segunda-feira, 15 de março de 2021

Prof. Molion: “CO₂ controlador do clima global é hipótese absurda”

Luis Dufaur *  

Alerta Científico e Ambiental – Há dois conceitos amplamente difundidos, que têm ganhado grande destaque nas discussões sobre a alegada devastação do bioma Amazônia.

Um deles é o dos chamados “rios voadores”, a transferência de umidade atmosférica da Região Norte para o Centro-Sul do País, promovida pela floresta, e que estaria ameaçada pelo desmatamento.

O outro é o chamado “ponto de inflexão” (tipping point), um suposto índice de desmatamento a partir do qual a floresta se converteria irreversivelmente em um ambiente de savana.

Quais são as evidências científicas para eles? Esses riscos são reais?
 

Prof. Luiz Carlos Molion – Em primeiro lugar, “rios voadores” é uma expressão plagiada.

Ela foi usada na década de 1950 por meteorologistas dos EUA, para descrever o transporte de umidade pelo jato polar, uma corrente de ventos muito forte, encontrada nos níveis altos da atmosfera em latitudes temperadas, que sopra de Oeste, os chamados ventos de Oeste.

A afirmação que a floresta é a geradora do vapor d’água transportado para outras regiões do continente pelos chamados rios voadores, e que a transformação da floresta em pastagem reduziria em 25% as chuvas sobre o Brasil, é resultante dos MCG, sem verificação ou constatação.

Amazônia não é essencial para a distribuição das chuvas para outras regiões remotas da América do Sul, porque a Amazônia não é fonte de umidade para a atmosfera.

A fonte principal de umidade para as chuvas amazônicas é o Oceano Atlântico Tropical, principalmente, durante o verão do Hemisfério Sul [dezembro-março].

Dados de fluxo de umidade observados entre 1999-2014 sugerem que, em média e em números redondos, entram na Bacia Amazônica o equivalente a 500.000 m³/s de umidade trazidos pelos ventos do Atlântico, dos quais 80% são transformados em chuva localmente e os 100.000 m³/s restantes “passam direto” por sobre a região.

Dos 400.000 m³/s de chuvas que caem na bacia, a metade sai pelo rio Amazonas (200.000 m³/s) e a outra metade é reciclada por evapotranspiração e incorporada ao fluxo de umidade que chega às outras regiões da América do Sul.

Ou seja, em média, 300.000 m³/s, dos 500.000 m³/s (60%) originalmente saídos da evaporação do Atlântico, chegam a outras regiões ao sul da Amazônia, com os restantes 200.000 m³/s sendo devolvidos ao Atlântico pelo rio.

Portanto, na escala de tempo climática, a Amazônia apresenta um balanço hídrico estável.

Árvore, ou floresta, não é “máquina” de produzir água, apenas recicla a água da chuva anterior, que estava armazenada no solo.

Embora haja uma interação floresta-atmosfera, a longo prazo, a floresta existe porque chove e não o contrário.
 

Prova-se, por reductio ad absurdum, que, se a floresta fosse fonte de umidade, a região já teria se transformado num deserto desde que se estabilizou, após o término do último período glacial, há cerca de 15 mil anos.

O elemento geofísico fundamental para direcionar a umidade do Atlântico para outras regiões da América do Sul é a formidável barreira ao fluxo de umidade imposta pela Cordilheira dos Andes.

Outro elemento é uma célula de circulação de atmosférica direta, conhecida como Célula de Hadley-Walker, que se forma em média, e sempre se formará, pois o Sol, inevitavelmente, aquece a superfície do continente sul-americano durante o verão austral.

Em consequência, o ar se torna menos denso e sobe (convecção), transportando umidade para cima e produzindo nuvens e chuva.

É bem provável que a floresta interaja com a atmosfera, no sentido de intensificar essa célula de circulação em anos apropriados.

Os anos em que essa célula não se forma são exceções.

É observado, por exemplo, que, quando se tem um evento El Niño forte [aquecimento anormal das águas do Oceano Pacífico Oriental – n.e.], como o de 2014-2016, essa célula de circulação é inibida e a Bacia Amazônica passa por uma forte estiagem.

Isto não ocorreria se a floresta fosse a causa principal da existência dessa célula de circulação atmosférica.

Porém, o aquecimento da superfície pelo Sol, e a consequente célula de circulação, sempre existirão, independentemente da existência da floresta.

O bom senso físico sugere que, se houvesse um desmatamento generalizado, a superfície amazônica ficaria aerodinamicamente mais “lisa”, os ventos se acelerariam nos níveis baixos da atmosfera e transportariam mais umidade para as outras regiões do continente, aumentando o volume das suas chuvas.

O “ponto de inflexão” seria o percentual de desmatamento além do qual a floresta não se recuperaria.

Em 2016, foi sugerido, por Carlos A. Nobre e colegas, que esse ponto seria o desmatamento de 40% do Bioma Amazônia, mas este percentual se baseia em resultados dos MCG e, portanto, carece de base científica sólida, sendo meramente especulativo.

Pelo que se tem observado ao longo dos anos, a floresta tem uma grande capacidade regenerativa.

Alerta Científico e Ambiental – Outra ideia bastante popular é a de que a Amazônia seria um sumidouro de carbono essencial para a dinâmica do clima global.

Um documento enviado ao presidente Joe Biden por um grupo de políticos e ex-altos funcionários do governo dos EUA (Climate Principals) chega a afirmar que a Amazônia detém mais carbono do que as emissões mundiais “de muitos anos”, e que a liberação deste carbono na atmosfera teria “consequências climáticas catastróficas”.

Estas afirmativas têm procedência?

Prof. Luiz Carlos Molion – Outra vez, não têm! São 550 milhões de hectares cobertos pelo Bioma Amazônia.

A quantidade de carbono [Q] contida nessa floresta é calculada pela formula Q= %CAD, onde %C é o percentual de carbono encontrado em uma árvore e, usualmente, o valor de 45% é aceito, A (550 milhões ha) é a área do bioma e D, a densidade da biomassa, dada em toneladas de matéria seca por hectare (t/ha).

Essa última variável é a grande incógnita, pois, dentro do bioma, há áreas com distintas densidades de biomassa.

Uma consulta à literatura mostra valores que vão de 180 t/ha a 720 t/ha.

Se se aceitar que o Bioma Amazônia tenha uma densidade de biomassa média de 300 t/ha – valor considerado plausível empiricamente -, empregando-se a fórmula acima, chega-se a um valor de cerca de 75 bilhões de toneladas de carbono (GtC) contidas na floresta.

Pelos números recentes (2019) de emissões por regiões, a Ásia, América do Norte e Europa, emitem um total de 7,5 GtC/ano, donde se conclui que apenas essas três regiões emitem uma “Floresta Amazônica inteira” para a atmosfera em cerca de 10 anos.

Se o estoque de carbono da Amazônia fosse totalmente liberado para a atmosfera, poderia aumentar, teoricamente, a concentração do CO₂ atmosférico em cerca de 35 ppmv [partículas por milhão em volume], menos de 10% da concentração atual, que é 400 ppmv.

Considerou-se que a emissão de 2,13 GtC acarreta um aumento de 1 ppmv na concentração atmosférica, de acordo com a literatura.

Entretanto, um cálculo simples mostra que, na atual taxa de desmatamento de 11.000 km² por ano, a liberação total desse estoque levaria cerca de 500 anos para se completar, admitindo zero acréscimo de qualquer tipo de cobertura vegetal durante esse período.

Por outro lado, as medições feitas na Amazônia Central, em 1987, durante o Experimento ABLE-2B (Atmospheric Boundary Layer Experiment, NASA/INPE) revelaram uma assimilação pela fotossíntese de 4,4 quilogramas de carbono por hectare por hora (kgC/ha/hora) durante o período diurno e uma perda por respiração de 2,57 kgC/ha/hora durante o período noturno.

Admitindo que esses números possam ser generalizados para os 550 milhões de hectares do Bioma Amazônia, ter-se-iam 4,4 GtC/ano de assimilação de carbono, obviamente, subtraída a taxa de respiração noturna.

Considerando que as atividades humanas emitam cerca de 10 GtC/ano atualmente, tal assimilação corresponde a 44% das emissões de carbono antropogênicas.

Se se admitir a hipótese absurda defendida pelo IPCC, de que o CO₂ seja o grande controlador do clima global, é desejável que sua cobertura vegetal amazônica seja conservada.
Oceano Pacífico é o principal regente do clima na Terra
Na realidade, os impactos no clima global e na concentração global de CO₂ (vide o Acordo Climático de Paris, 2015) não são argumentos fortes para se manter a floresta.

Os principais argumentos são a conservação da biodiversidade e a proteção dos solos, evitando a sua erosão, assoreamento dos leitos dos rios, mudança da qualidade de suas águas e de toda vida que delas depende.

Alerta Científico e Ambiental – O mesmo documento afirma que as emissões causadas pelo desmatamento da Amazônia constituem uma grande fonte de “poluição climática” – seja lá o que isto significa – tão grande quanto à de economias avançadas, como o Japão e a Alemanha.

Prof. Luiz Carlos Molion – O Brasil detém cerca de 65% do Bioma Amazônia dentro da Amazônia Legal.

Nessa região, estabelecida para fins de incentivos fiscais, os 35% restantes são constituídos de biomas diversos, como Cerrado, Cerradão e Campinarana, por exemplo.

A área sob pressão antrópica não é o Bioma Amazônia e, sim, os 35% restantes, que possui uma densidade de biomassa muito menor que a da floresta tropical chuvosa.

Como foi dito, a taxa de desmatamento anual já esteve pior no passado.

Usando-se uma taxa de desmatamento atual de 11 mil km², ou 1,1 milhão de hectares, sendo essa área de desmatamento do Bioma Amazônia, e não da Amazônia Legal, com a densidade de biomassa acima citada de 300 t/ha, e admitindo, ainda, que as queimadas teriam 100% de eficiência na emissão do carbono contido na floresta para a atmosfera – o que é fisicamente impossível num clima extremamente úmido – a emissão de carbono seria de 150 milhões de tC por ano (MtC/a), contra 1.100 MtC/a do Japão e 700 MtC/a da Alemanha.

Na melhor das hipóteses – queima de floresta tropical úmida com 100% de emissão de carbono – as emissões anuais desses países são 7 e 5 vezes maiores que as queimadas na Amazônia, respectivamente.

Alerta Científico e Ambiental – A pandemia de Covid-19 está ensejando o temor de que o desmatamento na Amazônia possa ser a causa de uma nova pandemia global.
 
Molion sobre Aedes aegypti: Doenças da Amazonia nunca geram pandemias. Comparar com Covid é demagogia


O documento do grupo Climate Principals e até mesmo a Organização Mundial da Saúde (OMS) enfatizam que a maioria das novas doenças infecciosas têm emergido nas fronteiras florestais, onde ocorrem interações entre as pessoas e a vida selvagem.

Há evidências desse risco, no caso da Amazônia?

Prof. Luiz Carlos Molion – As principais doenças, que eventualmente teriam sua origem na floresta, como malária e leishmaniose, são as que são transmitidas por vetores, como mosquitos, por exemplo, e podem estar associadas a qualquer tipo de vegetação, águas paradas e não necessariamente à floresta.

Essas doenças são bem conhecidas e têm tratamento eficaz há tempo, estão sob controle e nunca provocaram ou dispararam pandemias globais recentemente.

Varíola (Orthopoxvirus, encontrado na tumba do faraó Ramsés II), Peste Negra (Yersinia pestis), Gripe Espanhola (H1N1), Gripe Aviária (H5N1) e a atual Covid-19 (Sars-Cov-2) não tiveram sua origem em florestas tropicais.

* o autor é escritor, jornalista, conferencista de política internacional, sócio do IPCO, webmaster de diversos blogs
Publicado em
https://ecologia-clima-aquecimento.blogspot.com/2021/03/prof-molion-co-controlador-do-clima.html

 

 

 

.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigado por participar, aguarde publicação de seu comentário.
Não publico ofensas pessoais e termos pejorativos. Não publico comentários de anônimos.
Registre seu nome na mensagem. Depois de digitar seu comentário clique na flechinha da janela "Comentar como", no "Selecionar perfil' e escolha "nome/URL"; na janela que vai abrir digite seu nome.
Se vc possui blog digite o endereço (link) completo na linha do URL, caso contrário deixe em branco.
Depois, clique em "publicar".
Se tiver gmail escolha "Google", pois o Google vai pedir a sua senha e autenticar o envio.