sábado, 28 de maio de 2011

Código Florestal: o anti-marketing de uma nação.

Richard Jakubaszko
O artigo abaixo está publicado na revista DBO Agrotecnologia nº 30, maio/junho 2011, em circulação desde hoje.

Código Florestal:
o anti-marketing de uma nação.
Entre mortos e feridos, salvaram-se todos na votação e aprovação das alterações do Código Florestal no último dia 24 de maio na Câmara Federal, em Brasília. Foi acachapante o resultado de 410 a 63 e uma abstenção. Para a bancada ruralista, o entendimento foi de que houve uma vitória parcial, enquanto os ambientalistas reputavam uma enorme derrota. Já a nossa presidente, consta que ficou irritada com a aprovação do novo código na Câmara, após o racha da base governista, e garantiu que vetará os trechos do texto que considerar (a anistia aos que desmataram) equivocados, caso a base aliada não consiga promover mudanças no Senado.

O resultado da votação na Câmara não é resultado de apenas um só fator.O tema é complexo e contraditório e não foi à toa que o relator Aldo Rebelo – um parlamentar reconhecidamente capaz e correto – levou dois anos negociando um “acordo possível”. É relevante esse registro, pois seria uma injustiça afirmar que o texto produzido por ele reflete preferências pessoais. No máximo, indica a tentativa de seu partido (PCdoB), e dele próprio, em tentar salvar o futuro da Reforma Agrária, razão principal por que foi feita a indicação de Rebelo como relator desse polêmico projeto de lei.

Assim, foi feito o que era possível, porém, não foi o adequado. Nem para os produtores rurais, nem para os ambientalistas e nem para a sociedade.

As negociações impostas pelos ambientalistas estavam na busca do “proibir- proibir“ (o uso da terra no futuro), além do “punir-punir“ quem havia desmatado, independente de qual condição legal – ou ilegal – em que isso tenha acontecido no passado. As lideranças rurais foram, nesse sentido, inábeis em conduzir as negociações, pois aprovaram o texto proposto pelo relator, e com isso ficaram sem margem de negociação com os ambientalistas, que avançaram nas exigências.

E, por ceder demais em relação a algumas questões para achar “o possível”, permitiu-se que os ambientalistas fossem ainda mais intransigentes, sem que os ruralistas tivessem margem de manobra para negociar. Os ambientalistas perderam, e agora dependem do veto da Presidente Dilma e da capacidade de sustentá-lo no Congresso. Veto que deverá ser temerário diante da esmagadora maioria com que o Código foi previamente aprovado na Câmara.

Políticas são pressões e contrapressões, de várias origens. Neste caso, não foram apenas os ruralistas. Sozinhos, eles não têm forças para tanto.

O ponto vital – a emenda, aprovada por 273 votos a 182, que dá aos estados o poder de estabelecer quais atividades possam justificar a regularização de áreas desmatadas – e que abre caminho para anistiar os desmatamentos já feitos – teve a oposição mais do que expressa do Governo Dilma. O PMDB em peso, sem exceção, votou pela aprovação do Código, embora nem todos tenham dado votos para rejeitar a emenda, apesar do apelo dramático feito pelo líder do Governo, deputado Cândido Vacarezza, em nome da Presidente.

Ainda existe muito tempo, até a aprovação no Senado, e depois para receber a sanção, ou o veto da presidente Dilma Rousseff. O que passa a ser discutido – e temido – nos próximos dias é como ficará o fatídico 11 de junho, data máxima para os produtores regularizarem suas situações individuais.

Teremos tempos difíceis pela frente, e a grande mídia continuará apoiando os ambientalistas. Os produtores rurais, pela inexistência de lideranças, lamentavelmente devem se consolar com os resultados que virão. Perderam uma excepcional oportunidade de negociação no Congresso no sentido de estabelecer, por exemplo, que as APPs teriam um desconto ou compensação em espaço equivalente nas áreas de Reserva Legal.

Observou-se um “debate” estéril e até mesmo antidemocrático do emocional versus racional, por isto todos foram perdedores, ou assim se consideram.

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A SOCIEDADE CONFISCOU TERRAS FÉRTEIS DOS
PRODUTORES EM NOME DA SUSTENTABILIDADE
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Fora disso, diante da aprovação do Código Florestal pela Câmara, o que se constata é que a sociedade urbana pune os produtores rurais com um confisco de terras em nome da sustentabilidade, artifício legal que não possui equivalência em nenhum outro país no planeta. As áreas destinadas à preservação ambiental, e alegadamente de manutenção da biodiversidade, com o espírito de “beneficiar” as gerações futuras, não terão nenhuma compensação financeira aos produtores.

Do novo Código Florestal pode-se dizer que será um novo marco regulatório, deve trazer segurança jurídica diante da insana pregação ambientalista, mas que foi o anti-marketing de uma nação na futura questão de produzir mais alimentos, ninguém tenha dúvida.

Difícil, quiçá impossível, será desatar esse nó górdio legislativo no futuro, quando se necessitar de novas áreas para a produção de ainda mais alimentos, pois o crescimento demográfico continua incontrolável, e gente precisa de comida para ser sustentável.
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6 comentários:

  1. Ana Carolina Cerdeira29 de maio de 2011 às 15:51

    Richard,
    gostei, vc tem razão numa série de aspectos, apesar de defender demais os produtores rurais. Por que vc faz isso? Idealismo? Vc também é produtor, ou é só jornalista?
    Ana Cerdeira

    RESPOSTA DO BLOGUEIRO:
    Sou só jornalista.
    Sobre defender os produtores rurais, não sei dizer com 100% de exatidão. São mil coisas. Faz mais de 40 anos que trabalho com agricultura. Mas uma história, como relato a seguir, esclarece meu jeito "idealista" de ser:

    Era uma vez um escritor que morava em uma praia tranqüila, próximo a uma colônia de pescadores.

    Todas as manhãs ele caminhava à beira do mar para se inspirar e, à tarde, ficava em casa escrevendo. Certo dia, caminhando pela praia, viu um vulto ao longe que parecia dançar.

    Ao chegar perto, reparou que um jovem recolhia estrelas-do-mar da areia, para, uma a uma, jogá-las de volta ao oceano, para além de onde as ondas quebravam.

    "Por que você está fazendo isto?", perguntou.

    "Você não vê?", explicou o jovem, que alegremente continuava a apanhar e jogar as estrelas ao mar;

    "A maré está vazando e o sol está brilhando forte... elas irão ressecar e morrer se ficarem aqui na areia."

    O escritor espantou-se com a resposta e disse com paciência: "Meu jovem, existem milhares de estrelas-do-mar espalhadas pela praia. Você joga algumas poucas de volta ao oceano, mas a maioria vai perecer de qualquer jeito. De que adianta tanto esforço, não vai fazer diferença?"

    O jovem se abaixou e apanhou mais uma estrela, sorriu para o escritor e disse:
    "Para esta aqui faz....", e jogou-a de volta ao mar.

    Naquela noite o escritor não conseguiu escrever, nem sequer dormir.
    Pela manhã, voltou à praia, procurou o jovem, uniu-se a ele, e, juntos, começaram a jogar estrelas-do-mar de volta ao mar.

    Reflexão:
    1. Quando foi a última vez que você jogou estrelas ao mar? Alguém já lhe ajudou a jogá-las?
    2. E quantas vezes você ajudou alguém a jogá-las?
    3. Quantas vezes você parou de jogar estrelas de volta, porque alguém lhe disse que não adianta, não tem jeito mesmo?
    4. Você já se sentiu como uma estrela-do-mar, lançada de volta ao mar, salva por alguém?
    5. Você lembrou de agradecer? Ainda há condições de agradecer? Façamos do nosso mundo um lugar melhor. Façamos a diferença!

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  2. Cristiane C. Soares, Santa Isabel30 de maio de 2011 às 07:30

    Boa noite Sr Richard,
    Como produtora rural, percebo a vital necessidade de aprender a crescer, produzir, desenvolver de forma sustentada. Nós desconhecemos o que seja APPs e Reservas, mas sabemos bem o valor da água em uma propriedade rural e somos obrigados a concordar que desmatamos porque ignoramos o real valor das florestas. Agora, por força de lei, teremos a oportunidade de conhecer o potencial das nossas florestas secundárias e quem sabe descobrir que os sistemas agroflorestais são só outro sistema de produção, menos lucrativo, mas capaz de
    proporcionar diversos produtos como lenha, madeira, folhas, frutos, ervas medicinais, plantas ornamentais e ainda é capaz de prestar
    serviços ambientais cruciais no equilíbrio do clima, no seqüestro de carbono, na manutenção dos mananciais de água, no controle de pragas e
    doenças na agricultura e na manutenção da biodiversidade. Não vai doer...
    Como ambientalista, considero um avanço a possibilidade de implementação do Código Florestal. Se conseguirmos proteger e
    recuperar todas as APPs desse país será um feito único. Mas o momento, realmente, não é de comemoração. Algumas mudanças significam um real
    retrocesso como a utilização do solo em topos de morros, onde agora admite-se a manutenção de atividades florestais, pastoreio extensivo,
    culturas lenhosas perenes, como café, maçã, uva, ou de ciclo longo, como a cana de açúcar; a questão das áreas consolidadas, antes
    inexistentes; a emenda que dá aos estados o poder de estabelecer as atividades agrícolas permitidas em APPs; ou a questão da
    retroatividade, agora irretroatividade pois permite àqueles que mantinham reserva legal em percentuais menores (exigidos pela lei em vigor na época) a isenção de recompor a área segundo os índices exigidos atualmente, ou seja, quem abriu 50% do seu imóvel na Amazônia quando a lei permitia não estará mais obrigado a atender a exigência de 80%. Já a possibilidade da APP contar como Reserva Legal pode garantir maior adesão do proprietário rural em geral no compromisso de preservação e recuperação.
    A questão do temido prazo final de 11 de junho foi alterado. Agora a efetiva regularização ocorrerá a partir da criação do cadastro de
    regularização ambiental (CAR) que deverá ser criado até três meses após a sanção do novo código e a adesão ao programa de regularização
    deverá ocorrer em um ano – prazo que poder ser prorrogado pelo governo.
    Gostaria de concluir ressaltando que, do meu ponto de vista, preservação ambiental e produção de alimentos não caminham em direções opostas e muito menos que a primeira suprime ou ameaça a segunda.
    Sabemos que a fome é muito mais um problema político do que técnico.
    Um terço da produção mundial de cereais destina-se à alimentação do
    gado e apenas 44% das terras cultiváveis do planeta são hoje exploradas. Esses dois elementos já são suficientes para detectar que
    a nossa real ameaça é o crescimento mundial do CONTROLE de alimentos.
    Um abraço,
    Cristiane C. Soares, Santa Isabel, SP.

    COMENTÁRIO DO BLOGUEIRO:
    Cristiane, entendo seu comentário como ambientalista e cidadã, não como produtora rural, como se autodenomina.
    Há um engano em seus 44% de terras cultiváveis, esse número anda superior a 75%, pois onde há terra não existe água, a não ser que vc fale em terras nos polos, abaixo das calotas polares.
    E fome não é questão política, não, nem problema técnico, como diriam os tucanos é "espaço vazio" no estômago, e dói muito... chega a matar!
    Richard

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  3. Caro Richard, acompanho seu blog e sua luta na defesa da nosso agronegócio, corrente da qual me filio.
    Gostaria de saber a sua opinião sobre duas questões que me intrigam:
    1 - Por que os ruralistas não desenvolvem uma campanha de marketing dos negocios do campo, como fazem os ambientalistas, em relação às florestas? Falta liderança aos ruralistas? Por que eles não divulgam a importância que tem o agronegocio brasileiro, inclusive comparando com a agricultura do eua e da europa?

    2 - Por que os ruralistas não mostram o que realmente representam essas ongs internacionais? mostrando as verdadeiras intenções dessas organizações. Por que os ruralistas não mostram(divulgam) que essas ongs só fazem protestos nos países dos outros, enquanto que, nos seus países de origem eles ficam de bico calado?

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  4. Prezados,
    Como dizia Cora Coralina, "estamos todos matriculados na escola da vida, onde o mestre é o TEMPO". Saberemos no futuro quem estava com a razão!
    Abs,
    Marcello Brito
    Agropalma

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  5. João Carlos de Campos Pimentel30 de maio de 2011 às 14:12

    Sr. Richard,
    Sugiro uma matéria extensa da DBO tecnologia sobre a legislação ambiental dos outros países do mundo, especialmente em relação à reserva legal.
    Atenciosamente,
    João Carlos de Campos Pimentel
    Diretor Técnico de Divisão
    EDR São Paulo
    CATI-SAA-Governo de São Paulo

    COMENTÁRIO DO BLOGUEIRO:
    Pimentel, obrigado pela sugestão, mas custa muito caro obter isso, e é demoradíssimo. O que posso adiantar é que nenhum país no planeta possui um Código Florestal como nós brasileiros. Possuem regras básicas, como APPs nas orlas de rios (5 metros na Finlândia, Suíça e Canadá), e em nenhum deles existe a Reserva Legal. RL é confisco, foi o que se fez no Brasil. As áreas de reservas florestais que os EUA e Canadá possuem, por exemplo, são áreas públicas.

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  6. Cristiane C. Soares, Santa Isabel4 de junho de 2011 às 23:13

    Lembrando que 2011 é o Ano Internacional das Florestas, assim como o colega, também gostaria de sugerir uma matéria para a revista: um
    estudo realizado pelo Centro Agroflorestal Mundial, publicado em 24/8/09. Segundo esse estudo, os agricultores e suas fazendas podem
    não ser inimigos das florestas como geralmente são retratados. O relatório do centro, baseado em imagens de satélites é o primeiro a estimar a cobertura das árvores em fazendas em todo o planeta e mostra que quase metade da terra cultivável do mundo tem pelo menos 10% de
    cobertura com árvores. Diante do momento histórico que nosso país atravessa definindo seu Código Florestal, o atual debate sobre as florestas e a conscientização, forçosamente necessária, por parte dos nossos proprietários rurais sobre o seu relevante papel como parceiro
    no reflorestamento e na conservação das florestas nacionais, é responsabilidade da mídia atuar nesse cenário de modo consciente, imparcial, avançando na discussão, divulgando, informando e esclarecendo as possibilidades de uso sustentável dos sistemas agroflorestais. E, indo um pouco mais além nessa discussão, chegamos
    no ponto onde os produtores rurais fariam mais para preservar as árvores se recebessem créditos por sua importante atuação no combate às mudanças climáticas, questão discutida no Pacto Climático da ONU em Copenhaguen.
    Cristiane C Soares, Santa Isabel, SP

    RESPOSTA DO BLOGUEIRO:
    Cristiane,
    vou pensar numa nova abordagem para publicar sobre essas questões na revista. De antemão informo que o planeta tem pouca terra disponível para agricultura, exceto no Brasil. Onde tem terra não existe água. Nem a China, nem a Austrália, e muito menos na Africa poder-se-ia aumentar mais do que 15% da área plantada já existente. Já publiquei na revista uma entrevista com o Dr. Fernando Penteado Cardoso, presidente da Fundação Agrisus (Agricultura Sustentável) e comentada pelo Dr. Odo Primavesi, onde ele faz a sugestão de que se possa desmatar 1/3 da Amazônia, pois será incoercível (que significa "o que não se pode proibir") a ocupação nessas terras diante do crescimento demográfico no planeta, e que irá gerar uma necessidade de mais alimentos. Diante da falta de terras agricultáveis só a Amazônia salvaria o planeta da fome. O que temos de terras ainda disponíveis daria para suportar só mais uns 15 ou 20 anos, mesmo assim com alimentos muito caros. Daí pra frente seria o caos...

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