar-se vantajoso do ponto de vista econômico, mesmo tendo a
vantagem de ser muito menos poluente. O etanol transmite mais potência ao
veículo, mas consome mais por km percorrido, ou melhor, é mais esbanjador do
que a gasolina. Desde 2011 assistimos no Brasil a uma guerra comercial do
etanol versus gasolina que seria cômica, não fosse trágica. Os usineiros afirmam
que o Governo sustenta preço artificial baixo da gasolina. Já o Governo acusa
os usineiros de não investirem nos canaviais, o que ocasionou queda de produção,
e de provocarem a anormalidade de fornecimento, para ter aumento dos preços do
etanol. Na última entressafra os preços do etanol estiveram em 80% da paridade com
a gasolina. Mesmo com a possibilidade de proporcionar visível benefício
ambiental às cidades onde vive, o consumidor não quis saber de conversa, aderiu
ao uso da gasolina, mesmo que essa não transmita tanta potência aos seus HPs.
No jogo de empurra, o Governo Federal reduziu de 25% para 20% a adição de
etanol à gasolina. Sobrou etanol no mercado, os preços caíram, mas os
investimentos continuam baixos, e aguarda-se a próxima entressafra, quando a
guerra deve continuar. O consumidor não está nem aí para a questão ambiental.
3º – Embalagens dos OGMs com avisos
Os ambientalistas brigaram muito para tornar
obrigatório o uso do triângulo amarelo com um ameaçador “T” em seu interior,
nas embalagens de alimentos. Através de legislação tornou-se isso obrigatório no
Brasil. Na visão idealizada dos ambientalistas o consumidor recusaria esses
produtos, e os agricultores deixariam de comprar sementes GMs, liquidando com
as empresas fornecedoras. A Europa, em recados através da mídia acrítica, exige
do Brasil o fornecimento de alimentos não OGMs, mas jamais se dispôs a pagar um
centavo a mais, comprovando a hipocrisia do discurso.
Pois vem da Europa outro exemplo da palavra final do
consumidor.
Para observar consumidores em uma situação real,
pesquisadores da Universidade de Otago * (Nova Zelândia), montaram barracas de
frutas em ruas de 6 diferentes países: Bélgica, França, Alemanha, Nova
Zelândia, Suécia e Reino Unido. As tendas vendiam morangos, uvas e cerejas que
apresentavam 3 rótulos diferentes: “orgânico, certificado Biogrow” (produto que
fortalece a planta), e “baixo resíduo, produzido em área potencial para
conservação” e “100% livre de defensivos, geneticamente modificado".
Se os clientes perguntavam sobre as frutas GM, os
fornecedores explicavam que continha genes que faziam a planta produzir seu
próprio inseticida natural. Na verdade, todas as frutas tinham a mesma origem. Nas
barracas de frutas, os frutos GM foram os mais escolhidos.
Com pequena redução na condição de preços, o fruto GM foi a
escolha mais popular ou a segunda mais popular em 3 dos 5 países europeus nas
bancas de fruta, apesar de ser a opção menos popular em pesquisas de mercado convencionais
nesses mesmos países.
Depois de fazer as suas compras nas bancas, os clientes
foram questionados sobre suas decisões. O preço foi um fator comum. Muitos
clientes que compraram “orgânico” ou “baixo resíduo” disseram tê-lo feito por força
do hábito, e alguns diziam que as frutas orgânicas pareciam melhor e mais
saborosas. Mesmo tendo provado todas as frutas, alguns consumidores não
acreditaram que todos os frutos eram os mesmos, com a mesma origem.
Os resultados sugerem que pesquisas feitas anteriormente podem
ter exagerado o grau de sentimento negativo em relação aos produtos GM. Os
investigadores concluem que “a expectativa social” leva as pessoas a fazer escolhas
diferentes em uma situação de pesquisa das que fariam em uma situação de
consumo real.
Em outras palavras, o consumidor pode escolher um produto mais
barato, mesmo sendo GM, se acreditar que ninguém está olhando.
Entretanto, em situação de resposta a um questionário, há o
desejo de optar por algo socialmente aceitável.
Os pesquisadores apontam que seu raciocínio foi inferido a
partir dos comentários coletados.
No entanto, acreditam que as descobertas mostram que os GMs
serão mais aceitos pelos consumidores se forem mais baratos e suas vantagens
(por exemplo, ausência de resíduos de pesticidas) forem claramente
identificadas ou explicadas.
Conclusão: a vontade do consumidor é soberana, pode até ser
perversa, mas o freguês sempre tem razão. Revogam-se todas as boas e más
intenções em contrário.
* Fonte: European Commission
– Science for Environment Policy
Publicado originalmente na revista Agro DBO / nº 36, agosto 2012 - Licença permitida de reprodução, desde que citada a fonte: www.agrodbo.com.br
.