Richard Jakubaszko
Tem gente que por falar demais arruma muitas encrencas, e tem gente que por falar de menos faz bons negócios.
Essa é uma história da qual acabei, indiretamente, participando como espectador, lá nos idos dos anos 80, e registrei esse fato no livro “Marketing Rural – Como se comunicar com o homem que fala com Deus” pelo exemplo emblemático de um tipo de decisão de consumo (emocional) tomada por um agricultor.
Havia um agrônomo, lamentavelmente já falecido, que era especialista em pulverização de agrotóxicos. Trabalhava numa multinacional de defensivos, que hoje nem existe mais, e dava assistência a grandes clientes nas pulverizações, principalmente em casos de pulverizações aéreas.
Era um profissional dedicado, competente, e um perfeccionista de mão cheia, além de inteligente e honesto. Bom, pelo menos não era exatamente desonesto, o que já seria uma brutal diferença entre uma coisa e outra.
Por volta de 1982, época em que os tempos da economia estavam numa recessão brava, esse agrônomo perdeu o emprego na multinacional. Pegou o dinheiro do FGTS e as economias e comprou um avião Ipanema usado. Montou no norte do Paraná uma empresa de aplicação de defensivos, e começou a ganhar dinheiro. Era o único, e prosperou rápido. Logo, mais dois aviões estavam incorporados ao que já era quase uma frota de 3 exuberantes aeronaves. Até que, em 1987, reencontrei o agrônomo, ainda dono da companhia agrícola de aviação. Conversa vai e conversa vem, a situação naquele momento estava péssima. Tinha o financiamento dos aviões para pagar e nenhum agricultor passando perto da porta da empresa dele. E nenhuma perspectiva, afinal, estava-se em plena ressaca do Plano Cruzado.
O que ele fez? Coisa de gênio do “marketing rural” e do “jeitinho brasileiro”, segundo as más línguas. Dava uns vôos em áreas periféricas próximas a determinadas propriedades. No dia seguinte, num movimento que começava de manhãzinha, recebia a visita de dez ou doze agricultores, todos curiosos, preocupados, alguns muito falantes, querendo saber o que é que ele estava aplicando, e o agrônomo quieto, só ouvia, não dava explicações.
Se o agricultor insistisse muito ele só dizia que estava dando uns vôos em áreas pequenas. Um dos visitantes falantes comentava que um dos donos daquelas propriedades parece que tinha visto umas lagartas novas na lavoura da soja ou do milho.
E o agrônomo quieto, não confirmava e nem desmentia. Após uma conversa rápida, que faria inveja a muito camelô, ficava marcado para o dia seguinte a aplicação de algum veneno, pois “afinal, os bicho tavam mesmo demorando a chegar, mas se eles já estavam na vizinhança, mais dia menos dia iriam chegar, e era bom prevenir....”.
Bom, os aviões tinham de voar e o nosso amigo da história tinha de pagar as suas contas. Não se fazia de rogado, agendava o trabalho, dava orçamento e até recebia adiantado.
Na conversa que tive com ele, em que me contou os fatos, ria matreiro, e complementava “não vendi nada, eu ficava quieto, eles que vinham, falavam, falavam, e mandavam pulverizar...”.
É óbvio que essa “descoberta” foi casual, e aconteceu depois de um dos vôos de exercício e manutenção das aeronaves. Na ausência de trabalho para os aviões os mesmos tinham que voar de qualquer jeito, não podiam ficar parados para não enferrujar, e assim acabavam gastando combustível e tempo hora dos pilotos, gerando mais despesas para a empresa. Enchia-se o tanque de combustível dos aviões, e também os tanques dos locais reservados para os agroquímicos, nesses casos simplesmente com água, e lá iam os aviões “trabalhar” e fazer sua manutenção.
Como os pilotos agrícolas gostam de “viver perigosamente”, e nessa profissão de doido que é ser piloto agrícola, que mais parece suicida alegre, o que não falta é maluco, eles simulavam pulverizações reais, davam rasantes e ficavam voando a 3 metros de altura sobre a lavoura...
O que não era casual era a curiosidade e a ingenuidade dos agricultores vizinhos...
A empresa de aviação agrícola, não precisa nem dizer, voltou a exibir um pujante e maravilhoso incremento nos seus negócios. Tudo porque o dono não era desonesto, mas ficou esperto sem querer e sem planejar, e ainda por cima porque falava pouco...
A crônica acima foi extraída e adaptada do livro “Marketing Rural – Como se comunicar com o homem que fala com Deus”, de autoria do jornalista e publicitário Richard Jakubaszko. Este livro foi reeditado, em 2ª edição, 2006, pela Editora UFV, da Universidade Federal de Viçosa – MG.
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