terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Jornal Nacional: notícias requentadas.

Richard Jakubaszko
Assisti hoje, como milhões de brasileiros, ao Jornal Nacional. Raramente faço isso, hoje foi um "acidente de percurso", por ter chegado em casa mais cedo.
A série de reportagens, iniciada hoje pelo Jornal Nacional, sobre os agrotóxicos, quase me fez cair da poltrona onde estava confortavelmente instalado. O que vi foi uma avalanche de comentários críticos tendo por base uma pesquisa mal conduzida em 2010 pela Anvisa - Agência Nacional de Vigilância Sanitária, já discutida e criticada ad nausem, seja pelos exageros cometidos, pela metodologia ou pelas interpretações distorcidas. Alguém deve se lembrar que o então ministro da Saúde durante o Governo Lula, José Gomes Temporão, chegou a afirmar que não comeria mais pimentões.

Pois repetiram a dose. O Jornal Nacional requentou a notícia para os dirigentes da Anvisa, e os coleguinhas repórteres deitaram e rolaram no sensacionalismo, como se fosse uma bomba. Praticaram um jornalismo vil, sensacionalista, que apenas instala o pânico entre a população.

Sobre essa pesquisa, e a conduta de trabalho da Anvisa, publiquei aqui no blog, em  julho último, um artigo (A Anvisa, a quem serve?) que esteve entre os mais lidos em toda a história deste blog: http://richardjakubaszko.blogspot.com/2011/07/anvisa-quem-serve.html
Nesse artigo mostrei algumas das formas de atuar dessa entidade, a Anvisa, que deveria proteger, como diz seu nome, as questões sanitárias que dizem respeito à população, mas prefere fazer sensacionalismo midiático e criar pânico, pois essa é a opção pessoal de seus dirigentes.

Em outro artigo, "Tudo o que você precisa saber sobre agrotóxicos", este de novembro 2011, http://richardjakubaszko.blogspot.com/2011/11/tudo-o-que-voce-precisa-saber-sobre.html  mostrei como funcionam os agrotóxicos, e exibi declarações, tanto de técnicos do Ceasa-SP, como de um médico da Unicamp, que desmentem frontalmente as afirmações da Anvisa através dessa pesquisa que ressuscitaram hoje e que o Jornal Nacional vergonhosamente requentou, como se fosse notícia novíssima.

Quais são os interesses por trás desse autêntico banditismo jornalístico? No jornalismo da TV Globo não há inocentes, nem gente mal informada. Sabiam que a pesquisa foi feita em meados de 2010. Por que a requentaram, como se fosse notícia nova? Jornalismo requentado na área política é comum, mas não em casos de saúde pública. A TV Globo deveria se explicar, na minha modesta opinião.

Na Anvisa, parecem demonstrar falta do que fazer e dizer, ou então tentam reunir forças para estabelecer, quem sabe, uma consulta pública. Ou coisa pior.
O desserviço à população é o medo, o pânico generalizado, fará milhares de mães alimentarem mal seus filhos e suas famílias, sem verduras e legumes por muitos dias.

É óbvio e evidente a baixa significativa dos preços nos próximos dias. Muitos agricultores, se estiverem com alguma dificuldade financeira hoje, quebram nos próximos dias, inapelavelmente, pela irresponsabilidade "parceira" da Anvisa e do Jornal Nacional. Uma vergonha essa atitude, para os serviços públicos e para o jornalismo.
Cadê os bispos do Brasil? Ou melhor, cadê os procuradores do Ministério Público, alguém vai questionar isso?

EM TEMPO:
20:30 horas de 07/12/2011
Fui checar no Folha Online alguns detalhes da pesquisa. São os mesmos dados apresentados pelo Jornal Nacional, como se a notícia fosse um press release irretocado. Porém, a FSP apresenta um detalhe relevante em toda essa história: os dados citados da "pesquisa" da Anvisa referem-se a testes laboratoriais feitos com alimentos coletados em vários estados, exceto no estado de São Paulo. Por que justamente São Paulo ficou de fora? Ora, é de uma obviedade quase ululante: é que no Estado de São Paulo a Anvisa poderia ser contestada, pois apenas em São Paulo existem laboratórios com condições técnicas laboratoriais para realizar esses testes, inclusive os reagentes específicos, que são todos importados e muito caros. Para se detectar cada agrotóxico presente num alimento precisa-se de um reagente, e, ao que se sabe, não mais do que 4 ou 5 laboratórios no Brasil possuem essas condições, e todos estão em São Paulo, sendo que 2 deles pertencem à multinacionais.

A todas essas, a mídia caiu na esparrela midiática da Anvisa, pra mim isso está muito claro.
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9 comentários:

  1. Será que a organização Globo está desapontada com o volume de anúncios de defensivos? XYZ

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  2. graças ao bom senso e à vontade de pensar por si, não vejo a GROBO, nem nada do seu conglomerado midiático há mais de dez anos.
    joge o pig no lixo Richard!
    abs
    Pedro Passos

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  3. Parabéns pelo artigo Richard. Seria mais correto se a Globo tivesse exibido a matéria no programa "vale a pena ver de novo". Em vez de defender os interesses legítimos do Brasil, cuja vocação é o agronegócio, a agencia mostra seu viés ideológico e, apoiada por gente despreparada, continua prestando desserviço à nação.
    Roberto

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  4. OI RICHARD.
    EU TAMBEM NAO VEJO GLOBO E NEM OUTROS CANAIS, QUE NAO SEJAM OS PAGOS, HA MAIS DE 20 ANOS. MINHA FILHA HAREBELL, QUE HOJE TEM 23 ANOS, NUNCA VIU NOVELAS NA VIDA.
    ACHO QUE ESSA REPORTAGEM TEM A VER COM UMA QUE ENVIEI DA ABBA, ONDE NATALINO COMEMORA USO DE AGROTOXICOS PARA A BATATA O,OO.
    SILVIA NISHIKAWA

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  5. Guilherme Landgraf Neto7 de dezembro de 2011 às 14:55

    Richard, eu te entendo...
    Mas a indústria de agrotóxicos sabia que isto viria (PARA/Anvisa + mídia)...
    E lamento ter que reconhecer que não nos preparamos bem de novo...
    Com um pouco mais de boa vontade ($$$) poderíamos divulgar mais o PNCRC do MAPA e "abafar" o PARA da Anvisa...
    Mesmo sobre a questão da regularização dos registros para Minor Crops ("mata" o PARA para sempre, ou deixa eles sem pauta...), é que ainda não existe um consenso nas empresas da Andef.
    Abraços
    Guilherme Landgraf Neto

    COMENTÁRIO DO BLOGUEIRO:
    Guilherme, pois que estabeleçam um consenso, antes que o circo pegue fogo, do jeito que anda essa carruagem não dá, é muito solavanco, é dar munição pro inimigo...

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  6. Richard, não foi apenas a Globo. A Folha de S. Paulo de hj traz a matéria sobre pimentões, morangos e tomates que estariam recebendo doses altas de agrotóxicos, segundo a tal pesquisa da Anvisa de 2010. Qdo vi a capa da Folha achei que tinha pego um exemplar do jornal de um ano atrás.
    Uma desinformação total!
    Um abraço,
    Cristina.

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  7. Recebi por e-mail, de Guilherme Landgraf, artigo de um respeitadíssimo agrônomo da Ceagesp-SP, que transcrevo a seguir. Por ser longo, dividi o mesmo em 3 partes:

    AGROTOXICOS E DESINFORMAÇÃO, por Ossir Gorenstein (CEAGESP)
    A ONU estimou que a população mundial atingiu a casa dos 7 bilhões de habitantes em 31.10.2011. Ao final da segunda guerra mundial, em 1947, há 64 anos, a população fora estimada em quase 2 bilhões de humanos e, quando Malthus escreveu “Um Ensaio sobre o Principio da População”, no ano de 1798, a população mundial devia estar próxima de 800 milhões de habitantes. O vaticínio de Malthus de que a população tenderia a crescer em progressão geométrica enquanto a produção de alimentos em progressão aritmética, acarretando fome e pobreza generalizadas, não se confirmou. Malthus não anteviu as possibilidades do desenvolvimento da tecnologia, especialmente, da tecnologia agrícola. Não que o processo de inovação tenha se dado sem oposições nem conflitos: É conhecido o movimento de destruição de máquinas durante a revolução industrial na Inglaterra, em reação à mecanização dos processos de produção e pelo que isso representou aos setores contrariados. Reação similar tem sido vista no Brasil, com forte conotação de luta política, através de ações articuladas pelo Movimento dos Trabalhadores sem Terra – MST e seu braço auxiliar Via Campesina. Dois são os alvos objeto dos ataques: os alimentos transgênicos e os agrotóxicos. Em recente campanha, os agrotóxicos foram alçados por esses movimentos, e seus simpatizantes, à posição de inimigo numero 1 da sociedade brasileira. “O veneno esta à mesa” – é o titulo de um documentário postado na internet que reproduz a desinformação difundida por esses movimentos. E, duas são as afirmações impactantes da campanha: “Cada brasileiro consome 5,2 litros de agrotóxicos por ano”, e, “Agrotóxico mata”.

    Se os alimentos que consumimos tivessem toda essa carga de veneno que esses movimentos, com ranço obscurantista, querem que tenham, provavelmente estaríamos todos mortos. Seria trágico se não fosse cômico. Possivelmente nem eles mesmos acreditem nisso, mas o afirmam para causar impacto, difundir insegurança e medo, através do uso da mentira em sua propaganda.

    Na ausência de uma autoridade sanitária que exerça o papel de informar e esclarecer a população sobre os reais perigos dos agrotóxicos, principalmente nos alimentos, urge que alguém com algum conhecimento do problema o faça, para não se sentir omisso e conivente com a mentira.

    Tomemos os dados da própria ANVISA, de seu Programa de Analise de Resíduos de Agrotóxicos em alimentos – PARA – publicados no Relatório de Atividades de 2009, subscrito pela Gerencia Geral de Toxicologia, com data de 22.06.2010(*) (assinale-se que os resultados do PARA de 2010 ainda não vieram a publico e as razões não são conhecidas). Na tabela 03, na pg 10 do relatório, vê-se que foram analisadas 3180, de 20 culturas ou alimentos. Através da tabela I, do anexo II, do relatório, pode-se calcular a soma das ocorrências de resíduos detectadas nas 3180 amostras analisadas no ano de 2009(**). Foram 4843 ocorrências de resíduos, o que permite inferir, em média, 1,5 detecções por amostra analisada. Ainda na tabela I, verificam-se as concentrações mínimas e máximas das detecções de resíduos em cada um dos alimentos analisados. Tomando-se as concentrações mais elevadas, uma vez que os valores médios das concentrações não são informados, calcula-se o valor médio das concentrações máximas, o qual se situa em 2,5 mg/kg ou ppm, ou, vale enfatizar: 2,5 gramas por tonelada de alimento.
    segue...

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  8. Resumindo, com base na amostragem realizada pelo PARA, no ano de 2009, como referência para fins de demonstração, pode-se afirmar que um alimento vegetal apresentaria uma concentração máxima media de 3,75 mg/kg de agrotóxicos, resultado da multiplicação de 1,5 ocorrências de resíduos pela concentração máxima média, equivalente a 2,5 mg/kg. Para se conhecer a quantidade de agrotóxico ingerida, com essa concentração, é preciso saber a quantidade de alimento consumida. Examinemos duas hipóteses: Primeira, a quantidade de alimentos per capita adquirida pelos domicílios, segundo o IBGE – na Pesquisa de Orçamentos Familiares, 2008-2009, equivalente a 315 kg/ano ou 0,863 kg/dia; e, segunda, uma dieta recomendada de 2200 calorias, equivalente ao consumo de 2,070 kg/dia. Considerando, supostamente, que todos os alimentos contenham resíduos de agrotóxicos, na primeira hipótese haveria a ingestão de 3,23 mg/kg/dia, e na segunda, 7,76 mg/kg/dia. Admitindo-se uma densidade de 1g/cm3, a fim de atingir a ingestão de 5,2 litros/ano de agrotóxicos por cada brasileiro, equivalente a 14246 mg/dia, na primeira hipótese seria preciso consumir 4400 kg de alimentos por dia, e na segunda, 1800 kg/dia. Para tanto, no primeiro caso seriam necessários 5000 anos e no segundo, cerca de 860 anos. Vê-se, pois, que não é trágico, nem cômico, é simplesmente surreal. Assinale-se que, para fins de demonstração, tomamos os valores máximos da própria ANVISA, para não pairar duvidas sobre a origem da base dos dados. Poderíamos ter admitido outros parâmetros, mais próximos da realidade, e o quadro seria mais surreal ainda. Por exemplo, outras estimativas indicam que a concentração média de resíduos em frutas e hortaliças esteja próxima a 0,4 mg/kg e a densidade de massa em relação ao volume dos agrotóxicos comercializados no ano de 2009 foi estimado pelo IBAMA em 1,13g/cm3(***), o que na conversão da massa ingerida como veneno passaria de 5,2 l/ano para 5,8 kg/ano ou 15890 mg/dia. Cálculos feitos nestas novas bases estariam mais próximos da realidade, além de que as análises de resíduos são feitas com a massa integral dos produtos vegetais, sem a retirada da casca, em cuja superfície se deposita grande parte dos agrotóxicos, aqueles que agem por contato. Entenda-se, pois, os fundamentos falaciosos da visão obscurantista.

    A rigor, cada alimento deveria ser examinado separadamente e os valores de suas concentrações médias consideradas particularmente no conjunto da dieta. De todo modo, prevalece a percepção de que as concentrações de resíduos são constituídas por valores ínfimos, os quais não apresentam evidências de causarem danos à saúde da população através do consumo dos alimentos. Os efeitos obtidos em animais de laboratório, através de ensaios toxicológicos realizados com objetivos de se determinar os danos causados pelos agrotóxicos como agentes mutagênicos, teratogênicos, carcinogênicos e de anomalias na reprodução, não podem simplesmente ser extrapolados para humanos sem se considerar as doses capazes de causar os efeitos adversos. São estas doses, precisamente, objeto dos testes toxicológicos com o fim de se estabelecer os parâmetros de segurança para uso dos agrotóxicos. Toda toxicologia está fundamentada no princípio de Paracelsus, segundo o qual “A DOSE É QUE FAZ O VENENO”, princípio este que os obscurantistas estão ávidos para revogar. É muito comum e frequente ouvir-se afirmações de que os alimentos estão carregados de venenos, de que foram detectados este ou aquele agrotóxico, porém, nunca é feita menção às quantidades detectadas nas análises. Ou seja, a desinformação tem o propósito de transformar uma questão normativa, ou legal, em um falso drama epidemiológico.
    segue...

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  9. Outro aspecto a comentar refere-se à afirmação: “Agrotóxico mata”. Uma evidência que não requer demonstração. Exatamente por isso são chamados inseticidas, fungicidas, herbicidas, acaricidas. A terminação “cida” denota a propriedade de causar morte. E, “tóxico” denota a propriedade de oferecer perigo, de causar intoxicação, dano à saúde. Tomemos os dados de intoxicação do sistema de registro do Ministério da Saúde/FIOCRUZ/SINITOX – Brasil – 2009. Agrotóxicos de uso agrícola foram responsáveis por 5204 casos de intoxicação, 5,18% do total de casos registrados e 2491 registros referem-se a casos de tentativa de suicídio, ou seja, 48% dos casos. Do total dos casos de intoxicação por agrotóxicos de uso agrícola, 3131, 60%, evoluíram para cura, enquanto 717 casos, 13%, para cura não confirmada. Os casos de óbito somaram 170, 3,26% dos casos registrados, sendo que 146 casos, 2,8%, decorreram de tentativas de suicídio. Finalmente, registre-se que agrotóxicos de uso agrícola ocupam a 5ª posição no ranking dos agentes responsáveis por intoxicações, vindo atrás dos medicamentos, animais peçonhentos, produtos domissanitários e drogas de abuso.

    Estes são os dados de que se dispõe e as considerações necessárias para que não passem como verdades as falácias lançadas em uma luta política, e para que cidadãos possam melhor se esclarecer a respeito do real perigo representado pelos agrotóxicos para a nossa saúde. A questão final que se impõe: será que os agrotóxicos têm toda essa importância que lhes querem atribuir, a ponto de transformá-los em inimigo número 1 da sociedade brasileira?

    Acessado em 08/11/2011
    (*) http://portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/8ef32a80481aa03d8598957...

    (**)http://portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/128aa080474581978ddfdd3...

    (***)http://www.ibama.gov.br/phocadownload/Qualidade_Ambiental/produtos_...

    Engenheiro Agrônomo Sênior Ossir Gorenstein
    Seção do Centro de Qualidade Hortigranjeira - SECQH
    Cia Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo - CEAGESP
    COMENTÁRIOS ADICIONAIS DO BLOGUEIRO:
    Boa parte dos argumentos do agrônomo Ossir Gorenstein foram usados por mim nos artigos "Anvisa, a quem serve" e "Tudo o que você precisar saber sobre agrotóxicos". Tenho de admitir, no entanto, que, apesar de ser um texto muito técnico, ele teve excepcional capacidade de ironia.

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